Você

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— Ei — uma voz ressoava em minha cabeça enquanto meus olhos cansados ainda estavam fechados. — Acorda, a aula já acabou

Levantei a cabeça e minha visão foi ficando cada vez menos embaçada. Enxergava uma silhueta feminina na minha frente. Não sabia quem era, mas ainda a escutava me chamar.

A silhueta soltou uma risada leve. Depois disso já soube quem era.

Rapidamente meu olhar subiu e eu pude ver seu rosto outra vez.

— Não dormiu direito essa noite? — Catra estava em frente a minha mesa com uma das mãos na cintura e me lançando um olhar reconfortante.

Ela tinha prendido o cabelo num rabo de cavalo alto, usava um jeans escuro e uma de suas blusas de alguma banda qual eu provavelmente não conhecia. Mesmo com roupas tão básicas ela ficava deslumbrante.

Não consegui respondê-la de imediato. Parecia que eu tinha travado, as palavras estavam presas dentro de mim e não sabiam como sair.

— Adora? — A voz dela ressoou dentre meus devaneios.

— Ah — ela conseguiu me acordar do transe — Pois é. A escola tá me estressando. Eu não to conseguindo dormir bem essa semana. Quer dizer... final de semestre né? Quem não fica preocupado nesse período...

Caramba, caramba, caramba. Eu falei demais.

Ela inclinou a cabeça com as feições confusas, me encarando. Eu era muito idiota.

No final ela só soltou uma risada genuína e sorriu na minha direção.

Acho que minha pressão caiu.

— Você é fofa. — A forma qual ela me olhava fez meu coração querer pular pra fora do meu peito. — Enfim, vamos embora, não tem quase ninguém na escola.

Espera... "vamos"?

Ok eu não tinha muito tempo pra ficar pensando. Apenas juntei minhas coisas, coloquei minha mochila nas costas e acompanhei o caminhar da garota ao meu lado qual ia pra fora da escola.

Eu não sabia muito bem o que fazer, então apenas segui meu caminho para casa e ela foi me acompanhando.

O silêncio entre nós estava me matando.

— Então... — Tentei puxar assunto — O que aconteceu pra você chegar tão tarde na escola?

— Minha mãe teve um problema em casa. — ela não parecia querer falar muito sobre isso.

Novamente o silêncio se instalou entre nós.

Eu odiava aquilo, odiava quando as pessoas ficavam em silêncio. Parecia que elas estavam bravas comigo.

Nós caminhávamos uma ao lado da outra, a brisa fresca e o sol morno atingiam nossos corpos e era bom. Mesmo eu estando nervosa ao lado dela, e quase nao conseguindo olhar em seu rosto, sua companhia era boa.

Eu queria achar algum assunto, mas o que?

— Você já foi em Sallineas? — como um estalo soltei essa pergunta.

Ela pareceu surpresa com a pergunta.

— Já fui sim. — Ela demorou um pouco para terminar a sentença. — Uma vez com a minha mãe e o meu pai antes deles se divorciarem.

Eita...

— Ai, nossa, desculpa por ter feito você lembrar disso. — eu era muito idiota.

— Tá tudo bem, calma— ela respondeu, rindo. — Sallineas me trás boas lembranças, eu não vou lá desde os meus 8 anos.

A cada vez que nós conversávamos eu me sentia mais próxima dela; mais conectada a ela.

— Mas por que pergunta? — ela continuou

— É que a Mermista chama nosso grupo de amigos pra ir pro hotel dos pais dela em Sallineas todo ano. Eu nunca tinha aceitado. — Expliquei a ela.

— E você nunca foi pra lá.— A garota disse ao meu lado como uma suposição.

— É... E eu fico um pouco nervosa com a ideia de ir...

—  Por que? Lá é tão tranquilo. — ela me perguntou num tom confuso.

Nós continuávamos a caminhar lentamente. Estávamos quase chegando na rua da minha casa.

— Digamos que eu tenha certos problemas com o mar... — Respondi

— Caramba... — um silêncio permaneceu entre nós durante um período curto. — Eu já conheci alguém que também tinha esse mesmo medo. Mas faz tempo que a gente não conversa.

Eu sabia de quem ela tava falando. Só de pensar nela descobrindo que era eu que mandava os bilhetes na aula eu ficava nervosa.

E se ela me achasse covarde ou estranha por não ter conversado diretamente de primeira?

Acho melhor manter isso em segredo.

Sendo salva pelo caminho, nós já estávamos chegando perto da minha casa.

Esse era um dos lados bons de morar em cidade pequena, dava pra ir de um lugar ao outro caminhando.

— Bom, eu paro aqui. — Falei quando chegamos em frente a minha casa.

Antes de entrar e ela ir embora, eu parei por alguns segundos e me virei em sua direção.

— Por que você me acompanhou até aqui? — perguntei. — Que eu saiba você não mora por perto.

De onde aquela coragem tinha saído? Boa pergunta, por que eu também não sei.

Ela estava de costas para mim. Quando fiz a pergunts, ela apenas parou e e direcionou o olhar para trás.

— Eu cheguei tarde na escola, mal deu tempo de te ver. E eu precisava da minha dose diária de você. — A garota me respondeu com aquele sorriso. Ah meu deus, aquele sorriso, eu achava que eu ia desmanchar.

Ela continuou a caminhar, sem olhar para trás enquanto eu fiquei igual uma otaria na porta de casa sem saber o que fazer.

Eu tinha travado. De novo.

Aquela garota não fazia ideia do quanto ela mexia comigo

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⏰ Última atualização: Jul 26, 2021 ⏰

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Cinza • Catradora Onde histórias criam vida. Descubra agora