Dez.

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Bernardo.

Sophia suspira, claramente frustrada, agacha no chão e levanta o tapete, puxando uma pequena chave pintada de dourado. Coisa de Hanna. Ela se levanta e abre a porta, permitindo que eu avance apartamento à dentro.
Hanna, que estava no sofá, salta para fora do mesmo.

— Deus! Vocês sabem o que é privacidade?

Não consigo retrucar sua grosseria, pois estou preocupado demais com seu estado. Estava descabelada, suas olheiras eram enormes, sem falar dos olhos inchados e do pijama amarrotado que deveria estar em uso por todos esses dias.
Havia garrafas de bebida em cima da mesa, pratos sujos, uma caixa de pizza no chão ao lado do sofá. O apartamento estava uma verdadeira bagunça.

— Vocês vão falar alguma coisa ou vão ficar ai parados? - ela resmungou.

Sophia se abaixou até Caio e lhe sussurrou algo no ouvido, fazendo com que o mesmo corresse em direção aos fundos. Creio eu que deve ter ido para seu antigo quarto.

:— O que é isso tudo?

— Sério? Veio dar uma de pai para cima de mim?

Respiro fundo, massageando minhas têmporas. Caminho até ela, lhe deixando claramente tensa. Seja lá o que estivesse pensando que eu fosse fazer, me inclino e a envolvo em meus braços, como nos velhos tempos, como quando ela caía e ralava os joelhos e as mãos.

:— Por favor nunca mais faça isso. Eu passei o dia inteiro pensando coisas horríveis!

Hanna apenas assentiu, foi então que notei que estava chorando. Suas lágrimas molhavam depressa minha camiseta cinza. Sophia se aproximou aos poucos e a abraçou também, falando algumas coisas em seu ouvido que não pude entender.
Após alguns minutos, nos sentamos no sofá enquanto Hanna começou a arrumar toda aquela bagunça, completamente eufórica. Talvez o nervosismo estivesse vindo à tona.

— Quer contar o que aconteceu?

Hanna estava lavando os pratos, parou por um instante e fechou os olhos, até os abrir novamente e um suspiro derrotado cortar seus lábios.

— Rodrigo aconteceu. Eu estava apaixonada por ele e ele dizia que também estava apaixonado por mim, disse que ia se divorciar da sua mulher, mas no final só estava me usando para sexo. Eu não conseguia pisar naquele hospital e olhar na cara dele sem sentir vontade de acabar com a cara dele. Eu amava ele.

Cerro os punhos, sem que ninguém perceba. Era como se meu sangue fervesse apenas em pensar em tudo o que Hanna estava passando. Hanna sempre foi durona, nunca quis se entregar a nenhum cara dessa forma, pelo contrário, durante algum tempo nossos pais chegaram a pensar que ela tinha medo de admitir que sentia coisas por mulheres e não homens, pois era raro a ver ao lado de um. Entretanto, mesmo depois de esclarecemos que não tínhamos preconceito, ela deixou claro que estava apenas muito ocupada com seu trabalho para gostar de alguém.
Imagino que a dor de ter um amor não correspondido não chegue aos pés da dor que sentia por estar separado de Sophia, mas tinha noção da intensidade. Queria agarrar o pescoço desse tal Rodrigo e bater em qualquer parede até o mesmo esquecer seu nome.

—...e um rapaz chamado Gabriel perguntou de você. Não foi, Bernardo?

:— Sim, foi. Ele parece um cara legal.

Sem noção do tempo que havia ficado fora do ar, Hanna estava sentada ao lado de Sophia agora, sem chorar. Não fazia ideia do que Sophia tinha dito à ela, mas desejei que pudesse voltar no tempo para ver o que tinha feito. Apenas sorrio, vendo as duas conversarem com mansidão.

Uma vez que ajudo a limpar a sala enquanto as duas conversam, penso que Hanna tirou férias apenas uma vez desde que começou a trabalhar. Ela estava tão focada com o trabalho e tão apaixonada por suas crianças que não queria deixar de vê-las e cuidar das mesmas. Ela daria uma ótima mãe. Sophia também já havia me contado que Caio nunca havia estado longe dela e como ele estudava em casa e Derek estava sempre trabalhando, imagino que não deveria sair de casa e desde a sua chegada tem se dedicado ao seu trabalho no restaurante e agora com suas crianças no Colégio interno, que aliás, eram apaixonadas por ela. Era como unir o útil ao agradável.

:— Tenho uma ideia.

Hanna e Sophia me encaram, cessando aos poucos a conversa entre as duas enquanto me sento novamente no sofá.

:— Que tal passarmos um fim de semana em Paris? Hanna poderia até ficar por mais tempo caso quisesse.

— Paris? — Sophia indagou.

— É um lugar que sempre quis visitar, Sophia, mas como estava fissurada em meu trabalho, nunca tirei um tempo para isso. Eu acho uma ótima ideia, preciso gastar meu salário com algo que não seja esse apartamento.

Damos risada.
O apartamento de Hanna não era o mais luxuoso, mas era confortável e estava tão apegada à ele que preferia gastar dinheiro o consertando do que se mudando.

— Bom, podemos ir, sendo assim. Vai ser bom respirar um pouco antes do jantar com meus pais.

:— Eu que o diga. — brinco.

Sophia ri baixinho e acaricia meu ombro, se levantando para ir até onde Caio estava, imagino eu. Aproveito o meio tempo para me jogar ao lado de Hanna e lhe dar mais um abraço, antes de dizer qualquer coisa, confiro se estamos sozinhos naquela pequena sala.

:— Quero pedir Sophia em casamento, acha que é muito cedo?

Hanna, ainda abraçada a mim, sorri.

— Acho que vocês já ficaram tempo dê mais separados para hesitar, maninho.

Sorrio.

— Suponho que vai pedir minha ajuda. — ela prossegue, quando abro a boca.

:— Nada disso, deixe comigo, você está indo para se divertir. Posso cuidar de tudo quando Sophia estiver na no Colégio interno.

— Ótima ideia. Vou começar a ver casas próxima à Torre Eiffel, tudo bem por você?

Faço que sim.
Sinto um embrulho no estômago quando precisamos ir embora, não queria ter de deixar Hanna sozinha, mesmo que faltasse apenas três dias até a nossa repentina viagem.
Agarro a maçaneta da porta, mas não a giro, ao invés disso, viro novamente para Hanna.

:— Por que não dorme lá em casa? Podemos ver as casas juntos e você pode me ajudar com o restaurante.

Hesitante, Hanna levanta do sofá e Caio comemora, assistindo à tudo aquilo em silêncio, enquanto nos deixava pensar que estava jogando vídeo game.

— Vamos esperar no carro? — Sophia sugere.

— Claro, claro. Não demoro.

***

Quando tive certeza de que Sophia estava tão adormecida quando Caio, apanhei meu notebook e o levei para sala, onde Hanna estava enrolada em um cobertor, falando ao telefone com alguém. Sinto-me contrariado, imaginando ser Rodrigo.

:— Tudo bem no hospital?

Hanna assente.

— Sophia mencionou tanto Gabriel que decidi ligar para ele e dizer que estava tudo bem, ele sempre foi minha dupla nas cirurgias então deve ter ficado bem confuso. — ela sentou ao meu lado. — Comentei que ia ficar em Paris por alguns dias e ele me indicou um hotel com vista para a Torre Effeil, onde ele já ficou hospedado.

:— Bom, então vamos ver se ele tem bom gosto.

Teorema da Paixão [REVISADO]Onde histórias criam vida. Descubra agora