Capítulo 7

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Kaden estava um passo de sair ao pátio, quando ouviu o temível aviso:
— O General está se aproximando dos portões!
Ele estacou no lugar e, por um segundo, deixou que o pânico dominasse sua mente. Tudo que conseguia pensar era "estamos mortos, estamos mortos, estamos mortos". No segundo seguinte, ele percebeu que não podia se deixar levar pelo terror. Porque eles ainda não estavam mortos, e isso era uma coisa boa. Enquanto eles estivessem vivos ao menos havia uma chance. Desistir por medo de tentar era o mesmo que se render, e Kaden não se rendia nunca.
Sem entrar em pânico, tentou ser racional. Ele tinha que assumir o pior: o General sabia sobre o roubo da espada. E isso não era apenas um palpite, ou uma questão de pessimismo. Ele tinha todas as razões para acreditar que o General não voltaria tão cedo assim para o Quartel. Segundo as informações que recebera — todas de confiança, e checadas por ele em pessoa — Hashim permaneceria em reunião por toda a manhã e tarde. Reuniões importantes, que ele não adiaria, a menos que tivesse um forte motivo para retornar ao Quartel. A menos que desconfiasse de algo. Algo grande, como o roubo de uma espada inestimável. Ele não queria pensar em como o General ficara a par do roubo. Não agora.
O nome Sebastian piscou em sua mente, mas ele o afastou dali com irritação. Sebastian era um cretino, um babaca de marca maior, mas até ele mantinha certos valores morais. A honra era um deles. Ele não os trairia. Ao menos foi isso que ele disse a si mesmo.
O que ele precisava era focar sua mente na questão mais importante agora: pôr sua mente em ordem novamente, e analisar a nova situação em que se encontrava. Onye já devia estar longe dali a essa altura, seguindo rumo a taberna, encolhida dentro de uma caixa de madeira qualquer, na carroça do leiteiro — pelo menos, era isso que ele esperava. Khia e Tove deveriam estar esperando-o junto aos portões, conforme o planejado. Sebastian era uma variável — e isso nada tinha a ver com o fato de ele ser um traidor em potencial. O fato, é que Kaden não sabia como as coisas ocorreram. Ele havia escapado, como o combinado ou também ficara preso do lado de dentro dos portões, ante a chegada do General? Se quisesse que o plano funcionasse, precisava ter certeza de cada variante possível. E Sebastian agora era uma variante.
Ele resolveria essa questão em breve. Por enquanto, tinha que garantir que uma parte essencial do novo plano fosse colocada em ação. Com isso em mente, ele saiu ao pátio e, sacando a adaga da bota, começou a esfaquear pessoas. Por sorte, ele gostava muito daquilo.
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Khia estava relativamente calma. Considerando sua morte iminente e tudo mais. Apesar de saber que deveria estar — no mínimo — perdendo a cabeça, tudo que conseguia sentir era... nada. Ela não conseguia sentir nada. Mal sabia se conseguia pensar, ao menos não racionalmente. Estava anestesiada.
Tove a deixara sozinha ao lado do portão leste fazia quase dez minutos, e partira rumo ao caos, numa tentativa suicida de encontrar Sebastian. O garoto ainda não passara pelo portão, então eles deduziam que devia estar em algum lugar no meio da confusão. E Tove — o tolo e altruísta Tove — não deixava companheiros para trás. Talvez fosse isso que os matasse, no final. Talvez eles já estejam mortos, ela pensou indolente. Mas não acreditava realmente nisso. Tinha certeza de que se eles estivessem mortos, ela teria ouvido algo do tipo "morte aos ladrões!", ou algum som agonizante, como sufocamento por sangue, uma garganta sendo cortada brutalmente — a garganta de Tove ou Sebastian.
Ironicamente, minutos mais tarde, foi isso que aconteceu. Ou quase isso, pelo menos. Fora a parte do grito de "morte aos ladrões".
Ela ouviu primeiro os berros agonizantes, e logo após veio a exclamação sufocada — não por sangue, mas dor. Por sorte — ou não —, nenhuma garganta sendo rompida ainda, nem de seus amigos ou de qualquer outra pessoa.
— Ataque! — foi o que o soldado ensanguentado que irrompia pelo pátio gritava. Ele gemia e segurava o ombro direito, de onde jorrava em abundância um líquido carmesim e viscoso — sangue. O soldado parecia esbranquiçado e prestes a desmaiar. Khia imaginava que um soldado devia ser mais bem preparado para lidar com sangue e ferimentos.
Atrás dele vinham outros, todos feridos, com golpes diversos — no abdômen, na panturrilha, e até na clavícula. De repente, o caos pareceu dez vezes pior. O fedor pungente de gás não ajudava em nada na situação atual. Khia notava agora quão idiota havia sido aquele plano. Eram tantas variáveis, tantas coisas que poderiam dar errado. E todas elas pareciam estar se concretizando agora.
Tove — que chegava ofegante ao seu lado, quase arrastando um Sebastian manco e em estado catatônico — foi quem finalmente a arrancou de sua nuvem de torpor.
— O que aconteceu? — Khia questionou agitada.
— Não vamos conseguir sair — Gerald Tove deu voz ao pensamento que imperava na mente dos outros dois, sussurrando para que ninguém além deles pudessem ouvi-lo — Eles interditaram a saída.
E era verdade. Os portões estavam agora fechados. Soldados portando espadas longas e afiadas se postavam dos dois lados deles, impedindo qualquer um que ousasse se aproximar. Os olhos deles perscrutavam acusadores a movimentação desenfreada de cadetes. Os novatos ainda não haviam aprendido a arte da impassibilidade, podia-se notar. Eles estavam desesperados, correndo de um lado para o outro como baratas tontas. Enquanto isso, os soldados mais velhos e os oficiais superiores começavam a se reunir, pouco a pouco, em pequenos grupos, todos atentos e em formação.
— O que raios aconteceu com a sua perna, Sebastian? — Khia guinchou. Agora a calça do garoto começava a empapar com sangue. O ferimento parecia ser sério.
— Para ser sincero, não tenho certeza se sei como te explicar o que aconteceu. — Sebastian resmungou, extremamente irritado.
— Como assim? — Khia perguntou alarmada.
— Tudo que você precisa saber, é que Kaden tem um plano. — Tove confidenciou, inquieto.
— E você está tranquilo com isso? — a loura questionou com escárnio — Que eu saiba, foi um dos planos dele que nos colocou nessa situação, para começo de conversa.
— Nós temos escolha?
— Vocês ao menos sabem que plano é esse? — perguntou contrariada.
— Não exatamente — Tove se encolheu ao confessar.
— Droga, por que eu é quem tinha que ser esfaqueado? — Sebastian ignorava a conversa dos outros dois, ligeiramente pálido — Eu não gosto de sangue. Ou de sentir dor, para ser sincero.
O rangido dos portões interrompeu o diálogo dos ladrões. Os três notaram alarmados que eles de repente se abriam. Todos podiam prever quem irromperia deles a qualquer momento e o que isso significava.
O General Hashim, naturalmente, foi o primeiro a surgir dos portões. Ele montava um cavalo negro como a noite. Seus cabelos, da mesma cor — maculados apenas por algumas raras mexas prateadas —, tremulavam quando ele irrompeu como um raio pelo pátio. Seu semblante era feroz e raivoso, e se acentuou ainda mais quando seus olhos pousaram no caos que transcorria à sua frente. Khia podia jurar que pequenos raios saiam de seus olhos azuis turquesa. Lindos olhos, por sinal.
— Que merda é essa? — o berro grave e repleto de cólera de Hashim imobilizou todos os soldados imediatamente. A atenção de todos ali agora estava sobre o General. Reações de alívio, vergonha e medo se revezavam entre os soldados. Um dos homens feridos gemeu de dor, o que não passou despercebido pelo General.
— Estamos fodidos. — Khia choramingou baixinho.
— Você nem imagina o quanto. — Tove suspirou em resposta.

O Príncipe Dos Ladrões - Mirelly AlvesOnde histórias criam vida. Descubra agora