Capítulo 3

482 78 53
                                    

Depois da escola fui direto pra casa, meu tio já tinha almoçado e voltado trabalhar, comi, tomei um remédio que me deram e fui deitar, acabei dormindo e não limpei a casa como de costume, quando meu tio voltou no final do dia foi perguntar se eu estava me sentindo mal, ele notou que tinha algo errado acontecendo, falei que tinha ficado " mocinha " e que estava com dor, ele ficou sem jeito pensando em como me ajudar, mais contei que eu já sabia oque fazer, que tinham me dado toda a assistência na escola.

Ele se ofereceu pra ir na farmácia comigo, pedi pra ir sozinha no dia seguinte, como eu já tinha ganhado absorventes e remédio, fui procurar outra coisa pra comprar, algo que meu tio não fosse notar, fui na farmácia e não achei nada interessante, quase peguei um batom em formato de morango que todo mundo tinha na escola, mais achei caro, comprei doces e guardei o troco, quase fiquei esperando o Neto chegar da escola mais achei melhor evitar ver ele.

Porque ele ia querer nadar brincar e eu não queria fazer nada daquilo, pensei que seria muito estranho contar pra ele oque tinha acontecido, faltei da escola por dias, tive vergonha mesmo do que aconteceu, meu tio ficou com dó e nem fez questão de eu ir, na verdade ele nunca fez questão eu que gostava de ir.

O Neto foi me chamar para brincar, ele tinha ganhado um patins novo, mais tinha que ir pra longe andar porque onde a gente morava, era estrada de terra, fui com ele mais eu não quis andar, ele se irritou comigo disse que eu estava estranha muito chata, que devia estar com ciúmes e inveja dos novos amigos dele, porque toda vez que estavam lá eu não queria ir ficar junto, falei que então era pra ele ir andar de patins com os novos amigos e fui embora.

Ele ficou todo bravo reclamando criticando mais não foi atrás, ficamos dias sem ir brincar, ele até foi me chamar duas vezes mais ignorei, falei que não podia sair, ele entrou de férias e foi viajar pra casa da avó, nem nos despedimos.

Como eu queria dinheiro para comprar mais calças, perguntei ao meu tio se eu podia ajudar na reciclagem, também falei que eu não tinha com quem brincar nas férias, ele deixou e comecei " trabalhar " na separação, com uns 13 anos, era tudo muito sujo, porque as pessoas nunca separavam de fato lixo orgânico do reciclável, na primeira semana foi até legal eu fui caçando coisas do meu interesse, bijuterias, revistas de fofocas, eu recortava as fotos dos bonitões, dos cantores e colava no meu quarto, na segunda semana senti mais o cansaço e o tédio, mais logo recebi pelos 15 dias trabalhados e fiquei super feliz, era só um dinheirinho simbólico o Célio fez todo o procedimento de me chamar pra receber como chamou os outros, ele me tratava muito bem e disse estar orgulhoso de mim, na época pareceu muito dinheiro, eu nem sabia oque comprar primeiro.

Não tinha noção de qual loja poderia ir, nem do real valor do dinheiro, meu tio perguntou oque eu pretendia fazer com tanto dinheiro ( foi irônico ) mais na época nem notei, toda animada contei que queria roupas, ele falou que era pra eu chamar a moça que trabalhava com ele, pra me levar em uma loja, no dia seguinte fomos bem cedo, ela me levou a uma loja que tinha peças mais baratas com defeitos, comprei um top com bojo, uma calça jeans e uma camiseta camuflada com as cores do exército, achei o máximo aquela sensação de vestir algo que se encaixava perfeitamente em meu corpo.

Eu também estava de férias e não tinha onde usar a roupa nova, a ansiedade era tanta que me ofereci pra ir na igreja com a moça que trabalhava lá, foi bem legal, me senti mais normal que o comum, ninguém ficou reparando em mim, depois da igreja ela e o marido me levaram comer lanche, eu pude escolher qualquer um, mais nem sabia fazer isso, só tinha comido na rua uma vez quando fiquei doente e meu tio comprou indo embora do hospital.

Me animei para trabalhar, me esforcei bastante comecei levar a sério, o Célio voltou de viagem sem o Neto, me contou que ele ia ficar fora até o final do ano, fiquei triste porque ele era meu único amigo, o Célio me entregou uma cartinha do Neto, ele estava falando que logo ia voltar e que sempre seríamos os melhores amigos, mesmo longe, desenhou nós dois, eu não tinha o costume de chorar por nada, nunca.

Mais naquele dia eu chorei, porque tive certeza de que ele não ia voltar e se voltasse ia ser " outra " pessoa, na casa da avó dele a vida era boa, eles tinham boas condições e ele com certeza teria amigos iguais a ele, mais interessantes que eu.

As vezes o Célio me mandava recados do Neto, até me ofereceu o celular dele pra gente conversar por ligação, mais eu não quis, eu tinha vergonha de pegar as coisas dos outros e nem sabia mexer naquele celular, também fiquei pensando que seria muito ruim saber de como a vida dele estava ótima longe de mim, com amigos novos.

Continuei trabalhando meio período e as vezes minhas unhas ficavam sujas, eu sempre sentei na última mesa no fundo da sala porque não gostava de ser notada, só tinham meninos perto e por causa do Neto ninguém nunca mexia comigo, ele sempre ameaçava chamar o pai dele se alguém incomodasse a gente, mais como ele sumiu por meses por ter se mudado, começaram fazer piadinhas comuns, sobre meu cabelo que estava crescendo, minha letra que era feia, minhas notas que eram péssimas, um dia eu estava realmente prestando atenção na aula e jogaram uma bolinha de papel em mim, eu só olhei brava e voltei prestar atenção, logo a aula acabou, fui para o intervalo comer, quando voltamos a sala tinha um desenho que parecia ser eu, colado na lousa, com unhas enormes pretas e cabelo arrepiado feio bagunçado, ignorei e voltei sentar.

Quando a Tassiane entrou tirou a folha da lousa e falou pra todo mundo ouvir que aquele parecia o desenho de uma criança de 5 anos, fiquei quieta no meu canto, depois quando estava arrumando o material pra ir embora, vi que tinham colocado várias bolinhas de papel na minha mochila, deu pra ver que era um desenho, abri pra ver melhor, era um desenho muito bonito de mim, abri outra, também era só que diferente, eu sentada na sala, lá fora encostada na árvore que eu sempre ficava, amassei tudo e joguei no lixo, no dia seguinte fui pra escola de coque no cabelo e limpei as unhas até machucar meus dedos.

Não se esqueçam de votar e curtir ✅😽

Paraíso Sombrio ( CONCLUÍDO )Onde histórias criam vida. Descubra agora