Capítulo 22 - Um Sopro de Esperança

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Benjamin esboçou um breve sorriso de contentamento ao ver a moeda cair certeiramente em sua mão. Ele a jogou novamente no ar e, com uma rapidez inumana, a pegou novamente. Ele era o segundo vampiro mais rápido dali, logo atrás de Violet. Ela era a mais rápida, Anthony o mais sorrateiro, Sthephan o mais habilidoso em escalar grandes paredes, Vincent era o mais velho de todos e Lucca o mais forte. Benjamin julgava-se o mais inteligente deles. De certo ele tinha mais experiência do que seus companheiros, mas ele nunca falou a esse respeito.
- Posso dizer uma coisa? - Perguntou Sthephan.
- Você vai dizer de qualquer maneira. - Disse Benjamin jogando a moeda distraído. - Não precisa sequer pedir permissão.
- Será que vamos morrer aqui?
- Que tipo de pergunta é essa? - Violet disse com o tom irritado. - Será que só saem asneiras da sua boca?
- Não foi isso o que eu quis dizer. - Ele retificou. - Quero dizer, vamos ficar mofando dentro desse moinho por mais quanto tempo?
- E quem sabe? - Disse Anthony deitando-se ao lado da parede com mofo. - Não temos outro lugar para ir.
- Você bem que podia perguntar ao nosso líder. - Disse Sthephan com um jeito debochado. - Vocês ficaram muito próximos.
Anthony não disse nada, pegou seu colete de linho e o colocou sobre os olhos.
- Bem, - Continuou, ignorando Anthony. - ao menos, posso me alimentar melhor agora. Viajantes dispersos, sequer me vêm chegando. Eu não sei quanto a vocês, mas eu vou comer. Ao menos mato o meu tempo fazendo algo de útil.
Sthephan saiu do moinho, deixando a segurança para se arriscar por sangue viajante.
- Podemos falar o que quisermos dele - Disse Violet. - Mas ele está certo. Isso não é vida. Ficar se escondendo, bebendo sangue de morcegos e ratos, parece até que somos pedintes. Agora estamos nesse moinho minúsculo sabe-se lá Deus por quanto tempo.
- Não sei porque você ainda insiste em dizer que não gosta dele. - A voz de Anthony soou em seus ouvidos. - Está claro que vocês dois têm muito em comum.
- Não mude de assunto. - Ela brigou. - Deveria perguntar a Vincent por quanto tempo ele espera que fiquemos aqui como parasitas vivendo de sobras.
Anthony revirou os olhos, mas se deu por vencido. Ele ainda não estava cansado de estar no moinho, mas aquela insatisfação era quase unânime entre os vampiros, estavam começando a cansar daquilo e não demoraria muito até alguns desertarem. O jovem procurou Vincent com seus olhos, ele não estava no andar superior e nem perto das foices e forcados. Virando a cabeça para a direita, pôde encontrá-lo sentado ao lado da janela com tábuas. Ele andou em sua direção, pensando no que diria. Vincent não era tolo, ele já devia estar ciente da insatisfação predominante daquele lugar, mas havia escolhido o silêncio, deixando tudo ainda mais complicado.
- Vincent - Anthony chamou baixinho. - Posso falar com você?
- Sente-se. - Ele abriu espaço para que Anthony sentasse ao lado dele. - Do que precisa?
- Bem, - Ele pigarreou. - Gostaria... Quero dizer, gostaríamos de saber se, por acaso, você pretende ficar mais tempo aqui.
- Este lugar o desagrada?
- Não, mas a maioria...
- A maioria já está farta de esperar, não é?
Anthony assentiu.
- Eu entendo. - Vincent encostou a cabeça na parede. - Somos as criaturas mais poderosas que já andaram pela terra e, mesmo assim, precisamos nos esconder. Sei que a maioria está cansada disso, dessa vida.
- E o que devemos fazer?
- Olhe em volta e veja se falta alguém.
Anthony não entendeu aquilo, mas mesmo assim, obedeceu. Olhou para cima e para baixo, viu vampiros em quase todos os lugares daquele moinho.
- Exceto por Sthephan, acho que não falta ninguém.
- Olhe mais uma vez.
De quem ele estava esquecendo? Voltou a olhar e, dessa vez, com mais atenção. Contou em sua mente cada um que estava ali, pelos seus cálculos deveriam haver doze vampiros ali, sem contar Sthephan.
"1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11..."
- Quem está faltando? - Anthony perguntou a Vincent.
- Eu sabia que poucos de vocês notariam a ausência dele. - Vincent levantou a cabeça. - Diga-me, você vê Tommy entre eles?
- Tommy!
Anthony não teria notado sem que Vincent tivesse dito. Tommy era um vampiro desajeitado e magrinho. Seu cabelo era do tipo corte tigela, ele usava pequenos óculos, parecia nunca ter passado dos dezessete anos. Ele era bastante reservado e quando falava com alguém era apenas com Lucca ou Vincent. Quando Anthony entrou para a rebelião, ele demorou a perceber a presença de Tommy ali. Foi só quando eles se esbarraram acidentalmente em um túnel, que Anthony o viu.
- Tommy partiu em uma missão há dois dias. A maioria de vocês estava ansiosa demais para notar qualquer coisa além do quanto este lugar é deplorável.
- Para onde ele foi? - Anthony parecia bastante curioso.
- Quando ele voltar, você saberá. - Vincent era misterioso quando queria. - Por enquanto, isso fica só entre nós.
- Mais um segredo?
- Eu confio em você, meu jovem. - Ele sorriu.

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Dois dias se passaram desde que Lucy foi para o Lago dos Lírios.
- Posso fazer uma pergunta? - Perguntou enquanto olhava para a espuma em sua mão.
- Claro.
- O que pode me dizer sobre o meu Lorde? Como ele é?
- Como assim?
- É que eu sinto que só conheço uma parte dele e que há outra parte, muito mais importante, que eu desconheço. - Ela olhou esperançosa para Constantine. - Como você e os outros o conhecem?
- Bem, ele é um bom homem. - Ela passou a esponja no ombro de Lucy. - Cavalga muito bem e é muito habilidoso quando se trata de caça...
- Constantine, isso tudo eu já sei. - Ela sorriu. - Como ele os trata? Como é sua relação com a Lady Dauphin?
Constantine hesitou. Lucy percebeu o nervosismo no rosto da servente que mantinha o olhar baixo e inquieto.
- Pode me contar. - Sua voz era de segurança. - Somos amigas, não é?
- Sim... - disse ainda temerosa. - O Lorde é um homem... Como posso dizer? Creio que a palavra mais adequada seja: instável.
O olhar de Lucy tornou-se curioso.
- Continue. - Ela pediu.
- Pode-se dizer que é um tanto temperamental. Se algo o desagrada, ele costuma deixar isso muito claro.
- Com palavras?
- E ações também. - Ela pegou uma jarra de bronze que estava ao lado da bacia e despejou a água ainda morna nas costas de Lucy. - Lembro-me de uma vez que...
Constantine fez uma pausa. Ela pensou se realmente deveria dizer aquilo a Lucy. Imaginou que a menina acabaria descobrindo de qualquer maneira.
- Conte-me, Constantine. - Pediu.
- Se ele souber que contei...
- Ele não saberá. - Lucy pôde ver o medo nos olhos da servente. - Eu prometo que isso tudo ficará entre nós.
Constantine inspirou.
- Houve um dia, não muito tempo, em que um dos cavalariços colocou a égua do Lorde Dauphin amarrada em um poste do estábulo enquanto ele limpava o local dela. Lorde Dauphin viu e ficou furioso. O cavalariço foi amarrado ao poste e ficou lá por três dias e três noites sem comida ou água. Ele morreu de febre pouco tempo depois.
- Deus... - Lucy estava espantada. - Ele já fez algo assim com você?
- Não, mas Lady Dauphin já me puniu.
- Porque ela fez isso?
- Derramei um cálice de vinho nas escadarias enquanto levava para ela. - Constantine suspirou. - Lady Dauphin me açoitou por isso.
A respiração de Lucy ficou acelerada. Aquilo era algo que ela não podia imaginar, aquela crueldade estava fora dos Limeira de sua imaginação. Oliver sempre se mostrou tão amável e tão solícito com as pessoas, ela nunca imaginaria que ele fosse capaz daquele tipo de coisa.
- Não fique espantada. - Disse Constantine. - A maioria dos nobres são severos com seus empregados. É mais comum do que imagina.
- Isso não é severidade, isso é crueldade.
- Eu não devia ter lhe contado. - Lamentou. - Eu sinto muito. Tem coisas que não devem ser ditas.
- Eu agradeço por ter me contado. É o tipo de coisa que eu preciso saber, principalmente porque casarei com ele.
- Mas, ao meu ver, o Lorde parece ser diferente quando está em sua companhia.
- Você acha?
- Sim.
- Acho que isso possa nos ajudar. - Lucy olhou para Constantine com um brilho em seu semblante.
- Como assim?
- Talvez, eu possa fazê-lo ser mais compassivo para com os outros. Mostrar-lhe que há outras maneiras de se lidar com contratempos e erros, para que ele precise recorrer a seu temperamento tempestuoso.
- Bom, eu acho que a senhorita pode tentar.
Lucy sentiu uma faísca dentro de si. Uma certa expectativa estava a dominando e fazendo com que ela sentisse que, de algum modo, ela pudesse encontrar algo positivo em seu casamento com Oliver.
Tomou para si a responsabilidade de fazê-lo mudar sua maneira de agir. Fazendo com que ele fosse gentil e amável com aquelas pessoas tanto quanto era com ela.
Antes de dormir, Lucy pensou muito em uma maneira de abordar aquele assunto com Oliver, sem mencionar que alguém havia lhe dito alguma coisa. Ela não poderia prejudicar Constantine, por quem já nutria um forte afeto. A jovem também imaginou que, talvez, pudesse ultrapassar a barreira que havia entre ela e Lady Dauphin. Até então, as duas mal se falavam. Lucy tentava ser o mais agradável possível, mas sentia que a Lady a julgava apenas com seu olhar. Um olhar penetrante e desdenhoso. Talvez aquela família tivesse um buraco amargo em seu meio e cabia a Lucy fechá-lo de uma vez por todas.


Sangue Profano (Em Andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora