Capítulo 2

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O nome da garota franzina era Onye. E logo após o pequeno grupo ficar a sós, ela se tornou uma matraca ambulante. Era inegável a sua vivacidade e esperteza. Seu talento para pular de um assunto a outro em questão de segundos deixava Kaden tonto. Num segundo, ela discorria sobre os melhores tipos de armas para alcançar um coração humano, e no outro ela já estava falando sobre mapas antigos e roubos históricos. A cabeça de Kaden estava já prestes a explodir com aquela tagarelice, apenas cinco minutos depois de a reunião ter início, mas Khia Mikail e Gerald Tove eram pacientes com ela, e por vezes pareciam achá-la até mesmo adorável.
O casal — que se juntara ao grupo, aparentemente, por causa de um instinto protetor sobre Onye — eram apenas amigos — algo que fizeram questão de deixar bem claro —, mas Kaden percebia os olhares trocados entre eles a cada pouco tempo. Para ele, parecia haver algo mais profundo ali. Se ele não soubesse, diria que eles estavam se comunicando apenas através das mentes. Mesmo assim, ele não fez comentários. Nada daquilo era da sua conta, afinal.
Sebastian ainda soltava raios pela boca a cada segundo. Chegou a acusar Kaden de tê-lo enganado. Afirmando que ele havia o provocado ao limite, apenas com a intenção de ludibriá-lo para que se juntassem a eles naquela empreitada suicida - era assim que ele começara a chamar o plano de Kaden, depois que ele se dignara a lhes explicar.
Kaden não negou, uma vez que Sebastian já não podia fazer nada quanto a isso. Todos já zombavam dele o suficiente. Se ele abandonasse a missão agora, sabia que nunca mais conquistaria o respeito de seus colegas ladrões novamente. Estaria condenado à gozação pelo resto de seus dias como fora da lei.
A verdade era que Kaden nunca tivera plano algum de integrá-lo ao grupo, mas não tivera muitas opções diante da situação. Não pudera pensar em nenhum modo de recusar seu voluntariado, sem parecer fraco — arrancar a cabeça de Sebastian não pareceu um bom presságio para iniciar sua missão. Então inventou toda aquela história o mais rapidamente que pôde. Se ele tinha mesmo que trabalhar ao lado de Sebastian, era melhor tirar o máximo proveito disso e, quem sabe, fazê-lo parecer um pateta como bônus.
Mas Kaden tinha que admitir que Sebastian tinha seus pontos fortes e talvez pudesse até mesmo ser útil para seu plano. Ele era bom com mentiras, lutava razoavelmente bem com uma espada e, na maioria do tempo, não era tão burro como aparentava.
Os quatro haviam se juntado numa única mesa após terem sido deixados a sós. O resto da taberna agora estava vazia. Já era madrugada, mas eles tinham pouco tempo, e Kaden sempre pensava melhor naquele horário mesmo.
Quando Khia finalmente conseguiu fazer com que Onye se calasse, durante dez segundos, foi a vez dele de falar.
— Como vocês já sabem — ele disse — Nosso objetivo é capturar um objeto muito especial.
— E com "capturar", ele quer dizer "roubar" — Onye comentou, prestativa.
— Obrigada por nos elucidar, querida — Kaden resmungou.
— Não tem de quê — a garota sorriu simpaticamente.
Que Deus lhe desse paciência, ou ele a atiraria pela janela, em breve. Kaden suspirou profundamente, antes de continuar.
— Nosso alvo é o Quartel da Guarda Real. — Kaden os fitou intensamente — E o objeto em questão é nada menos que a espada do Rei Dharin.
Silêncio, absoluto.
Tove deu uma risada ruidosa, mas se calou e arregalou os olhos quando percebeu que aquilo não era uma piada.
— Que Deus nos ajude — choramingou o grandalhão.
Khia engoliu em seco. Sua pele empalideceu ainda mais. Ela não sabia o que havia dado nela para se voluntariar naquela missão estúpida. Bom, ela sabia o que fora, é claro. Mas ainda se perguntava o porquê. Por quê a ideia de Onye se jogando em frente ao perigo ou — Deus a livrasse — se machucando de novo, a deixava tão apavorada?
A garotinha não era sua parente e elas nem sequer se conheciam a muito tempo, mas despertava em seu peito um instinto protetor maluco. Quando perdera a perna numa missão em que as duas participavam, Khia havia cuidado dela por dias, enquanto ela permanecia desacordada e febril. Temia que a garota se tornasse uma inválida. Nas ruas — onde não havia regras e cada um cuidava de si mesmo —, isso era o mesmo que a morte. Mas para sua surpresa, Onye tinha uma força de vontade perturbadora, e se recuperava numa velocidade alarmante.
No último mês ela já podia andar quase normalmente, e voltara às suas atividades costumeiras — roubar — cerca de duas semanas atrás.
Mesmo assim, ela não podia dizer que não ficara surpresa ao vê-la sendo aceita numa missão daquela importância, considerando a sua condição delicada e tudo mais. Seu peito havia se apertado ao vê-la cambalear até a frente da taverna, e quando menos esperava ela já tinha se voluntariado para aquela maluquice. E então Gerald — céus — havia se levantado também. E ele não podia ter feito isso, porque agora tudo em que ela podia pensar era que se tudo desse errado e eles morressem, ele estaria nessa enrascada por sua causa. Porque ela sabia, sabia que ele só havia concordado em participar da missão por causa dela.
— E como é que você pretende fazer isso? — Tove parecia tão desconfortável quanto ela — Não sei se você se lembra, mas o Quartel é o lugar onde estão os soldados... e as armas — comentou ironicamente.
Apesar do tom condescendente, a pergunta de Tove era mais do que pertinente. A Guarda Real era nada menos que os soldados mais bem treinados de todo o reino. Numa luta direta, um deles podia acabar com todos eles juntos. Com as mãos amarradas.
Eles eram os responsáveis pela segurança de toda a capital, inclusive do palácio. O General Hashim era quem os comandava. Ele e Kaden tinham um histórico conturbado — ladrão versus homem da lei. As coisas eram complicadas. O General tentava capturá-lo há sete anos. Para sua sorte, sem sucesso. Ele era bom no que fazia, e tinha muito orgulho disso.
Seu único problema era que se habituara a agir sozinho. Agora tinha mais quatro pessoas para coordenar, e nada podia sair errado.
Qualquer imprevisto poderia significar a morte de todos eles.
Foi com isso em mente, que o grupo começou a fazer planos.
Eles tinham que ser rápidos e ágeis. Em quatro dias - fora esse o prazo de Kassan para que o roubo acontecesse, e sua única condição - eles teriam que efetuar o maior roubo já posto em prática pela guilda.
Os cinco ladrões iriam roubar a espada de Dharin, o antigo rei de Auderam. A arma tinha valor incalculável, e era guardada no Quartel, pelo próprio General, que era cunhado do rei Dharin e comandava a Guarda durante seu governo.
Kaden imaginou se Deus o puniria por roubar dos mortos. Bom, ele duvidava que o rei Dharin fosse precisar da espada mesmo.
Com um sorriso taciturno, ele começou a explicar:
- Faremos assim...

O Príncipe Dos Ladrões - Mirelly AlvesOnde histórias criam vida. Descubra agora