Esperei a morte. Em toda minha vida imaginei como seria morrer, para onde iria, se seria tão solitário quanto era em casa, e por onde andava, se encontraria Sônia. Cheguei a fazer uma divisão, como que fossem espécies de ruas, Sônia ficaria na rua mais importante, ela lideraria pessoas justas responsáveis, eu ficaria a sua sombra talvez, morando com ela por gentileza dela, sendo feliz com sua felicidade. Certa vez, pensei que a morte poderia até ser amigável e que eu poderia negociar com ela, quando ir e quando… voltar, ok eu tinha 6 anos quando pensei nisso. Uma menina de 6 anos já pensava na morte, principalmente por não conhecer o amor de uma família, apesar de ter uma tia adorável, não era o suficiente. Senti como se meus ouvidos fossem estourar logo depois de um som ensurdecedor, uma explosão, caí no chão e mesmo com todo o esforço que fiz, meus olhos não obedeceram e me perguntei se aquela seria a última vez que teria oportunidade de abri-los. Era fofo, macio e… era meu colchão, quando consegui abrir os olhos e olhar para os lados percebi que, era meu quarto, e Sônia estava sentada em uma cadeira olhando pela janela aberta.
– Sônia…
Eu disse baixinho, com medo de que aquilo fosse um sonho e quebrasse minha ilusão com o simples som da minha voz. Ela andou até minha cama e segurou minhas mãos, me assustei ao ver que minhas mãos estavam sem luvas, as puxei para o corpo, mas então percebi que nada, o pano e nem a cama, nada, nada virou pedra, mesmo que eu estivesse usando uma camiseta sem manga e estivesse sem luvas.
– Desculpe… você está bem? Thomas me telefonou, disse que você estava desmaiada e com febre, ele saiu para comprar mais remédios.
– Não estou entendendo…
Eu disse em confusão, como podia ser, eu não podia estar sonhando a tanto tempo, podia?! Estiquei a mão para alcançar o rosto da minha amiga, incapaz de tocá-la sem imaginar vê-la virar estátua de pedra. Ela mesma tocou minha mão e a levou ao próprio rosto, em seguida beijou minha bochecha e me abraçou. Comecei a rir e a chorar, ela fez o mesmo. Por minutos ficamos assim, podia enfim sentir os cabelos sedosos dela, sua pele quente e convidativa. Minha melhor amiga, minha irmã. Toc toc toc.
– Desculpe atrapalhar, aqui estão.
Thomas estendeu a sacola, com um sorriso reconfortante ela saiu recebendo a sacola, e fechando a porta.
– Você está bem?
Ele perguntou, estendi os braços para ele. Um abraço do meu amor, era o que precisava para enfim acreditar em tudo que estava acontecendo.
– Tom…
Comecei.
– Ele voltou para casa, está razoavelmente feliz, apesar de ter me mandado te dizer que se caso enjoasse de mim, ele estaria disposto a tê-la para ele.
Eu ri e o apertei ainda mais.
– Então quer dizer que você imaginou uma vida comigo…
– Cale a boca, pensei que te perderia para sempre. Não devia ligar para palavras de uma garota desesperada.
– Não ligo. Mas ligo para as palavras de uma garota apaixonada.
Ele beijou o topo da minha cabeça e depois meus lábios.
– Bonnie...
– Eu sou sua.
– Eu sou seu.
Ele me beijou novamente, tão suave que pensei em desmaiar. Sônia abriu a porta e se surpreendeu.
– Desculpe, estava muito silencioso então vim ver se… ah… acho que eu preciso ir para casa.
Olhei para o relógio, eram exatamente 23:59. Thomas ficou sentado ao meu lado.
– Obrigada Sônia.
– Descanse, depois você me paga um sorvete.
Ela me abraçou mais uma vez e saiu. Thomas foi quem encontrou o bilhete que deixei na porta destrancada, ele havia pulado o portão e vasculhado a casa por mim, me explicou, e Sônia não sabe de nada, o melhor a se fazer é deixar minha amiga fora dessa confusão, afinal, tínhamos que comemorar, pois eu quebrei um maldição de décadas, algumas horas atrás. Por muito tempo temi o passado, meu presente era turbulento e meu futuro incerto e distante da felicidade. Hoje, depois de encarar de frente minhas dúvidas e meus medos, perdoei meu passado, não me ressinto mais das minhas escolhas, aguardo um futuro melhor. E no meu presente, vejo um Thomas de palitó preto com as mãos para trás, uma Sônia sorridente e chorosa com um vestido azul celeste ao lado dos pais também comovidos, Olívia orgulhosa ao lado da tia do orfanato(Lia) que está como ela, os pais de Anne alegres por ver a pequena me guiando ao altar, escolhi ela por sua esperteza e sinceridade, pureza e carinho, símbolo do que quero para o meu futuro, até o professor Justin estava ali, com alguns colegas de classe, ainda resolveríamos o problema da verba escolar, gastronomia não sairia da escola assim tão fácil. Dessa vez eu usava luvas, não por necessidade, mas para combinar com o vestido branco, preso até a cintura e flocado que quase arrasta no chão, meus cabelos envoltos em tranças, bem presas na cabeça, a pequena igreja estava adornada de flores e cheirava a neve. Meu presente é assim, porque enfrentei meu passado, e o seu?
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Dedicatória: Para todas as minhas amigas irmãs, Sabrina, Lara, Jailine, Fernanda, Nadila, Layane, Kailane, Mariane, Aline, Danilia… e a mim. Nunca é fácil, por vezes nos encontramos com nossos demônios, sejam eles paranóias ou realidade, e muitas dessas vezes, temos que enfrentar cada um deles sem mais ninguém além de nós mesmas e de Deus. Mesmo com vitórias acumuladas, nos sentimos fracas e distantes do caminho de paz e gozo, mas eu creio e confio que a nossa força é a alegria do Senhor, e que ele se alegra ao nos ver vencer, ao nos ver lutando diariamente para suportar lágrimas e conquistar sorrisos! Parabéns, moças… vocês são minha inspiração!
Claro, não podia esquecer de alguns dos meus melhores amigos, Rodrigo e Gleydson, conto com vocês para o resto da vida seus chatos.
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De Encontro Ao Passado Por Um Futuro Melhor.
Short StoryBonnie é uma estudante comum como qualquer outra. Aplicada e inteligente. Órfã de pai e mãe, tendo uma única melhor amiga e recebendo afeto de poucos. Mora em Green Bay, sua vida segue como o planejado até que ela conhece Tomás e o que seria um ano...