capítulo 9

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As lágrimas caíam sem parar sobre as bochechas brancas de Felicia. Ela continuou caminhando, de cabeça baixa, sem compreender aonde seus pés despreocupados a levavam, envolta em pensamentos.

O sol era intenso e queimava sua nuca. As pernas doíam e parecia que Felicia estava andando havia muito tempo, mas, por estranho que parecesse, não sentia desejo de parar. Algum instinto que fugia de seu controle a incitava a continuar andando. Sua blusa estava molhada de suor e o cabelo grudava-se na pele. Ela ergueu a mão com indiferença para afastar uma mosca persistente que voava perto de seu ouvido. Sua cabeça estava confusa, e ela, com muita, muita sede. Felicia pensou em um copo de suco de limão fresco. Então, fez uma pausa súbita e olhou para trás, na direção de onde tinha vindo. Estava perdida! Completa e absolutamente perdida. Ela violara a primeira lei do deserto. Caminhara para longe da proteção acolhedora do oásis e ninguém sabia aonde fora.

O que era pior, Zahra e Umm Faisal iriam visitar a mãe de Saud à tarde e provavelmente ninguém perceberia a sua ausência até que ela não aparecesse para o jantar! A dura realidade de sua condição dissipou a névoa que impedia sua mente de funcionar. Por mais que procurasse na distância, não havia sinal do oásis, não havia sinal de nada, exceto a vasta solidão do deserto.

Ela teve que se sentar porque as pernas de repente se recusaram a sustentá-la por mais tempo, e, de qualquer forma, não havia uma recomendação quanto a ficar em um único lugar, porque quando você estava perdido, andava em círculos exaurindo as frágeis defesas do corpo e tornando mais difícil o resgate? Felicia passou a língua pelos lábios e provou o sal que rodeava seu lábio superior. Fechando os olhos em desespero, ela se lembrou dos tabletes de sal que deveria estar tomando. Enjôo e tontura a tomaram em ondas que se alternavam, os olhos doíam por conta do clarão violento do sol. Para qualquer parte que olhasse só via uma interminável paisagem de areia.

Com o tempo, quando ficou definitivamente claro que estava de fato perdida, se deixou cair ao pé de uma das dunas, torcendo para que a exígua sombra que ela oferecia proporcionasse alguma proteção contra o calor desidratante do sol.

Nada se mexia. A única criatura tola o suficiente para desafiar a natureza era ela: uma pálida e frágil fêmea.

O tempo passou. Ela dormiu e acordou, com câimbra e sedenta como nunca.

O mundo era uma bacia de latão fervente, sem lugar para onde pudesse escapar dos fortes raios do sol.

Ela fechou os olhos de novo e tentou não pensar nas fontes borbulhantes dos pátios. Passou a língua pelos lábios rachados. A garganta parecia ter engolido o Saara inteiro. Sua ausência já teria sido percebida? Sem o seu relógio, ela não tinha como medir o tempo.

Primeiro, lentamente; depois, cora um medo crescente, Felicia percebeu que, quando alguém desse conta de sua ausência, poderia ser tarde demais.

Ela teria chorado, mas não possuía mais lágrimas. Enjoada e exausta, tentou se arrastar um pouco mais pela areia, mas novas ondas de náusea a impediram. A paisagem dançava sob os pés dela e os olhos se recusavam teimosamente a enxergar direito.

Emitiu um soluço seco. Morreria sozinha naquele ambiente árido; seus ossos seriam pegos por abutres.

Felicia ficou histérica. Pare com isso!, ordenou a si mesma. Não conseguiria nada se deixasse se levar pelas emoções. Ela não podia culpar a ninguém a não ser a si mesma, e, de qualquer forma, que prazer tinha H vida para ela agora?

O insistente sol da tarde lançava longas sombras sobre o deserto. Muito acima da areia do deserto inerte, um pássaro dava voltas e planava, uma pequena mancha na distância. Sua audição aguçada, mais precisa que a de qualquer humano, escutou um som que atravessou o ar límpido e ele fez círculos sobre a garota umas duas vezes antes de se dirigir batendo as asas para o oeste. Vozes foram ouvidas pela consciência de Felicia sem muita clareza, como as ondas escutadas através de uma concha.

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