Capítulo 1

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Camila acordou em um salto, assustada. O alarme que indicava a hora de acordar estava ressoando.

— Levantem-se! — Uma voz rouca berrou enquanto escancarava a porta do dormitório feminino.

Ouviu os resmungos das outras meninas enquanto se levantavam da cama, de má vontade. Camila piscou, tentando focar em seu entorno. Apesar de já estar acordada, parecia que ainda estava em seu sonho, que apesar de não se lembrar direito, parecia ter sido assustador, e sentia uma sensação diferente, misturada com uma estranha nostalgia. Um mal pressentimento, talvez.

— As meninas que irão para o passeio, se arrumem depressa! E as que não vão, desçam para tomar café da manhã. Mas antes escovem os dentes, ninguém é obrigado a sentir esse bafo de boca de bueiro que vocês têm. — A pessoa que escancarou a porta disse novamente. Camila olhou para a porta e viu Graça, uma das Zeladoras do orfanato.

Graça era uma mulher de aproximadamente uns cinquenta anos, mas aparentava ter muito mais devido aos anos de fumo. Ela usava seu uniforme preto de Zeladora e tinha seus cabelos negros e lisos com alguns fios brancos presos em um rabo de cavalo. Sua voz rouca era reconhecida em qualquer lugar. Até onde Camila sabia, Graça trabalhava ali há muito tempo, desde muito antes de sua chegada ao local.

— Mas vamos ao passeio sem comer nada? — Uma menininha perguntou enquanto arrumava sua cama.

— Vocês vão comer no ônibus. Andem, estão atrasadas! — Ela saiu apressadamente pelo corredor, desparecendo de vista.

Após arrumarem suas camas, algumas meninas saíram pela porta, ainda de pijamas. Camila foi atrás, iria tirar o pijama branco que estava usando para colocar o uniforme do orfanato, que também era branco. Algumas vezes parecia que estava em um hospital, ou até mesmo em um hospício, considerando o modo de agir de algumas pessoas do local.

Saiu do dormitório e entrou no cômodo ao lado, no banheiro feminino. Quando entrou, viu o que sempre via diariamente: os ladrilhos brancos encardidos e amarelados por falta de limpeza adequada e por conta do vazamento de água das torneiras ou das paredes; a lâmpada que fornecia luz de cor amarelada pendia do bocal.

Haviam diversas pias de porcelana amareladas, que ficavam encostadas na parede, no lado esquerdo. No lado direito, ficavam as cabines de vasos sanitários. Algumas tinham vasos quebrados e estavam interditadas. Outras, as portas das cabines não fechavam. Algumas meninas pediam para outras segurarem as portas para elas. Poucas das cabines se encontravam em bom estado.

Depois de algum tempo, algumas garotas saíram do banheiro, ainda de pijamas, indo até a cozinha. Outras uniformizadas, se dirigindo até o ônibus que as levaria à excursão.

Camila se atrapalhou enquanto amarrava seu tênis, então ficou para trás. Viu que havia esquecido seu pente no dormitório e voltou para lá.

Pegou o pente que estava em cima da escrivaninha e penteou seus longos cabelos castanhos enquanto olhava a cada minuto que passava para o pequeno relógio digital em cima de uma cômoda velha, ao lado de sua cama. Faltavam apenas alguns minutos para o ônibus da excursão partir.

Camila havia sido uma das selecionadas para esse passeio, e ela queria aproveitá-lo ao máximo, pois raramente haviam passeios em orfanatos. Além disso, era uma visita ao planetário. Sempre foi fascinada por astronomia, e sem dúvidas, não queria perder essa oportunidade.

Como recentemente uma família bem-sucedida estava financiando o orfanato, eles quiseram fazer esse passeio para as crianças "carentes". Mas Camila sabia que isso não passava de uma estratégia para ganhar as eleições.

Sim, era uma família de políticos, e como as eleições estavam próximas, eles se aproveitam das crianças órfãs. E como o Diretor adorava aparecer, o orfanato era alvo dessas demonstrações de mentiras.

A Viajante - O Outro Mundo (Livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora