Coroa de Gelo

zero

Lenore estava atenta. Ela observava ao redor com uma concentração admirável enquanto buscava por alguma pista que indicaria o caminho seguido por seu irmão.

Ele não poderia ter ido longe, é claro. Haviam se passado meros noventa e nove segundos - menos, já que ela havia acelerado a contagem nos últimos números - e, considerando que ele havia se preocupado em cobrir os rastros pela neve, estava claro que era meramente uma questão de atenção.

Sua respiração estava fraca, mas ainda era capaz de ver a nuvem de ar que se formava a cada expiração, o que fez com que ela estremecesse. Gostaria de dizer que odiava Arian, o Reino de Gelo, território do Ar e das montanhas, mas não odiava. Na verdade, sentia um carinho imenso pela região, e acreditava que isso jamais seria capaz de mudar, mas o frio... o frio ela definitivamente odiava. Talvez fosse contraditório, considerando que cada quilômetro de do reino está sempre coberto por uma camada espessa de neve, independente da estação. Lenn havia passado a vida inteira nessas montanhas e, ainda assim, parecia incapaz de se acostumar com ele, que sempre a deixava doente e a enfraquecia.

Para seu irmão, Sebastian, era mais fácil. Apesar de serem gêmeos ele não era o futuro Líder da Água e, consequentemente, não estava unido à Oseaan de forma alguma - apenas emocionalmente, talvez. Ele amava o frio e vivia implicando com irmã sempre que ela ficava doente e Lenn sempre respondia que o afogaria assim que fossem para a Oseaan, uma ameaça feita tantas vezes que o garoto apenas ria quando era feita.

O problema era que eles não podiam ir. Maira havia fugido do castelo enquanto ainda estava grávida deles, pois sabia que era perigoso demais.  O clima em Oseaan estava delicado, para dizer o mínimo, e os dois jamais estariam a salvo por lá quando a guerra estourasse.

É claro que isso não aconteceu ainda.

Dez temporadas depois e a tão esperada guerra ou revolução ou revolta ou como quer que os adultos escolham chamar, ainda não havia acontecido. Quanto tempo deveria se passar até que eles percebessem que talvez não fosse acontecer?

Às vezes Lenn desejava que seus poderes não a tivessem escolhido. Não queria ter que viver com essa responsabilidade, principalmente sem poder estar próxima da Água. Às vezes isso a deixava irritada com Seb, mesmo isso não sendo culpa dele, mas sempre se sentia culpada pelo sentimento. O menino, apesar de ser insuportável na maior parte das vezes, estava sempre tomando conta de Lenn, mesmo quando ela não percebia, pois ele sabia que se dependesse da mãe, Lenn ficaria sozinha.

Maira, assim como Lenn, não se sentia bem em Arian, e culpava os filhos por ter precisado fugir - Lenn principalmente. Ela não os tratava mal e nunca havia feito nada contra eles, mas os dois notavam, pelas pequenas coisas, que a mãe não estava tão empenhada com o bem-estar deles. Às vezes se sentiam como se estivessem por conta própria, o que significava muito já que viviam isolados.

Em meio a seus pensamentos Lenn escutou um som baixo que, mesmo em meio a imensidão gelada foi capaz de perceber, levando-a diretamente naquela direção. Subiu em uma pedra grande com dificuldade e saltou pelo outro lado. Desembainhou Corte das Ondas, que antes estava presa às suas costas e escutou novamente, um som suave e abafado vindo de trás de uma das muitas pedras altas que preenchiam o cenário sombrio. Definitivamente não era o lugar mais acolhedor de Arian, mas era o único que eles podiam chamar de casa. A garota sorriu e correu para trás da pedra, batendo rapidamente na mesma com o cabo da espada.

- Te encontrei!

Mas seu irmão não estava ali. Lenn franziu o cenho e por um segundo sentiu um nervosismo se instalar em seu peito, levando suas mãos rapidamente ao cordão que estava sempre em seu pescoço em um gesto involuntário, como se, ao tocar nele, ela se sentisse mais segura.