Capítulo 05 - Diamante Bruto

72 12 67
                                    

Lucy passava delicadamente a ponta de seus dedos pelo tecido de cor azul celeste. Era tão lindo que enchia seus olhos de encanto. 
- Você gosta desse? - perguntou seu pai. 
- Sim, é maravilhoso. - respondeu ainda com o olhar sobre o tecido. - Me parece perfeito. 
- Quanto custa e quanto tempo levará para fazê-lo, senhora? - disse Harmon à costureira. 
- Não se preocupe com o valor, frade. Poderá levar o vestido desse tecido sem custo algum. - disse a costureira de bom grado.
A senhora Durant era a costureira da cidade e, assim como quase todos os comerciantes, conhecia frade Harmon e Lucy e tinha muita estima por pai e filha. 
- Para quando precisa dele, frade? - perguntou a Sra. Durant. 
- Até amanhã à noite, no máximo. 
- Então é melhor eu começar agora. Venha querida, vou tirar suas medidas. - ela pôs a mão nas costas de Lucy e a conduziu para outro lugar.
A senhora Durant e Lucy foram para os fundos da loja e Harmon permaneceu perto da entrada sentado em um banco. 
- Deve estar muito feliz com esse baile, não é querida? - disse ela tirando as medidas da garota. 
- Está tão visível assim?
- Um pouco. Seu rosto está radiante. 
- É meu primeiro baile, não paro de imaginar como será. A senhora já foi em algum?
- Não, querida. Gente como eu nunca teve a chance de entrar em um salão grandioso com belas pessoas enfeitadas. Você tem tanta sorte, divirta-se por todos nós. 
- Eu tentarei. 
- Pronto, querida. Seu vestido ficará maravilhoso, confie em mim. 
- Eu tenho certeza de que ficará melhor do que imagino. A senhora tem as mãos de uma fada. 
- Estou mais para uma bruxa velha. 
Lucy riu junto com a Sra Durant. Tirada as medidas, ela e Harmon saíram da loja. 
- Agora, sapatos. 
- Tem certeza? São caros.
- Sem os custos do vestido, o dinheiro dará  para comprar um belo par de sapatos para você. Você deve ficar minimamente apresentável para o baile, o senhor Oliver será o homenageado da noite. Ele é um nobre muito conceituado e você deve estar apresentável para ser apresentada a ele. 
- Entendo.
Lucy seguia seu pai pela multidão do mercado da cidade quando viu um rosto familiar. Um rosto misterioso e pálido passou rapidamente por sua vista, um rosto que ela havia visto uma vez,  mas ainda estava claro em sua memória. Em questão de segundos, o rosto se perdeu e ela já não podia mais vê-lo.
- O que houve? - perguntou Harmon. 
- Nada - ela olhava ansiosa para a multidão. Seus olhos ainda procuravam pelo rosto. - Pensei ter visto alguém, mas... Devo ter me confundido. Há muitas pessoas na feira hoje. 
- De fato. Vamos logo ou só sairemos daqui a noite. 
- Claro, papai. Já vou.
Lucy deu uma última olhada para onde havia visto o rosto, mas não o viu mais. Certamente tinha sido fruto de sua imaginação, ela pensou. Mas e se não tivesse sido? E se o rosto fosse real? Nesse caso, ele estaria mais perto do que ela imaginava. 

《》《》《》《》《》《》《》《》《》《

Chegavam inúmeras carruagens imponentes e enfeitadas de todos os lugares. Mulheres com lindos e extravagantes vestidos, com adornos e penteados exóticos em suas cabeças desciam delas acompanhadas de seus maridos, irmãos ou pais. Subiam vagarosamente a escada branca, apreciando cada degrau que pisavam, como se fossem monarcas. Alguns cidadãos foram convidados, mas só aqueles que possuíam mais riquezas do que os demais. Apenas o clero principal estava presente na festa: Padre Frederic e Julian e frade Gerard e Harmon, este último ainda não havia chegado ao salão. 
- Onde Harmon pode estar? - perguntou Gerard um tanto inquieto. - Deveríamos estar todos aqui. 
- Acalma-te, companheiro. Nosso valoroso deve chegar logo mais. Acredito que seu atraso seja justificado por sua companhia. 
- Ora, não me diga - disse Julian animado com o que havia acabado de ouvir. - Então, Harmon trará a jovem Lucy para o baile? 
- Sim, Julian - respondeu Frederic. - Enfim, aquele cabeça dura resolveu dar ouvidos aos meus conselhos. 
Do lado de fora do salão, Harmon e Lucy aproximavam-se. O pai apressava o passo com sua filha vindo logo atrás. 
- Espere, meu pai - pediu a menina. 
- Estamos atrasados, Lucy - disse o frade impaciente. - Veja, os convidados já chegaram. Com um pouco de sorte, o convidado de honra ainda não deve ter chegado. 
Lucy não argumentou. Apressou o passo para chegar ao salão ao lado de seu pai. Ao se aproximarem, Lucy pôde ver de perto as carruagens estacionadas. Cada uma mais deslumbrante que a outra. Ela imaginava se por dentro elas também eram bonitas como demonstravam ser por fora. Frade Harmon parou ao pé da escadaria de mármore branco e esperou Lucy chegar até ele. 
- Qual a dificuldade de andar como alguém normal? - disse o frade. 
- Estes sapatos não são nada confortáveis. É difícil andar com eles. 
- Bobagem. São novos e muito bonitos, deveria agradecer ao invés de reclamar. Agora segure em meu braço e ponha um belo sorriso neste rosto. 
Lucy seguiu exatamente o que seu pai lhe disse para fazer. Ela tentou não cair enquanto subia os degraus, mas por duas vezes cambaleou e com isso ganhou um olhar de canro irritado de seu pai. 
Ao chegarem ao fim da escada, os olhos de Lucy se encheram com tamanha grandiosidade do salão de baile. Tudo era majestoso tal como ela jamais havia visto. Haviam colunas de pedra clara ao longo do salão nas laterais, enormes lustres no teto e candelabros nas colunas, acima de suas cabeças, o teto possuía uma linda pintura que consistia em figuras angelicais e nuvens delicadas. O piso era liso e as pessoas que dançavam no centro do salão pareciam deslizar por ele. A música estava no ar, ora lenta para os casais, ora alegre para se dançar em grupo. As damas e os cavalheiros presentes faziam jus ao nome "nobres". Todos muito elegantes e bem educados. Havia tanto para admirar que Lucy mal conseguia se concentrar em uma única coisa. 
- É tudo tão encantador - ela disse em voz baixa. 
Julian avistou Lucy e Harmon na porta e acenou para os dois para que fossem até onde estavam. Ambos seguiram até o grupo no canto do salão. 
- Enfim, vocês chegaram - disse Gerard. - Já estávamos preocupados que perdessem a chegada do Sr. Oliver. 
- Perdão pelo atraso, meus caros. Nós…
- A culpa foi completamente minha, senhores - disse Lucy abruptamente. - Estava tão empolgada com meu primeiro baile que exagerei na demora ao me preparar. 
- Ora, querida - disse Frederic. - Não faz mal. Não se sinta mal por isso, afinal, a demora valeu a pena, está mais linda e radiante do que nunca. 
- Digo o mesmo - disse Julian sorrindo gentilmente. - Eis a mais linda dentre todas do salão. 
- Os senhores são muito gentis, mas sei que há outras damas muito mais bonitas do que eu hoje. 
- Bobagem, querida - Frederic pegou sua mão e a levantou fazendo Lucy rodopiar graciosamente. - A verdadeira beleza se esconde dentro de nós e a senhorita, a tem de sobra.
Lucy sorriu docemente para Frederic, como agradecimento a tão gentis palavras. 
De repente, todas as conversas silenciaram e todos os convidados olharam para a entrada do salão. Um homem entrou, ele carregava consigo uma aparência nobre e elegante. Ele tinha olhos lindos, brilhavam como as águas do mar ao primeiro toque do sol sobre elas, sua boca era vermelha como cereja e seu rosto era delicado como o de um típico aristocrata francês. Todos os olhares estavam sobre ele e somente para ele, como um anjo andando por entre os mortais. Um homem de beleza e semblante jamais visto por aquelas pessoas. Um homem o qual a maioria das mulheres desejava desposar. Este era o fascínio que Oliver provocava por onde andava, seu olhar tão misterioso e penetrante parecia atravessar os corpos daqueles que apareciam à sua frente. Esse olhar tão desejado pelas donzelas presentes, tomou como foco a única dama, de bochechas rosadas e a pele pálida como uma estrela. Ela se tornou o foco do único olhar que realmente importava naquela noite. Oliver ignorou todos os olhares curiosos sobre ele e se aproximou dos membros da igreja ali presentes. 
- É um enorme prazer conhecê-los, senhores - disse ele com uma voz melodiosa e suave, como se realmente os tivesse vendo pela primeira vez. 
Seu olhar desviou-se lentamente para a jovem ao lado deles. Ela o reverenciou como se ele fosse um príncipe.
- E é um prazer ainda maior conhecer a jovem donzela de quem tanto ouvi a respeito. - Ele pegou sua mão gentilmente e a beijou, fazendo-a corar. - Acredite-me, as palavras pouco são suficientes para descrevê-la. 
A moça sorriu timidamente para ele, que parecia gostar do efeito que tinha sobre ela. 
- São gentis as palavras que me difere, senhor - disse ela. - Eu agradeço por elas, mas, se é que posso perguntar, quem o falou sobre mim?
- A senhorita tem um bom amigo que escreveu para mim. Ele escreveu não apenas sobre negócios, mas também sobre uma bela moça que anima e aquece os corações daqueles que a conhecem. E ele não mentiu em nenhuma de suas palavras. 
- Seja ele quem for, sou agradecida por isso. 
Frade Harmon olhava um pouco incomodado para a situação, afinal, a filha jamais tivera contato com um homem que tivesse o mínimo de interesse nela. Mas ele ainda duvidava que Oliver visse Lucy com algum interesse amoroso, afinal, ele era um nobre e ela, apenas a filha de um frade. Não havia como ele se interessar por ela. 
- Eu proponho um brinde - disse Frederic distribuindo taças de vinho aos de seu círculo. - A vinda de do Sr. Oliver, aos novos amigos e a tudo que sua vinda simboliza.
Eles brindaram entre si e foi quando Lucy percebeu que todos tinham curativos na mão esquerda, igual ao seu pai. Ela estranhou aquilo, seria muita coincidência que todos houvessem se machucado no mesmo lugar e, talvez, no mesmo dia. Frederic percebeu o olhar curioso da menina. 
- O que há, minha querida? - perguntou ele. 
- Nada - ela foi surpreendida. - É só… Nada de importante. 
- É mesmo? - perguntou Frederic.
Lucy balançou a cabeça positivamente com um sorriso agradável nos lábios. 
- Bom… que hoje não hajam de problemas, é uma festa e que ela seja de seu agrado, senhor. - disse Padre Frederic com a taça de vinho em sua mão. 
- De certo que sim, padre. - respondeu Oliver, erguendo sua taça e bebendo um gole do doce vinho que havia nela. 
Lucy não bebeu nenhum gole do vinho, ela sabia que seu pai não permitiria que ela ao menos pensasse nessa possibilidade. 
Oliver pediu licença e andou até os outros convidados, a fim de cumprimentá-los e não demorou muito para que ele estivesse cercado de pessoas. A maioria damas que disputavam sua atenção, todas tão belas e enfeitadas.
- Meu bom amigo, receio que irá se decepcionar. Veja como as donzelas o cercam. Ele jamais olhará para alguém como Lucy. - disse Harmon com um pouco de alívio em suas palavras.
- Subestima o potencial de tua própria filha? - perguntou Frederic.
- É claro que não. Mas sejamos realistas, minha pobre Lucy não passa de uma pedra bruta ao lado dessas moças tão cheias de riquezas. O Sr. Oliver está acostumado a estar rodeado de luxo e de riquezas. Minha filha, de longe, é a mais simples deste salão. 
- Ela pode estar usando roupas simples, sem jóias e riquezas, mas ela possui uma beleza delicada e isto, meu caro, dinheiro algum pode superar. 
Harmon olhou duvidoso para Frederic.
- Ora Harmon, sei que não é chegado aos falatórios alheios, mas deveria ao menos saber que tua filha é considerada a moça mais bela desta cidade. Ela é um diamante bruto, isso posso afirmar. E lhe asseguro, não há riqueza no mundo que se iguale a um belo rosto e um gentil sorriso. 
Lucy observava enquanto as moças do salão se aproximavam cada vez mais de Oliver. Ele era como um prêmio a ser disputado. Até então, a jovem menina não havia percebido, mas seu vestido azul celeste de seda, era totalmente encoberto pelos grandes e chamativos vestidos das moças ao seu redor. Seu pescoço estaria completamente nu se não fosse pela cruz que sempre usava. Não haviam brincos em suas orelhas e tão pouco pulseiras balançando em seus pulsos ou anéis enfeitando seus dedos. Sequer havia um único enfeite em sua cabeça para destacar seu simples penteado ou a cor de seus cabelos. Nada, absolutamente nada, fazia Lucy se destacar e, pela primeira vez naquela noite, ela se sentiu terrivelmente deslocada. Ela tentou afastar esses pensamentos de sua mente, mas não conseguia deixar de se sentir inferior sempre que olhava para outra donzela. 
A jovem focou seus olhos na arquitetura do lugar. Era tudo tão lindo e elegante, enchiam seus olhos com tamanho esplendor. Sentiu seus pés tomarem vontade própria e quando se deu conta, já estava na varanda do salão. A varanda era extensa, o parapeito era de pedra e ao longo dele havia jarros enormes com belas flores dentro deles. Também haviam bancos de pedra próximos ao parapeito, ela se sentou no primeiro da esquerda próxima à porta vidro do salão, mas não tão visível para quem estava do lado de dentro. Lucy sentiu-se mais confortável ali, sem olhares e agitações, embora estivesse feliz de ter comparecido ao baile ela ainda não sabia lidar com tudo aquilo. 
Uma sombra foi tomando forma, cada vez mais próxima da luz que emanava de dentro do salão. Oliver saira do salão e caminhou até o parapeito. Ele fez o mesmo que Lucy e ficou na parte mais escura da varanda. Com as mãos no parapeito e olhando para a noite calma e acolhedora, o jovem nobre soltou um enorme suspiro. Até então, ele não havia visto a jovem donzela sentada no banco de pedra a poucos metros dele. 
Lucy fez o máximo para não atrapalhar aquele momento de Oliver. Ela levantou-se vagarosamente do banco tentando não fazer barulho ou algum movimento abrupto. 
Oliver virou o rosto rapidamente para a direção da moça com um semblante espantado. 
- Perdão, senhor - disse ela sem jeito. - Eu não queria assustá-lo, eu apenas…
- Não precisa se desculpar - sua voz era cordial. - Eu só precisava de um momento. São tantas pessoas, às vezes… Deixe para lá. Não importa. 
- Se o senhor quiser falar, não me incomodo em ouvir.
- A senhorita é muito gentil, mas não quero pertubá-la com meus problemas. 
- Eu entendo. Mas, falo sério, quando digo que não me incomoda. Eu não costumo conversar muito com as pessoas que não conheço.
- E isso não mudará se continuar sozinha aqui neste terraço. 
- Estou me sentindo um pouco deslocada. Não acho que esteja a altura de conversar com qualquer uma dessas pessoas. Elas parecem muito cultas e inteligentes, me sentiria mal. 
- Acredite, as conversas não tem nada de cultas - ele se sentou em um dos bancos de mármore. - Os homens falam de caçadas e fortunas e as mulheres de escândalos na nobreza. É tudo tão metódico. 
- Não é muito diferente das conversas que há no mercado. A diferença é que não são nobres falando. 
- Você costuma sair muito?
- Não, eu apenas saio para ir ao mercado comprar mantimentos para a casa e aos domingos vou à igreja. Fora isso, fico em casa a maior parte do tempo. 
- E porque?
- Meu pai diz que a juventude foi corrompida pela perversidade mundana e ele teme que o mesmo aconteça comigo. 
- Mas uma jovem não deveria ser privada de um pouco de diversão, ainda mais uma jovem tão gentil e bela como a senhorita. 
Lucy corou ao ouvir o elogio. 
- Quantos anos tem? 
- Fiz dezessete há alguns dias. 
Oliver balançou a cabeça sugestivamente. 
- E o senhor? Costuma sair muito? 
Oliver riu. 
- Desculpe-me. Foi uma pergunta boba.
- Não, não é isso. Eu só quero que pare de me chamar de senhor. Me chame de Oliver. 
- Certo - Lucy colocou uma mecha do cabelo para trás da orelha. 
- E respondendo sua pergunta, sim, eu vou a muitos bailes, mas eles são tediosos. São sempre as mesmas pessoas e as mesmas conversas, nada muda. 
- E o que gosta de fazer, então? 
- Cavalgar e ler. Sem dúvidas ler embaixo da maciera é o meu maior deleite. 
- Também gosto de ler. 
Oliver olhou espantado para Lucy. Seus olhos pareciam que saltariam para fora das pálpebras. 
- Perdão, mas a senhorita lê? Isso é inédito. 
- Eu sei. Acredito que seja a única moça da cidade que saiba ler. O meu pai me ensinou para que eu pudesse ler a bíblia por mim mesma. 
- Isso é, de fato, um fenômeno - Oliver ainda estava surpreso. - Suponho que não leia outras coisas. 
- Na verdade - Lucy curvou-se sentando no canto do banco próximo ao de Oliver. - Leio contos e outras coisas. Mas meu pai não sabe disso. 
- Fique tranquila - Oliver sorriu de canto. - Seu segredo está a salvo comigo. 
Lucy sorriu para ele. Um silêncio se fez no terraço e apenas o som da música do salão invadiam os ouvidos de Lucy e Oliver. 
- A senhorita me dá o prazer da próxima dança? - disse ele virando-se para ela repentinamente. 
- Adoraria, mas receio ter que declinar.
- Porque? 
- Não sei dançar muito bem. 
- E acha que eu sei? - Oliver riu. - Apenas imito o que os outros estão fazendo. 
Isso fez Lucy se sentir à vontade para aceitar o convite de Oliver. Ele levantou-se e pegou sua mão e os dois andaram até o salão. 
- Vejam! - disse Julian com uma voz animada. - O senhor tirou Lucy para dançar. 
Harmon girou seu corpo imediatamente e mal pôde acreditar em que seus olhos viam. Harmon não foi o único a ficar surpreso com aquilo. As outras damas também olhavam com um ar de desdém. Se perguntavam como uma moça pobre poderia ter chamado a atenção daquele tão cobiçado nobre. 
- Eu sabia que isso aconteceria - disse Frederic sorrindo. - Olhem só como os dois combinam. Está vendo, Harmon? 
- Não me provoque, Frederic - disse num tom irritado. - Devo acabar com isso imediatamente.
- Nem pense nisso - Frederic o segurou. - Deixe a menina se divertir ao menos uma vez na vida. Ela vive trancada naquela casa, deixe-a ser o centro das atenções por uma noite. 
Harmon bufou e permaneceu quieto em seu lugar, ainda que seu rosto mostrasse o que ele estava sentindo. 
Lucy e Oliver dançavam em perfeita sintonia. Não parecia que a garota nunca havia estado em um baile como aquele ou dançando daquela forma. A dança envolvia muitas voltas e passos usando as mãos. Ambos pareciam anjos dançando como uma perfeita criação de Deus. 
- A senhorita me disse que não sabia dançar - disse Oliver.
- E não sei. - Lucy riu.
- Como pode? Está dançando melhor do que a maioria, isso lhe garanto. 
- A irmã Dominic diz que se é capaz de fazer qualquer coisa quando se realmente quer. Eu queria muito dançar e agora estou.
- Irmã Dominic? 
- Sim, ela é uma freira da Catedral. Ela praticamente me criou desde pequena, é minha melhor amiga. 
- Fascinante. Adoraria conhecê-la um dia.
- Irá adorá-la. É uma alma alegre e gentil. 
- Como você? 
- Não. Gostaria de ter a alma mais alegre. 
- E o que a impede de tê-la? 
- Eu não sei. Uma sensação de que algo falta em mim - os olhos de Lucy ficaram tristes por um breve instante. - Desculpe-me, não deveria estar o importunando com minhas lamúrias. 
- Não há pelo o que se desculpar. Adoraria ouvir tudo que tens a falar.
A música parou e os casais se cumprimentaram e se realinharam para uma nova dança. Oliver e Lucy ficaram juntos para dançarem mais uma vez. A dança era um pouco mais animada do que a última. Tinha passos mais difíceis e animados. Mas isso não foi um problema para Lucy, ela estava se divertindo como nunca e só desejava que aquilo não fosse um sonho do qual ela teria de acordar em algum momento. Os dois dançaram mais duas músicas e logo em seguida voltaram para o terraço. 
- Este está sendo a melhor noite da minha vida - declarou Lucy rindo de forma divertida enquanto sentava no banco. 
- Confesso que também está sendo a melhor noite da minha vida. - ele sentou-se ao lado dela no banco. - E tudo graças à senhorita. 
- A mim? 
- Sim. A senhorita faz tudo parecer tão mais leve. Sua companhia me faz bem. 
Lucy não soube o que responder naquele momento. Oliver a fazia se sentir tão bem. Ele a tratava bem e se interessava em conversar com ela. 
Uma presença surgiu no terraço subitamente. 
- Senhor Oliver - disse Frederic aproximando-se deles. - O senhor poderia me acompanhar, por favor? 
- Claro, Padre - Oliver levantou-se. - Espere-me aqui. Voltarei em breve. 
Ele beijou a mão de Lucy e partiu com o padre para algum lugar no salão. 
Lucy segurou delicadamente a mão a qual Oliver havia beijado. Seu coração palpitava de tal maneira que ela não conseguia entender. Talvez fosse uma simples fascinação. Afinal, ele era um nobre e havia lhe dado atenção. Lucy tentava se convencer disso. 
A menina assustou-se ao ouvir uma voz vinda de baixo da sacada chamando seu nome. Ao olhar para trás, nada mais via do que uma sombra entre as folhas do jardim, escondido na noite mergulhado e abrasado pela escuridão. 

Sangue Profano (Em Andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora