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Semanas depois

Leandro

Já tem um mês e uns dias que eu tô aqui, tô acostumado com essa porra não.

Desde aquele dia ninguém fez mais nada comigo,  nego me olha torto, cochicha, mas não faz nada e eu fico na minha.

Tô afim de me envolver com nada disso, começando a encarnar o bom comportamento desde já, quero sair dessa porra logo.

Fico igual um leão enjaulado nesse caralho, único momento "legal" é quando eu tomo um banho de sol, vejo o dia mais amplo.

Se tu ficar o tempo todo na cela só sentindo cheiro de suor de macho junto tu enlouquece, respirar outro ar pra mim agora é luxo.

Fiquei um tempo sem visita por ser "novo" aqui, tava dependendo da bondade dos parceiros que tem visita, uma hora ou outra ganhava um prato de comida, um copo de guaraná.

Sinto falta da comida da minha mãe, chego a aguar só de lembrar o cheiro, papo reto.

Sinto falta de geral, das loucuras da Karen, dos concelhos de dona Sara, dos meus rolês a pé, que eu reclamava tanto, mas queria ter de volta.

A gente só valoriza a liberdade quando fica privado dela, coisa que eu mais aprendi aqui dentro foi isso.

Valorizar cada momento lá fora, ver beleza nos mínimos detalhes, porque aqui dentro tudo o que tu vai ver é grade, cerca elétrica, coisas que te lembram o motivo de tá preso.

Hoje é dia de visita, os irmãos tudo animado, tomando banho, "fazendo a barba", tudo pra ver as cunhadas e as famílias.

Acho maneiro pô, tomei banho só pra dar um rolê no pátio mesmo, respirar um pouco e pra ver se essa saudade que eu tô de lá de fora acalma, tô a ponto de ficar maluco.

Guarda - Quem é Leandro Baptista aqui ? _ encostou na grade.

Leandro - Eu mermo!

Guarda - Visita pra tu! _ abriu a cela.

Nem consegui firmar postura, dei maior sorrisão mesmo e acompanhei ele, vim andando até no pátio bem mais leve.

Karen e Uiara que vieram, Airinha tava até tremendo, mas a Keka tava tranquilona, essa aí não se abala por nada.

Leandro - E aí ? _ cheguei perto delas.

Karen quase me derrubou, abracei ela de volta, que chorou no meu ombro.

Leandro - Tu não é braba pô ? Tá chorando por causa de quê ? _ desconversei.

Karen - Senti tua falta seu viado, quando cheguei na delegacia tu já tinha descido pra cá! _ falou e eu ri amargo.

Gosto nem de lembrar que bati na delegacia antes de vir pra cá, sofri muita covardia lá, os cara me amassaram e eu segurei minha pica quietinho.

Abracei a Uiara também, saudades dessas duas. A gente já vem de muito tempo pô, sou da família, quase irmão.

Uiara - Ó! _ limpou as lágrimas _  Tua mãe mandou a tua comida preferida, sobremesa tu sabe né !?

Leandro - Pudim! _ esfreguei as mãos animado.

Bagulho simples, carne assada com batata corada, arroz, feijão e maionese, mas eu comi feito um bicho.

Bati três pratos sem miséria, tava cheio de saudade da comida da minha mãe cara.

Leandro - Como que tá lá fora ?

Uiara - Tá tranquilo, mas sem tu não é mesma coisa!

Karen - Dodô tá de coleira, falo mesmo! _ bateu palmas e eu fiz sinal pra ela se conter.

Leandro - E quem é a dona da coleira ?

Karen - Tá de frente pra tu pô....

Leandro - Caralho! _ falei surpreso _ E ele ? Passou pelo mesmo que eu passei ?

Uiara - Nada pô, minha mãe ficou tranquilona, achei que ela fosse se descabelar, mas só ficou de cara fechada! _ falou e eu ri _ Falando nisso, ele te mandou um abraço, disse que vai fazer de tudo pra breve em breve tu tá lá fora com a gente!

Leandro - Fala pro velho que o abraço foi recebido! _ ela riu _ E meus coroas ?

Karen - Vou mentir não Léo, teus pais tão arrasados, a gente só conseguiu te ver hoje porque 'tamo' no nome de outras cunhadas. Tua mãe e teu pai conseguiram fazer já, tão só esperando sair! _ falou e eu assenti.

Lágrima brotou no canto do olho e eu fiz questão de secar, queria isso pra eles não, só queria poder abraçar meus pais.

Uiara - Mas a Esther tá bem, trouxe umas fotos dela pra tu, menino ? Paguei um ensaio pra ela e a bichinha se achou a modelo! _ falou enquanto eu via as fotos.

Teté tá a coisa mais linda, cresceu bem essa coisinha e não tem muito tempo desde que a gente se viu pela última vez.

Ri muito, me distraí a beça, qualquer lugar com essas duas cresce no patamar.

Karen - Tu não tá sozinho não, escutou ? A gente vem te ver sempre que puder, tá ? _ falou quando ouviu o último sinal.

Leandro - Valeu pô, valeu pela força! _ abracei as duas.

Maior vontade de ir junto tá ligado ? Mas pelo menos já não tô tão sozinho, tô com a palavra do Senhor e com as fotos da minha filha, saudade dessa pestinha!

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23/08/2021

Ruínas - FinalizadoOnde histórias criam vida. Descubra agora