Capítulo 5 | Por favor,volta

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How do I trust again?
(Como eu confio de novo?)
I stay up all night
(Eu fiquei acordado a noite inteira)
Tell myself I'm alright
(Dizendo para mim mesmo que estou bem)
-Sasha Sloan.

Anna

Íris e eu passamos o caminho inteiro conversando sobre quando o cachorro rasgou sua bolsa. Ela estava feliz, embora parecesse nervosa. Pensei em perguntar mas acho que ela não iria querer conversar.

Chegamos em seu apartamento e eu insisto em subir com ela. Ao entrar no elevador, espio o rosto de Íris pelo canto dos olhos e vejo sua palidez.

- Meu bem, o que tá acontecendo? — Pergunto, não conseguindo conter a curiosidade.

Ela me olha e não responde nada. O elevador se abre e caminhamos até seu apartamento. Íris engole em seco e logo, toca a campainha.

Uma mulher de estatura alta e olhos castanhos claro abre a porta com força e a encara com repulsa. Sua respiração está pesada e suas mãos são firmes.

- Obrigada por ter trago ela. —Ela agarra o braço de Íris com força e aperta a puxando para dentro. Tem algo muito errado aqui. Caminho até o final do corredor e depois volto, ao ouvir a porta bater.

Encosto meu ouvido na porta e ouço um barulho forte como se alguma coisa tivesse quebrado.

Íris

Respira, vai ficar tudo bem. Respira, vai ficar tudo bem. Merda,só respira Íris, vai ficar tudo bem. As frases ecoavam em minha mente enquanto minha mãe gritava. Meu coração batia tão forte que já não conseguia mais ouvir o som dos objetos quebrando em minha frente.

- Você só me decepciona, Íris. — Minha mãe grita e lança meu celular contra a parede a sua frente. A pancada é tão grande que sinto pedaços de sua película encostarem meu tornozelo. Uma dor aguda invade meu peito e sinto que não vou conseguir mais respirar.

Tento me acalmar mas isso só piora meu estado. Eu paraliso e meu corpo parece estático. Minha mãe se aproxima e estranhamente, já sei exatamente o que vai sair da sua boca.

- Cuidado, desse jeito você nunca vai ter família. — Ela cospe as palavras na minha cara e sai. Meu corpo permanece imobilizado mas memórias gritam e sacodem dentro de mim. Me lembro exatamente do dia em que ela me falou isso. Meu pai tinha assinado o contrato do divórcio e isso a deixou devastada. Meu pequeno corpo de criança, que deveria ser ingenuamente livre, estava cobertos de hematomas. Esses feitos pela minha própria mãe. Por algo que eu nem fiz.
A cena se passa na minha mente e sinto como se estivesse lá novamente.

A campainha toca me tirando dos meus devaneios e finalmente, meu corpo oscila me trazendo de volta ao apartamento. Vou abrir mas minha mãe é mais rápida. Ouço a voz de Anna vindo do corredor.

- Posso falar com a Íris? —Anna pergunta.

Apareço na porta e ela me olha com um sorriso, disfarçadamente forçado.

- Você esqueceu de terminar de escrever aquela citação que tinha me falado mais cedo. Pode terminar agora, rapidinho? —Anna me pergunta, transmitindo um olhar de confiança.

Olho para minha mãe e ela se afasta para eu passar.

Passo meus olhos pelo caderno."Você precisa de ajuda? Confia em mim."

Sinto uma pontada de esperança me invadir mas logo desaparece, ao lembrar que não teria coragem.

Esboço um sorriso e pego o caderno. "Sei o que você tá pensando mas não é isso. Tá tudo bem, ela só não gostou de eu ter saído."

Queria ter falado a verdade, mas a verdade não aceitaria minha mãe e por mais que tudo isso esteja errado, eu sei que ela me ama. E eu tenho que a amar também.

- Eu acho que você deveria ir embora. —Minha mãe sussurra para tia Anna.

- Você não acha nada. Forte abraço. —Anna responde com deprezo.

Anna me encara,desesperada mas esboça um sorriso e sai pelo corredor. Meu coração palpita mais uma vez, quase gritando para ela voltar. Olho para o meu braço ao sentir a ardência do machucado, que os dedos da minha mãe ocasionaram. Por favor, volta.

- Isso foi pra você aprender. Não faça mais isso,Íris. — Minha mãe fala e sai em direção ao seu quarto.

  Ben

- Vou aí só porque é dia de virar a noite. — Mille me manda mensagem. Já era  02:00 da manhã e ela finalmente chega. Abro a porta e ela está de pijama com um chinelo. Mille é tão suave. Tem o cabelo loiro e liso que combina perfeitamente com seu rosto delicado. Seu rosto transparece alegria em qualquer momento do dia.

Ela sorri e entra na minha casa. Pegamos um colchão que minha mãe deu para ela no seu aniversário de 11 anos e está aqui em casa desde sempre. Acho que tudo que pertenceu um dia a minha mãe deveria ficar aonde ela já esteve um dia. Isso tornava minha casa, um lugar mais reconfortante. Por mais que ela tenha ido, ela continua aqui.

Deitamos no chão e eu conto tudo que aconteceu para Mille.

- Ben, você é muito sem vergonha as vezes. — Ela deita em minha perna e pergunta. — Você não contou, né?

- Eu não consegui e acho que não consigo ainda.

- Você vai esconder isso?

- Mas você sabe que eu não escolhi isso.

- Exatamente. Você não escolheu ser assim porque você é assim. E isso não é motivo de vergonha,Ben.

- Eu sei que você só quer me ajudar mas por favor, tenta entender. Eu quero muito isso.

Mille me lança um olhar mortal mas concorda.

- Eu vou te apoiar nisso mas só porque eu quero te ver feliz. Eu realmente espero que você saiba das consequências. —Assinto. — O que você vai fazer?

Explico tudo para Mille. Tinha vários coisas em mente mas confio mais em Mille do que em mim.

- Eu te ajudo, Ben. Amanhã é outro dia, deita aí.

Eu apoio minha cabeça em sua barriga e deito.

Anna

Chego em casa e vejo Camille e Ben dormindo na sala.
Acho tão lindo o quanto eles são fiéis um ao outro.

De repente, minha mente volta ao momento em que vejo Íris com o rosto inchado e o pulso marcado. Meu coração dói só de pensar que a deixei sozinha.

Vou pensar em algo. Sou perita criminal a sete anos e já sei como isso começa. Vou aos poucos mas vou dar um jeito.

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Com carinho,
Bella.

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