Fantasma Branco

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Finalmente, eu iria dizer: diria a ela que eu era bissexual. Estava nervoso, mas eu estava pronto. Durante todo aquele ano eu estive procurando falar sobre isso para todas as pessoas do meu ciclo. É claro, eu já sabia fazia muito tempo, mas só naquele fatídico dia eu tinha tomado coragem para falar.

Eu diria até que sou o primeiro da minha lista de colegas do fundamental que saiu do armário. Alguns levaram mais de meia década. Outros nem ainda se revelaram, mas a gente sabe que são.

Enfim, eu tinha arrumado uma namorada no colégio. Hoje não é nada de demais, é só aquele romance de colégio que você alguma hora vai ter, e ele vai ficar marcado pro resto da sua vida, provavelmente pelos piores motivos. E assim o foi.

Mas, na época, ela era a garota. Daquele jeito que nerd roqueiro magricela gosta: metaleira. Pena que só curtia trash metal, e o nome já diz por si só: é um lixo. Mas o cheiro de couro velho já era ótimo.

Eu sou bissexual, eu disse, numa praça de alimentação de um shopping qualquer.

Ela hesitou um pouco para responder, talvez para buscar aceitar a situação, talvez para formular uma frase que valesse a pena ser ouvida.

E quando que você vai me largar pra beijar boca de homem? foi o que ela disse no fim.

Aquilo deveria ser o término. Mas não foi. Hoje em dia, teria sido, mas eu gostava dela demais a ponto de praticamente pedir desculpa por eu ser "meio viado". Uma pessoa pode mudar pra você de uma frase pra outra. As relações e os gostares são tão fragilizados que não se sustentam frente a um desafio. Viado, viado, viado, tudo o que eu tinha virado para ela era um viado, nem menos um bissexual, caralho.

Meses se passaram até eu conseguir terminar com ela, na verdade ela parecia que estava me esperando tomar essa iniciativa. Ela nunca mais me aceitou, nem sequer fez o esforço. Talvez porque ela fosse crente (sim, metaleira crente, também me deixou confuso). Só sei que não chego perto de me envolver com crentes nem que me paguem.

Hoje sou livre para ficar com quem eu bem entender. Hoje entendo o que é ser mais do que um rótulo, um gosto, um pensamento. Hoje a vida vale a pena.

Ainda sonho com ela todas as noites.

Desalinhos e TormentosOnde histórias criam vida. Descubra agora