Capítulo 18 - A Quem Pertence o Amor

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Completou-se quatro dias desde a partida de Oliver de Paris e, mesmo sendo um tempo considerável, foi como se ele nunca tivesse ido embora. Lucy passava os dias pensando se ele realmente a levaria para a sua propriedade no interior, era uma mistura de ansiedade com outro sentimento que ela não conseguia identificar. Uma parte dela desejava ir para o Lago dos Lírios, sair dos muros da cidade e contemplar algo novo, mas outra parte não desejava isso, não queria sair de Paris e deixar aquele que a fascinava para trás.
Era confuso dentro de sua mente, seus desejos colidiam entre si. Anthony ocupava um espaço cada vez maior dentro de sua cabeça e ela não entendia o porquê. Era fascinação? Não, era algo muito mais forte e genuíno. Era o sentimento que ela deveria nutrir por Oliver, mas não conseguia.
- Anthony... - ela sussurrou sozinha em seu quarto.
O nome dele era tão bonito quanto seu rosto, seus olhos e sua boca...
Lucy percebeu que seus pensamentos estavam indo para um lado perigoso. Será que ela amava Oliver? Ou será que esse sentimento estava sendo direcionado para outra pessoa?
Seus pensamentos iam e vinham. Ela decidiu sair de sua cama e andar um pouco, buscar os conselhos de alguém que ela sabia que iria entendê-la.
Andando pelas ruas em direção à igreja, Lucy não pôde deixar de lembrar que o rosto de Anthony havia tomado sua mente enquanto pensava se amava Oliver. Anthony era um homem amável, astuto, esperto e lindo, os olhos dele... Deus, como aqueles olhos faziam seu coração acelerar de forma inimaginável. Mas ela precisava se lembrar, que apesar de todos os seus atributos, Anthony era um vampiro. Mas será que isso realmente importava? Claro que tinha que importar, afinal ele era um vampiro! Um bebedor de sangue, ceifador de almas e encantadoramente mais humano do que qualquer outro. Droga! Ela estava pensando demais nele. Isso era idiotice. Lucy apressou o passo, segurando a saia do vestido fazendo a bainha subir um pouco mais, deixando seus tornozelos à mostra. Entrou na catedral por uma porta lateral, onde apenas algumas pessoas, em sua grande maioria membros da igreja, entravam. Ela passou pelo corredor central, reverenciou a imagem de Cristo crucificado e atravessou o altar, se encaminhando para o fundo da igreja. Se ela bem conhecia a freira Dominic, a mesma havia de estar em seus aposentos naquele momento, preparando-se para uma colheita no jardim da igreja. Lucy andava tentando não mostrar sua impaciência e rezando para não encontrar seu pai pelo caminho, pois sabia que o mesmo estaria por ali. Ao chegar à porta dos aposentos da freira, Lucy deu três breves toques. A freira Domimic abriu a porta quase que de imediato e seus lábios desenharam um longo e cativante sorriso ao ver a menina.
- Minha querida - disse ela estendendo os braços e envolvendo Lucy em um apertado abraço. - Como é bom vê-la. Faz tempo que não me visita. Vamos, entre, entre.
A freira encaminhou Lucy até sua cama, para que a mesma se sentasse. Aquele pequeno quarto com uma simples cama, uma mesinha com um jarro, uma bacia e uma tolha, um baú no canto da parede e um crucifixo bem acima da cama, trazia muitas recordações a garota. Ela se lembrava de quando seu pai precisava estar na igreja, mas não podia cuidar dela. Ele a deixava aos cuidados da irmã Dominic, que deixava a menina brincar em seu quarto. Dominic foi a mãe que Lucy nunca conheceu, ela amava a freira com todo o seu coração e não havia dúvidas de que ela confiava nela mais do que qualquer outra pessoa.
- Conte-me querida, porque veio? - disse a freira sentando-se em uma das cadeiras de madeira próximas à mesinha. - Ora, não é necessário dizer. Veio ver a sua velha irmã, não foi?
Freira Dominic conseguia arrancar um sorriso de Lucy mesmo quando ela não estava em um bom dia.
- Irmã, - disse com a voz temerosa. - o que vou lhe contar, deve ficar apenas entre nós duas.
- Mas é claro, minha criança. - ela colocou a cadeira mais perto de Lucy. - Sabe que pode me contar qualquer coisa.
Lucy assentiu.
- Oliver me levará para sua propriedade para conhecer sua mãe. - disse sem muito entusiasmo. Mas antes que a freira pudesse emitir algum som, Lucy logo acrescentou. - Mas eu não quero ir. Sinto que há algo dentro de mim que se recusa a estar com ele.
- Como assim? - a freira parecia incrédula. - Pensei que gostasse dele. Ele é tão gentil, tão cavalheiro, sem mencionar no quanto é bonito. Um homem como ele não nasce em árvores, querida.
- Eu sei disso, irmã - Lucy suspirou. - Estou ciente que não estou na posição de recusar um homem como ele, mas... - Lucy olhou para o crucifixo acima da cama e seu olhar pareceu triste naquele momento. - Eu realmente não sei se quero me casar com ele.
Freira Dominic ficou intrigada com aquela resposta. Seu impaciente coração parecia esperar uma resposta mais detalhada de Lucy.
- Eu... eu não o amo. E não sei se um dia poderia vir a amá-lo.
- Querida, isso é natural - disse a freira encostando-se na cadeira, quase afundando nela. - Existem diversos tipos de amor. Pode não amá-lo agora, mas com a convivência, pode descobrir coisas nele que vão fazê-la amá-lo. Com o tempo, você verá que ama até as diferenças entre vocês.
"Diferenças". Essa palavra entrou na sua mente como uma ventania e, no meio de toda a confusão nebulosa que estava em sua cabeça, o rosto de Anthony voltou a surgir em seus pensamentos. Porque ele ia e voltava de sua cabeça daquela maneira? Isso a confundia, muito mais do que gostaria.
- Anthony... - ela murmurou.
A freira aproximou-se dela, como se quisesse que ela repetisse o que havia acabado de dizer.
- Não... - Lucy gaguejou. - Eu só... Irmã, acha que seria possível amar alguém tão diferente?
- Não entendo o que quer dizer com essa pergunta. - o rosto da freira era bem sugestivo.
- Amaria alguém diferente? Não pouco diferente, mas muito diferente. De hábitos, crenças e... - ela hesitou. Respirou fundo e retomou. - De raça diferente?
- Lucy... - Seu rosto parecia repleto de perplexidade. - Não está falando daquele rapaz, não é?
Lucy engoliu seco, parecia que um nó estava se formando em sua garganta a impedindo de respirar. Ela estava, realmente, sugerindo que amava Anthony?
- Minha querida - disse a freira. - Ele é um vampiro.
- Eu sei... - Lucy suspirou. - Mas por alguma razão, não consigo sentir que isso seja ruim. Ele é bom e gentil. Ele escuta o que tenho a dizer e não demonstra impaciência. Com ele me sinto segura, sinto que posso ser eu mesma.
- Lucy...
- Eu sei, e Deus é testemunha de minha agonia. Deus me perdoe por isso, mas é ele, irmã. É com ele que meu coração está. Se eu pudesse arrancar este sentimento do meu peito e entregá-lo a Oliver, eu o faria de bom grado, mas não posso.
- Se seu pai souber que não deseja se casar com o Lorde Dauphin. - a freira franziu a testa.
- Estou perdida. Meu coração pede por um, mas minha mente pede pelo outro. Sei o que devo fazer, mesmo que me doa até a alma.
A freira levantou da cadeira e sentou ao lado da menina, enlaçando-a em um aconchegante abraço. Lucy respirou fundo, engolindo seu choro e seu desespero.
- Sei que fará a coisa certa, minha criança.

Sangue Profano (Em Andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora