Capítulo 6

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Decidimos fazer nosso tempo contar. Passamos todos os dias juntas, dormi em sua cama mais do que na minha, cozinhamos, vimos filmes, passeamos pela cidade, visitamos museus, passamos manhãs em parques, noites em bares... Uma despedida de São Paulo, uma despedida do Brasil. E ficamos em casa, a vida caseira era tão mais gostosa com Amélia. Até quando líamos nossos livros ou estudávamos estávamos juntas, no mesmo ambiente com as pernas entrelaçadas ou as mãos juntas no sofá.

Queria gravar seu toque, memorizar sua existência perto de mim. Seu cheiro, suas manias, sua voz... A rotina junto dela que sempre parecia tão certa e confortável. O presente e o futuro que nem sabia que sonhava mas que agora não queria deixar escapar.

Comprei um vestido vermelho para sua formatura. Ela foi de azul e me sinto na obrigação de pontuar que estava absurdamente linda. Dançamos muito naquela noite, alívio e felicidade estampados em seu rosto. E uma ponta de esperança de que em um ano seria minha vez de finalmente terminar essa fase da vida.

Bebemos, dançamos mais, abraçamos amigos e a nós mesmas, demos risadas e tropeçamos nas calçadas. Tiramos fotos, sujamos a barra dos vestidos, fugimos do salão para o campo de futebol atrás do prédio da faculdade e nos deitamos na grama depois de a festa ter terminado. Ficamos lá, com a brisa gelada da madrugada adormecida pelo álcool, com nossos caros vestidos formais se arrastando na grama e a alta risada de Amélia sem motivo algum fazendo com que me sentisse a pessoa mais feliz do mundo. E com beijos molhados e atrapalhados, bêbados como nós.

Me sentia mais apaixonada do que nunca. Na última semana de Amélia no Brasil faltei em todas as aulas, recuperaria o tempo perdido depois. Já me doía o suficiente por passar as tardes longe dela na livraria. Timóteo às vezes me liberava mais cedo ao perceber o quão inquieta estava, encarando o relógio.

Haviam dias em que chegava em seu apartamento e encontrava uma loira descabelada enlouquecendo com a papelada da viagem, falando alto ao telefone; outros com uma mesa posta com café da tarde para passarmos mais um pôr do sol como duas senhorinhas que moram no interior; outros com uma trilha de pétalas de rosa até o quarto para encontrá-la na cama com uma lingerie preta me aguardando à luz de velas. Não medimos esforços ou mentimos quando dissemos que iríamos experimentar e vivenciar tudo o que pudéssemos antes de sua partida, dos clichês às aventuras.

A verdade é que, mesmo só tendo as noites e as manhãs, transamos mais nessas semanas do que nos últimos meses que passamos juntas. E tivemos ótimas noites de sono consequentes do cansaço. O que nos enchia de energia para o próximo dia e fazia com que todos eles fossem incríveis.

Sentia que estava vivendo um sonho. Mas, quando me encontrava sozinha na livraria, organizando prateleiras e catalogando literaturas, me via alheia ao mundo exterior, focada no aperto no peito que sentia ao lembrar que ela iria embora por dois anos.

Vinte e quatro meses sem tocar Amélia, sem sentir seu cheiro, sem ouvir sua voz ao vivo, sem seus cabelos fazendo cócegas em minha pele enquanto traçava beijos pelo meu corpo.

Mas com histórias, ligações e mensagens, chamadas de vídeo e fotografias. Tinha esperanças de que, como em filmes antigos de casais que sobreviveram a anos de correspondências em carta, poderíamos sair ilesas de nossa separação.

Divagávamos sobre o custo de vida na Itália e sua culinária, a língua e o sistema de ensino, aviões e distância, fuso horário e rotina, tentando fazer com que estar longe não significasse estar longe. Mesmo com nossa juventude ainda cheia de hormônios enlouquecidos e imprudentes.

Anunciamos seus móveis na Internet e encaixotamos seus pertences. Alguns dos livros foram para meu apartamento, onde seriam, segundo ela, mais bem utilizados. Além deles, um quadro. A minha tela preferida das paredes de Amélia, um presente. Ela até colocou um laço em cima da moldura antes de levá-la até meu quarto.

Encarei sua casa vazia por longos minutos antes de finalmente a seguir para fora e trancar a porta, entregando as chaves ao proprietário e finalmente dando adeus ao lugar que marcou o início de nosso relacionamento e que foi ambiente de tantas memórias em um período tão curto de tempo.

Rodrigo nos deixou na calçada em frente ao meu prédio e seguiu viagem. Subimos as escadas e encontramos Marina e Daniel no sofá assistindo a um filme. Fomos direto para o quarto, desesperadas para nos livrarmos do suor da mudança. Amélia ligou o chuveiro e logo me juntei a ela para um momento muito mais cuidadoso do que erótico. Nos limpamos e saímos, partindo para a cama enquanto ainda sentíamos os músculos do corpo doloridos por uma tarde de faxina e organização.

Estava acostumada em passar tempo com Amélia em seu apartamento, foi engraçado tê-la no meu. Daniel havia se mudado há pouco tempo, era um espaço pequeno para quatro pessoas.

Ela partiu três dias depois.

-Eu te amo -disse a ela antes de adormecer, na sua última noite em São Paulo.

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