nine

1.1K 43 5
                                    

A BIBLIOTECA era o segundo lar da minha mãe e da minha família

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

A BIBLIOTECA era o segundo lar da minha mãe e da minha família.
Passávamos todas as tardes de domingo lá desde que eu era pequeno e andava no meio das prateleiras, puxando cada livro com desenho de navio pirata, cavaleiro, soldado ou
astronauta. Minha mãe costumava dizer: 'Aqui é minha igreja, Lia . É assim que mantemos
sagrado o dia de descanso na nossa família.
A bibliotecária-chefe do condado de Forks Marian Ashcroft, era a amiga mais antiga de
minha mãe, a segunda historiadora mais inteligente de Forks depois da minha mãe e, até o acidente , parceira de pesquisas dela.
Elas estudaram juntas em Duke, e quando Marian terminou seu PhD em estudos afroamericanos, seguiu minha mãe até Forks para terminarem seu primeiro livro juntas. Elas estavam no meio do quinto livro quando o acidente aconteceu.
Eu não tinha posto o pé na biblioteca desde então, e ainda não estava pronta . Mas também
sabia que nada me impedia de ir lá. Marian Ashcroft era da família. E todos os Ravenwoods que tinha amado minha mãe do mesmo jeito que Marian a
tinha amado, respeitava a família acima de tudo.

 E todos os Ravenwoods que tinha amado minha mãe do mesmo jeito que Marian atinha amado, respeitava a família acima de tudo

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Eu podia ver luz passando pelas janelas cobertas de hera. Ouvi barulho de música no fundo, músicas antigas de Savannah, daquele compositor da Geórgia que Alice amava. "In the cool cool cool of the evening..."
Ouvi latidos do outro lado da porta antes que tivesse batido, e em segundos a porta foi aberta. Lia  estava lá descalça, e ela parecia diferente, arrumada, com um vestido preto com pequenos pássaros bordados, como se fosse jantar em um restaurante chique. Eu parecia que ia para a biblioteca com o meu sueter inglês e jaqueta de linho .Ela saiu para a varanda, fechando a porta atrás de si.
—Jasper , o que está fazendo aqui?
Levantei a pasta de forma nada convincente.
— Trouxe seu dever de casa.
— Não acredito que você veio sem avisar. Falei que meu tio não gosta de estranhos.Ele só esta uns dias de visita , você pode voltar depois — Ela já estava me empurrando para descer a escada. — Você tem que ir. Agora.
— Pensei que podíamos conversar com ele.
Atrás de nós, ouvi alguém limpando a garganta. Olhei e vi o cachorro de Macon Ravenwood, e atrás dele, o próprio Macon Ravenwood. Tentei não parecer surpreso, mas tenho certeza de que me entreguei quando quase dei um pulo.
— Bem, isso é algo que não ouço com frequência. E odeio desapontar, pois não sou nada além de um cavalheiro sulista. — Ele falava com um sotaque sulista controlado, mas com perfeita pronúncia. — É um prazer finalmente conhecê-lo, Sr.Hale .
Eu não conseguia acreditar que estava parado em frente dele. O
misterioso Macon Ravenwood. Só que eu estava mesmo esperando encontrar Boo Radley, um cara que se arrastava pela casa de macacão, resmungando em uma espécie de linguagem monossilábica como um neandertal, talvez até babando um pouco nos cantos da boca.
Ele não era Boo Radley. Estava mais para Atticus Finch. Macon Ravenwood estava vestido impecavelmente, como se fosse 1942. A camisa branca engomada estava fechada com antiquados botões de prata em vez de botões comuns. O paletó do smoking estava perfeito, sem um amassado. Os olhos dele eram escuros e brilhantes; pareciam quase pretos. Eram enevoados, escurecidos, como as janelas do Volvo que Lia dirigia pela cidade. Não havia como ver dentro daqueles olhos, não havia reflexo.
Eles se destacavam no rosto pálido, que era branco como neve, branco como mármore, branco como, bem, como era esperado do recluso da cidade. O cabelo dele era grisalho, mais cinza perto do rosto, preto como o de Lia no alto. Ele poderia ser algum tipo de astro do cinema americano da época antes do Technicolor, ou talvez da realeza de algum pequeno país do qual ninguém nunca tinha ouvido falar por aqui. Mas Macon Ravenwood era daqui. Essa era a parte confusa. O Velho Ravenwood era o bicho papão de Forks , uma história que eu ouvia desde que conhecia essa cidade . Mas agora ele parecia pertencer à cidade ainda menos do que eu.
Ele fechou o livro que estava segurando, nunca tirando os olhos de mim
Estava olhando para mim, mas era quase como se estivesse olhando através de mim,
procurando por alguma coisa. Talvez ele tivesse visão raio-X.
Levando em consideração o que eu e minha familia era , tudo era possível..
Macon Ravenwood tinha me abalado e sabia disso. Nenhum de nós sorriu. O cachorro dele estava tenso e rígido ao seu lado, como se esperando a ordem de ataque.
— Onde estão meus modos? Entre, Sr.Hale . Estávamos prestes a nos sentarmos para jantar. Você deve se juntar a nós. O jantar é o ponto alto aqui em Ravenwood.
Olhei para Lia , esperando alguma dica.
Diga que não quer ficar.
Acredite, não quero.
— Não, está tudo bem, senhor. Não quero atrapalhar. Só vim deixar o dever de casa de Lia. — Levantei a pasta azul brilhante pela segunda vez.
— Bobagem, você tem que ficar. Vamos apreciar alguns cubanos na estufa depois do jantar, ou você é um homem de cigarrilhas? A não ser, é claro, que se sinta pouco à vontade para entrar na casa, e nesse caso eu entendo perfeitamente. — Eu não conseguia saber se ele estava brincando.
Lia passou o braço pela cintura dele, e eu pude ver seu rosto muda instantaneamente. Como o sol aparecendo entre nuvens negras em um dia cinzento.
— Tio M, não provoque Jasper . Ele é o único amigo que tenho aqui, e se você o espantar, terei que ir morar com tia Del, e assim não terá ninguém para torturar.
— Ainda terei Boo.
O cachorro olhou para Macon com expressão de dúvida.
— Vou levá-lo comigo. É a mim que ele segue pela cidade, não você.
Eu tinha que perguntar:
— Boo? O nome do cachorro é Boo Radley?
Macon deu um sorriso mínimo.
— Melhor ele do que eu. — Ele jogou a cabeça para trás e riu, o que me assustou, pois não
havia como eu ter imaginado as feições dele formando ao menos um sorriso. Ele abriu bem a porta. — De verdade, Sr.Hale , junte-se a nós. Eu adoro companhia, e faz séculos que Ravenwood teve o prazer de receber um convidado do nosso delicioso pequeno condado de Forks .
Lia sorriu sem jeito.
— Não seja esnobe, tio M. Não é culpa deles que você nunca fala com ninguém.
— E não é minha culpa que tenho uma queda por boa educação, inteligência razoável e higiene pessoal satisfatória, não necessariamente nessa ordem.
— Ignore-o. Ele está de mau humor. — Lia parecia sem graça.
— Deixe-me adivinhar. Tem alguma coisa a ver com o diretor Harper?
Lia assentiu.
— A escola ligou. Enquanto o incidente está sendo investigado, estou em observação. — Ela revirou os olhos.
— Mais uma "infração" e vão me suspender.
Macon riu com desprezo, como se estivéssemos falando de uma coisa completamente sem
consequências.
— Observação? Que divertido. Observação implicaria uma fonte de autoridade. — Ele nos
empurrou para o hall na frente dele. — Um diretor de escola de ensino médio acima do peso que mal terminou a faculdade e um bando de donas de casa raivosas com pedigrees piores que o de Boo Radley não se encaixam nessa categoria.
Passei pela porta e fiquei paralisado. O hall de entrada era grande e majestoso, Uma pintura a óleo gigantesca, o retrato de uma mulher incrivelmente bela com olhos dourados brilhantes, ficava sobre a escadaria, que não era mais moderna, mas uma escadaria clássica que parecia apoiada apenas no ar. Scarlett O'Hara podia ter descido por ela em uma saia armada e não pareceria nada deslocada. Lustres de cristal em camadas estavam pendurados no teto. O hall estava cheio de mobília vitoriana antiga, pequenos grupos de cadeiras bordadas cheias de detalhes, tampos de mesa de mármore e samambaias graciosas. Uma vela brilhava em cada superfície.

Portas altas e cobertas de persianas estavam abertas; a brisa trazia o aroma de gardênias, que estavam arrumadas em altos vasos de prata, posicionados nos tampos de mesa

Por um segundo, quase pensei estar de volta em uma das visões, só que o medalhão estava seguramente envolvido no lenço em meu bolso. Eu sabia porque verifiquei. E aquele cachorro assustador ficava me olhando da escadaria.
Mas não fazia sentido. Ravenwood tinha se transformado em uma coisa completamente
diferente desde a última vez que estive lá. Parecia impossível, como se eu tivesse voltado no tempo. Mesmo se não fosse real, queria que Esme e ALice tivesse visto isso. Elas teria amado esse lugar. Só que agora parecia real, e eu sabia que a casa grande era assim a maior parte do tempo. Parecia com Lia, com o jardim murado, com Forks
Por que não era assim antes?
Do que você está falando?
Acho que você sabe
Macon andava na nossa frente. Viramos no que tinha sido uma sala de estar aconchegante
semana passada. Agora era um grandioso salão de baile, com uma longa mesa com pés em forma de garra posta para três, como se eles estivessem me esperando.
O piano continuou a tocar sozinho no canto. Deduzi que era um daqueles automáticos. A cena era assustadora, como se a sala devesse estar tomada pelo barulho de copos e risadas.
Ravenwood estava dando a festa do ano, mas eu era o único convidado.
Macon ainda estava falando. Tudo que ele dizia ecoava nas paredes gigantes com afrescos e tetos abobadados e esculpidos.


— Acho que sou um esnobe. Abomino cidades pequenas. Abomino cidadãos de cidades
pequenas. Eles têm mentes estreitas e traseiros enormes. Isso quer dizer que aquilo que falta neles por dentro existe em excesso por fora. São como porcarias alimentares. Engordam e não levam a satisfação nenhum — Ele sorriu, mas não foi um sorriso simpático
— Então por que não se muda daqui?
Senti uma onda de irritação que me levou de volta à realidade, fosse qual fosse a realidade
onde eu estava. Uma coisa era eu fazer piada de Forks . Era diferente vindo de Macon
Ravenwood. Vinha de um lugar diferente.
— Não seja absurdo. Ravenwood é meu lar, não Forks . — Ele cuspiu a palavra como se ela fosse tóxica. — Quando eu me for dos limites dessa vida, terei que encontrar alguém para cuidar de Ravenwood no meu lugar, já que não tenho filhos. Sempre foi meu grande e terrível objetivo manter Ravenwood viva. Gosto de pensar sobre mim mesmo como o curador de um museu vivo.
— Não seja tão dramático, tio M.
— Não seja tão diplomática, Lia. Por que você quer interagir com aquelas pessoas limitadas
da cidade, jamais entenderei.
O cara está certo.
Está dizendo que não quer que eu vá à escola?
Não... Só quis dizer...
Macon olhou para mim.
— Exceto nossa companhia atual, é claro .
Quanto mais ele falava, mais curioso eu ficava. Quem diria que o Velho Ravenwood era a terceira pessoa mais inteligente da cidade, depois da mãe de Lia e Marian Ashcroft? Ou talvez a quarta, caso Carlisle começasse a frequentar os ciclos socais de forks.
Tentei ver o nome do livro que Macon estava segurando.
— O que é isso, Shakespeare?
— Betty Crocker, uma mulher fascinante. Eu estava tentando me lembrar o que os cidadãos locais consideravam uma refeição noturna. Estava no clima para uma receita regional esta noite. Decidi fazer carne de porco grelhada. — Mais carne de porco grelhada. Me senti enjoado só de pensar.
Macon puxou a cadeira de Lia com um floreio.
— Falando em hospitalidade, Lia, seus primos vêm para os Dias de Reunião. Lembremos de dizer para a Casa e Cozinha que teremos cinco pessoas a mais.
Lena parecia irritada.
— Direi para a equipe da cozinha e para os empregados da casa, se é isso que quer dizer, tio M.
— O que são os Dias de Reunião?
— Minha família é muito estranha. A Reunião é só um festival antigo de colheita, como um Dia de Ação de Graças antecipado. Deixa pra lá.
Eu nunca soube de ninguém que visitasse Ravenwood, familiar ou não.
Nunca tinha visto um único carro virar naquela bifurcação da estrada.
Macon parecia divertido.
— Como quiser. Falando em Cozinha, estou completamente faminto. Vou ver o que ela preparou para nós.
Enquanto ele falava, ouvi panelas e potes batendo em algum recinto distante do salão.
— Não exagera, tio M. Por favor.
Observei Macon Ravenwood desaparecer por uma sala. Eu ainda ouvia o barulho dos seus
sapatos elegantes no chão polido. Essa casa era ridícula, azia a Casa Branca parecer uma
cabana de fundo de roça.
— Lia, o que está acontecendo?
— O que você quer dizer?
— Como ele sabia que devia arrumar o lugar para mim?
— Ele deve ter feito isso quando nos viu na varanda,
— E quanto a esse lugar? Entrei na sua casa no dia que achamos o medalhão. Não era nada desse jeito.
Conte para mim. Pode confiar.
Ela brincou com a barra do vestido. Teimosa.
— Meu tio gosta de antiguidades. A casa muda o tempo todo. Isso é mesmo importante?
Seja lá o que fosse que estivesse acontecendo, ela não ia me contar agora.
— Tudo bem então. Você se importa se eu der uma olhada?
Ela franziu a testa, mas não disse nada. Levantei da cadeira e andei até a sala ao lado. Estava arrumada como um pequeno escritório, com sofás, uma lareira e algumas pequenas mesas de escrever. Boo Radley estava deitado em frente ao fogo. Ele começou a rosnar no momento que botei o pé na sala.
— Bom cachorrinho.
Ele rosnou mais alto. Andei de costas para fora da sala. Ele parou de rosnar e deitou a cabeça perto da lareira.
Sobre a mesa de escrever mais próxima havia um pacote, embrulhado em papel pardo e
amarrado com um barbante. Eu o peguei. Boo Radley começou a rosnar de novo. Estava
carimbada Biblioteca do Condado de Forks . Eu conhecia o carimbo. Minha mãe tinha
recebido centenas de pacotes como aquele. Só Marian Ashcroft se daria ao trabalho de
embrulhar um livro daquele jeito.
— Você se interessa por bibliotecas, Sr.Hale ? Conhece Marian Ashcroft? — Macon apareceu do meu lado, pegando o pacote da minha mão e olhando para ele com prazer.
— Sim, senhor. Marian, a Dra. Ashcroft,é muito amiga da minha mãe . Elas trabalhavam juntas.
Os olhos de Macon brilharam momentaneamente, e depois nada.
O momento passou.
— É claro. Que grande burrice minha.Jasper Hale . Eu conheço sua mãe.
Congelei. Como Macon Ravenwood podia ter conhecido Esme ?
Uma expressão estranha passou por seu rosto, como se estivesse relembrando algo que tinha esquecido.
— Através do trabalho dela, é claro. Li tudo que ela escreveu. Na verdade, se você olhar de
perto as notas de rodapé de Fazendas e Plantações: Um Jardim Dividido, verá que várias das fontes primárias de seu estudo vieram da minha coleção pessoal. Sua mãe é brilhante.
Consegui dar um sorriso.
— Obrigado.
— Eu ficaria honrado em mostrar minha biblioteca a você, naturalmente. Seria um grande
prazer compartilhar minha coleção com um dos filhos de Esme Platt
Olhei para ele, aturdido pelo som do nome da minha mãe saindo da boca de Macon  Ravenwood.
—Cullen . Esme Platt Cullen .
Ele sorriu mais abertamente
— É claro. Mas cada coisa no seu tempo. Acredito, pela ausência de ruídos na Cozinha, que o jantar foi servido. — Ele deu um tapinha no meu ombro e andamos de volta para o grande salão.
Lia estava esperando por nós à mesa, acendendo uma vela que tinha apagado com a brisa da noite. A mesa estava coberta com um banquete elaborado, embora eu não conseguisse imaginar como tinha chegado ali. Eu não tinha visto uma única pessoa na casa, além de nós três. Agora havia uma nova casa, um cachorro-lobo e tudo isso. E eu tinha esperado que Macon Ravenwood fosse a parte mais esquisita da noite.
Havia comida o bastante para alimentar o FRA, todas as igrejas da cidade e o time de
basquete reunidos. Só que não era o tipo de comida que já tivesse sido servido em Forks .
Havia uma coisa que parecia um porco assado inteiro, com uma maçã enfiada na boca. Um
assado de costela com papel-alumínio embrulhando a ponta de cada costela estava ao lado de um ganso desfigurado coberto de castanhas. Havia tigelas de molho de carne e outros molhos e cremes, pães de vários tipos, repolho e beterraba e pastas que eu não sabia identificar. E, é claro, sanduíches de carne de porco grelhada, que pareciam bastante deslocados no meio dos outros pratos. Olhei para Lia, enjoado ao pensar o quanto eu teria que comer para ser educado.

— Tio M. Isso é muita coisa.
Boo, enrolado ao redor das pernas da cadeira de Lena, balançou o rabo de expectativa.
— Bobagem. Isso é uma comemoração. Você fez um amigo. A Cozinha vai ficar ofendida.
Lia olhou para mim com ansiedade, como se tivesse medo de que eu fosse levantar para ir ao banheiro e fugisse. Dei de ombros e comecei a encher meu prato.
Quando Macon estava servindo seu terceiro copo de uísque, pareceu ser um bom momento
para falar no medalhão. Pensando bem, eu o tinha visto encher o prato de comida, mas não o vi comer nada. As coisas pareciam desaparecer de seu prato com apenas uma ou duas
garfadas. Talvez Boo Radley fosse o cachorro mais sortudo da cidade.
Dobrei meu guardanapo.
— O senhor se importa se eu perguntar uma coisa? Já que o senhor parece saber tanto sobre História e, bem, não posso perguntar para minha mãe.
O que você está fazendo?
Só estou fazendo uma pergunta.
Ele não sabe de nada.
Lia, temos que tentar.
— É claro.
Macon tomou um gole do copo.
Enfiei a mão no bolso e peguei o medalhão da bolsinha que Esme tinha me dado, tomando
cuidado para mantê-lo embrulhado no lenço. Todas as velas se apagaram. As luzes ficaram
fracas e depois também se apagaram. Até a música do piano parou.
Ethan, o que você está fazendo?
Não fiz nada.
Ouvi a voz de Macon na escuridão,
— O que é isso na sua mão, filho?
— É um medalhão, senhor.
— Incomodaria muito botá-lo de volta no bolso? — A voz dele estava calma, mas eu sabia
que ele não estava. Eu podia perceber que estava se esforçando muito para se controlar. A
atitude falastrona dele tinha sumido. A voz estava meio aguda, tinha uma sensação de urgência
que ele estava tentando muito disfarçar.
Enfiei o medalhão de volta na bolsinha e a coloquei no meu bolso. Na outra ponta da mesa,
Macon tocou os dedos nos candelabros. Um a um, as velas na mesa acenderam de novo. O banquete todo tinha desaparecido.
À luz de velas, Macon parecia sinistro. E também estava em silêncio pela primeira vez desde que o conheci, como se pesasse suas opções em uma balança invisível que de alguma forma tinha nosso destino nela. Era hora de ir. Lena estava certa, isso era uma péssima ideia. Talvez houvesse uma razão para que Macon Ravenwood nunca saísse de casa.
— Desculpe, senhor. Eu não sabia que isso ia acontecer. Minha irmã , Alice , agiu
como... como se o medalhão fosse realmente poderoso quando o mostrei a ela. Mas quando Lia e eu o achamos, nada de ruim aconteceu.
Não conte mais nada a ele. Não mencione as visões.
Não contarei. Só queria descobrir se eu estava certo sobre Genevieve.
Ela não precisava se preocupar; eu não queria contar nada a Macon Ravenwood. Só queria
sair dali. Comecei a me levantar.
— Acho que preciso ir para casa, senhor. Está ficando tarde.
— Você se importa de descrever o medalhão para mim? — Foi mais uma ordem do que um
pedido.
Não falei uma palavra.
Foi Lia que finalmente falou.
— É velho e está danificado, com um camafeu na frente. Achamos perto da tribo .
Macon girou o anel de prata, agitado.
— Você devia ter me contado que foi a floresta . Não é parte de Ravenwood. Não posso
mantê-la segura lá.
— Eu estava segura lá. Dava pra sentir.
Segura de quê? Isso era mais do que um pouco superprotetor. Não poderia ser o que eu imaginava , poderia ?
— Não estava. É além dos limites. Não pode ser controlado, por ninguém. Há muita coisa que você não sabe. E ele... — Macon gesticulou em minha direção na outra ponta da mesa. — Ele não sabe de nada. Não pode proteger você. Você não devia tê-lo envolvido nisso

Eu mal podia esperar para sair daquela casa. Eu queria me afastar do tio assustador de Lia e de sua casa de horrores. Que diabos tinha acabado de acontecer? Lia me apressou até a porta, como se tivesse medo do que podia acontecer se não me tirasse de lá. Mas quando passamos pelo hall principal, reparei uma coisa que não tinha reparado antes.
O medalhão. A mulher com os assombrosos olhos dourados na pintura a óleo estava usando o medalhão. Agarrei o braço de Lena. Ela viu e ficou paralisada.
Não estava aí antes.
O que você quer dizer?
Esse quadro está pendurado aí desde que eu era criança. Passei por ele milhares de vezes. Ela nunca esteve de medalhão.

Uma bifurcação na estrada
Nós mal nos falamos enquanto íamos de carro para a minha casa. Eu não sabia o que dizer, e Lia parecia agradecida por eu estar calado.
Ela me deixou dirigir, o que era bom porque eu precisava de algo para me distrair até que
minha cabeça parasse de girar . Passamos pela minha rua, mas eu não me importei. Não estava pronto para ir para casa. Não sabia o que estava se passando com Lia nem com sua casa e nem com seu tio, mas ela ia me contar.
— Você passou direto pela sua rua. — Foi a primeira coisa que ela disse .
desde que saímos de Ravenwood.
— Eu sei.
— Você acha que meu tio é louco, como todo mundo. Apenas diga. Velho Ravenwood. — A voz dela estava amarga. — Preciso voltar para casa.
Não falei uma palavra enquanto circulamos General's Green, o pedaço redondo de grama
desbotada que rodeava a única coisa em Forks  que chegou a livros de guias turísticos: o general, uma estátua do general da Guerra Civil Jubal A. Early. O general marcava seu território, como sempre tinha feito, o que agora me parecia meio errado. Tudo tinha mudado; tudo continuava mudando. Eu estava diferente, vendo coisas e sentindo coisas e fazendo coisas que mesmo uma semana atrás pareceriam impossíveis. Eu sentia como se o general devesse ter mudado também.
Desci a Dove Street e encostei o volvo  no meio fio, bem embaixo da placa que dizia BEM VINDOS A FORKS , LAR DAS FAZENDAS
HISTÓRICAS MAIS PECULIARES DO NORTE E DA MELHOR TORTA DE CREME DO
MUNDO. Eu não tinha certeza sobre a torta, mas o resto era verdade.
— O que você está fazendo?
Desliguei o carro.
— Precisamos conversar.
— Não fico dentro de um carro estacionado com rapazes. — Era uma piada, mas eu podia
perceber em sua voz. Ela estava apavorada.
— Comece a falar.
— Sobre o quê?
— Está brincando, certo? — Eu estava tentando não gritar.
Ela puxou o cordão, remexendo no medalhão dourado .
— Não sei o que você quer que eu diga.
— Que tal me explicar o que aconteceu na casa?
Ela olhava a escuridão pela janela.
— Ele estava zangado. Às vezes ele perde a cabeça.
— Perde a cabeça? Você quer dizer lançar coisas pela sala sem tocar nelas e acender velas sem fósforos?
— Jasper , desculpa. — A voz dela estava baixa.
Mas a minha não estava. Quanto mais ela evitava minhas perguntas, mais irritado eu ficava.
— Não quero que peça desculpa. Quero que me conte o que está acontecendo.
— Sobre o quê?
— Seu tio e a casa esquisita dele, que ele de alguma forma conseguiu redecorar em dois dias. A comida que aparece e desaparece. Todo o papo sobre limites e proteger você. Escolha um.
Ela sacudiu a cabeça.
— Não posso falar sobre isso. E você não entenderia de qualquer jeito.
— Como sabe se não me dá uma chance?
— Minha família é diferente de outras famílias. Acredite em mim, você não vai conseguir
lidar com isso.
— O que isso quer dizer?
— Encare, Jasper Você diz que não é como eles, mas é. Você quer que eu seja diferente, mas só um pouco. Não diferente de verdade.
— Sabe de uma coisa? Você é tão doida quanto seu tio.
— Você foi à minha casa sem ser convidado e agora está irritado porque não gostou do que
viu.
Não respondi. Eu não conseguia ver nada pela janela e não consegui pensar claramente
também.
— E está irritado porque está com medo. Todos estão. No fundo, você são todos iguais. —
Lia soava cansada agora, como se já tivesse desistido.
— Não. — Olhei para ela. — Você está com medo.
Ela riu com amargura.
— Tá certo. As coisas das quais tenho medo você não consegue nem imaginar.
— Está com medo de confiar em mim.
Ela não disse nada.
— Está com medo de conhecer alguém bem o bastante a ponto de perceber se ele foi ou não à escola.
Ela passou o dedo pelo embaçado na janela. Fez uma linha tremida como um ziguezague.
— Está com medo de ficar e ver o que acontece.
O ziguezague virou uma coisa que parecia um raio.
— Você não é daqui. Está certa. E não é só um pouco diferente.
Ela ainda olhava pela janela, para o nada, porque ainda não dava para ver lá fora. Mas eu
podia vê-la. Eu podia ver tudo.
Você
é
incrivelmente,
absolutamente,
extremamente,
inacreditavelmente diferente.
— Toquei o braço dela com a ponta dos dedos, e imediatamente senti o calor da eletricidade. — Sei disso porque lá no fundo eu acho que também sou. Então me diga. Por favor. Diferente como?
— Não quero contar pra você.
Uma lágrima escorreu por sua bochecha. Peguei-a com meu dedo, e ela também era quente.
— Por que não?
— Porque essa pode ser minha última chance de ser uma garota normal, mesmo que seja em Forks Porque você é meu único amigo aqui. Porque se eu contar, você não vai acreditar em mim. Ou pior, vai acreditar. — Ela abriu os olhos e olhou dentro dos meus. — De qualquer modo, você nunca mais vai querer falar comigo.

𝐌𝐎𝐑𝐍𝐈𝐍𝐆 𝐒𝐓𝐀𝐑 | 𝘫𝘢𝘴𝘱𝘦𝘳 𝘩𝘢𝘭𝘦Onde histórias criam vida. Descubra agora