Bernardino

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Rosa estava grávida do terceiro filho e trabalhava como ascensorista em um prédio do centro de São Paulo. Seu marido Bernardino era motorista de ônibus e os dois criavam os filhos mais velhos com a ajuda da mãe de Bernardino, Maria da Luz. Ao final de cada expediente, os dois se encontravam às 18 horas nas catracas da estação Sé para pegarem o metrô e seguirem para a estação Vila Matilde, onde pegavam outro ônibus para casa.

Foi no final de um dos expedientes que Rosa não apareceu e Bernardino resolveu ir ao prédio verificar o atraso da esposa. Um dos seguranças do prédio pediu que ele fosse até a sala do Recursos Humanos para falar com o chefe e o instruiu à subir os quatro lances de escada, o que ele fez e, ao chegar na sala, o chefe lhe entregou um papel.

– Ó, a Rosa foi pra este hospital, viu?

– O que aconteceu?

– Ah, sei lá, só sei que ela foi desastrada, quebrou o mecanismo e ela despencou junto com o elevador!

Chocado com o aviso a queima-roupa, Bernardino saiu do prédio e pegou um táxi, dando o endereço do hospital Pérola Byington para onde Rosa fora levada.

– Eu sinto muito, mas ela perdeu a criança. – A Médica, com todo o cuidado disse. Bernardino colocou a cabeça entre as mãos.

– A Rosa sabe disso? – Ele perguntou soluçando.

– Acredito que ela não saiba. Ela está em coma, sofreu inúmeras fraturas...

Naquela noite de 22 de dezembro, não apenas um enterro teve que ser planejado, mas dois. Bernardino estava sem a pessoa que mais amava no mundo e sem o sonho de ver mais um filho sendo bem criado como ele e Rosa criavam Patricia e Fabio.

A culpa do acidente não era de Rosa, mas da falta de manutenção do elevador, disse a Polícia e, depois, o Advogado que o perseguiu por semanas após tomar conhecimento do caso através de um amigo do primo do vizinho dos Morales.

Esse Advogado, Valdir, tanto fez que conseguiu vencer a causa e, quando venceu, dez anos depois, Patricia estava no 1o ano de faculdade de Medicina – "minha neta estuda na USP!", dona Maria da Luz anunciava orgulhosa e aos quatro ventos – e Fabio, na 8a série. Bernardino estava fazendo tratamento contra o câncer de pulmão.

A indenização pela morte de Rosa chegou um mês após a morte de Bernardino, também em 22 de dezembro de 1995 e os filhos herdaram o suficiente para a compra de uma casa modesta na Vila Matilde, mobiliarem e guardarem um resto que o pai de uma colega de Patricia, um financista do Banco Gaetani, tratou de fazer multiplicar a pedido da filha.

2016.

Fabio e Laura decidiram abrir o próprio pequeno laboratório de Análises Clínicas um mês após o nascimento de Rosa Célia Morales, em Maio de 2014. O laboratório era nas proximidades da casa que Patricia comprara para sua avó e o irmão morarem e, que naquele momento, estava alugada – os irmãos, de comum acordo, guardavam os aluguéis e, de tempos em tempos, eles adquiriam outro imóvel destinado a locação e assim, formavam patrimônio para deixarem de herança para Paola, Enzo e Rosina (como o tio babão Dario apelidou a sobrinha e o apelido pegou na família).

Laura não frequentava mais as sessões de terapia do Dr. Harding; ela mesma se dera alta depois do nascimento de Rosa. Sua vida era perfeita: tinha restabelecido a amizade com sua família, tinha uma filha maravilhosa, um marido lindo, maravilhoso, apaixonado e com quem se dava incrivelmente bem; amizade com os cunhados, com a avó de Fabio. Ela se dava o direito de viajar com o marido e a filha além de dormir a noite inteira, sempre agarradinha a Fabio. Para quê, então, continuar a remexer o passado?

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⏰ Última atualização: Oct 06, 2021 ⏰

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