Influenza

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2012.

Uma das poucas colegas que, eventualmente, fazia o turno da noite além dos novatos supervisionados por Laura, Carla, contava as semanas, dias e horas para suas férias. Diferente de Laura, que detestava as férias que quando ia a Ubatuba visitar os pais preferia ficar em um hotel, Carla fazia grandes planos para seus trinta dias longe do trabalho.

– Nós vamos para Ibiza. – Carla, sentada no banco e com os olhos no microscópio, disse empolgada – Vamos passar uma semana lá e depois, vamos para a Côte D'Azur.

Laura, também em frente a um microscópio e fazendo anotações sobre a lâmina que analisava, olhou rapidamente para a colega e voltou a anotar.

– Vocês estiveram na França e na Espanha ano passado.

– Fomos, sim. Mas fomos a Paris, Toulouse, Barcelona e Madri. Agora queremos praia, sol e curtição! Você conhece a Europa, Laura?

– Não.

– Pois, deveria! A Agência de Turismo onde sempre compramos as passagens têm pacotes de viagem tão baratinhos... Você já ouviu falar de "Um ônibus brasileiro na Europa"? São grupos de viajantes que...

– Já ouvi falar, sim e não gosto da ideia de ficar 20 dias dentro de um ônibus vendo a vida passar pela janela. Aliás, não gosto de sair da minha rotina. Graças a Deus, consegui vender as minhas férias e este ano eu vou ficar bem aqui, fazendo o meu trabalho. – Laura levantou-se do banco e pegou as suas anotações – Mas, cada um é cada um: você tem motivos para curtir as suas férias e eu tenho os meus motivos para vender as minhas férias.

Carla se calou, terminou de ler a lâmina e fez suas anotações antes de voltar a tona:

– Por que tanta vergonha por ter insônia, Laura? Você deveria fazer um tratamento para se curar disso. Não faz nada bem!

– Eu já estou acostumada a viver assim. Meu cérebro funciona melhor a noite do que de dia e eu me sinto muito bem trabalhando, ajudando a desvendar mais rapidamente a patologia que atinge pacientes em um horário em que ninguém que tenha mais de dois anos de diploma queira trabalhar. Todo mundo quer trabalhar em expediente comercial, dormir a noite, ter final de semana para passear... Mas não eu.

Carla ergueu as sobrancelhas e sentou-se em frente a um monitor de PC para digitar os resultados da lâmina. Um estagiário sonolento e preguiçoso passou no corredor entre as duas mesas.

– Oooopa... – Ele tirou uma mão do bolso do jaleco e esticou polegar, indicador e dedo médio.

– Oooopa... – Laura e Carla responderam.

– Já preparei as amostras de fezes e coloquei os tubos de urina na centrífuga para bater.

– Certo. – Laura respondeu – Poderia separar os exames impressos por andar, médico e por ordem alfabética, por favor?

O estagiário bocejou e, arrastando os pés, foi ao armário atrás de Laura pegar a pilha de exames.

– Tem que colocar dentro de envelope? – Ele perguntou.

– Porta da esquerda, prateleira de cima, caixa encostada na parede do armário. – Laura indicou, ao mesmo tempo em que deu o comando para imprimir. – Os pacientes recebem sua cópia do exame impressa enquanto os médicos as recebem online.

– Aaaahhh, tá... – O estagiário assentiu boquiaberto.

Carla mandou para a impressora os seus laudos e saiu da sala quando ouviu a centrífuga terminar de bater.

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