A primeira coisa que pensei quando coloquei os pés na universidade foi que eu tinha um problemão para resolver.
Ok, talvez eu esteja mentindo. Meu primeiríssimo pensamento foi de que aquele lugar era lindo demais. Havia tanto vidro no prédio que jamais precisaria de espelhos: conseguia ver meu reflexo em qualquer lado que olhasse. Mas o que fazia um eco enorme na minha cabeça conforme eu seguia pelo piso imaculado e brilhante era que, mesmo depois de tanto esforço, eu estava terrivelmente deslocada ali.
Tinha três anos na Espanha pela frente. Maravilhoso, não é? Exceto pelo pequeno detalhe de que eu não falava espanhol. Só hola e gracias e mesmo isso soava ridículo quando saía dos meus lábios.
Minha primeira opção para o intercâmbio foi a Inglaterra, porque meus pais fizeram questão que eu crescesse aprendendo inglês — e ao menos por isso eu era grata a eles —, mas eu não fui aceita e uma oportunidade em Madri surgiu. Claro que aproveitei, mas jamais pensei que fosse ser aprovada. Acho que ajudava um pouco que as aulas fossem em inglês e esse fosse o requisito básico.
Quando li que 20% dos alunos da Universidade de Carlos III eram estrangeiros, me acalmei um pouco e me convenci de que aprenderia rápido o idioma. Espanhol é parecido com português, eu pensei, então não vai levar muito tempo.
Acontece que mudar de país envolve uma burocracia absurda. Não tive tempo algum para estudar quando ainda estava no Brasil, porque tive que resolver tudo sozinha. Meus pais moravam em Ponte Nova, uma cidade pequena em Minas, e eu estudava em São Genésio, em São Paulo. A distância, portanto, tinha me preparado para morar sozinha. Não sabia se conseguiria caso minha primeira experiência fosse em outro país.
E aí, quando saí do avião e tirei os fones de ouvido, percebi que a verdade era mais cruel: aquilo ali realmente era outra língua. As pessoas falavam tão rápido que eu nem tinha a chance de procurar uma similaridade com o português. Fiquei com uma cara tão perdida, olhando para os lados sozinha e com as malas ao meu redor, que os funcionários do aeroporto até me ajudaram a explicar ao motorista do táxi onde ficava meu hotel, o lugar no qual eu me hospedaria até poder ficar no alojamento da faculdade.
Suspirei e decidi mandar uma mensagem para meus pais avisando que tinha chegado bem. Eles deviam estar preocupados, mesmo que eu duvidasse muito que fossem externar o sentimento. Tive que tirar tudo que estava na minha bolsa, inclusive a chave do meu quarto do hotel e os dois livros que tinha levado para ler no avião — Six of crows e Crooked kingdom, que me fizeram chorar em público e atrair a atenção de todos os passageiros em um raio de um metro. Quando consegui achar o celular, nem me incomodei em guardar a tralheira na bolsa de volta e já saí andando pela universidade enquanto digitava.
Péssima ideia. Eu mal tinha passado do "não se preocupem, tô viva e já comi alguma coisa" quando me choquei com um corpo muito mais alto que o meu. Não que fosse difícil, de qualquer forma, porque eu mal passava do um metro e meio. A única coisa que consegui segurar firme foi meu celular, e as chaves do hotel fizeram um barulho irritante no chão por alguns segundos.
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Para Onde Vão os Corações Apaixonados
RomantizmPara Onde Vão os Corações Apaixonados é uma antologia de contos de romance que reúne histórias que te farão suspirar e querer arrumar as malas, partindo em uma viagem ao redor do mundo.