vinte

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Kai escutou algo que não devia ter escutado.

Em sua defesa, ele tinha chegado ali primeiro e, bem... não era culpa dele que Lenore não o tinha visto antes de se posicionar na borda do navio e ficar - pelo menos - quarenta minutos encarando o absoluto nada.

Ou talvez fosse a Água. Ele não tinha como ter certeza, estava escuro e talvez-- 

Será que ela via a Água de forma diferente das outras pessoas? 

Esse questionamento fez com que o tempo passasse mais rápido em sua cabeça, mas o ponto é que ele perdeu a oportunidade de sair quando ela apareceu, pensando que ela iria simplesmente se jogar no mar e ir embora - estaria mentindo se dissesse que o pensamento não o deixou atordoado por um instante. E depois de cinco minutos esperando algo acontecer ele não podia simplesmente se levantar e sair, ela o notaria e seria extremamente desconfortável admitir para ela que ele estava ali o tempo todo.

Então ele ficou ali. Torcendo para acabar logo, mas ficou.

Em dado momento a pixie surgiu e Kai pensou que ela ficaria ao lado de Lenn, mas se surpreendeu quando a pequena se juntou a ele na escuridão, passando completamente despercebida pela princesa. 

Perto como ela estava, mesmo que não tivesse muita iluminação, Kai conseguia perceber a angústia que ela estava sentindo. Parecia ter se conformado que ela, pequena e impotente, não poderia fazer nada para manter Lenn ali, então apenas aguardou.

E então é obvio que Caspian resolveu aparecer.

E é óbvio que ele falou tudo aquilo.

E que deixou a garota ali chorando sozinha - não tão sozinha, é claro, mas nenhum dos dois sab--

Sabe.

Sabe sim, porque Lenore escolheu esse exato momento para olhar para cima e encontrar Kai observando-a como um psicopata. 

Anya voou mais para a escuridão e Kai tinha certeza que Lenn não a tinha percebido. 

Obrigada, ele pensou para si mesmo, trabalho em equipe, eu diria.

- Problemas no paraíso? - optou pelo sarcasmo, a única saída honrosa que conseguiu pensar.

- O quanto você ouviu?

- Mais do que suficiente.

E então ela xingou, passando as mãos pelo rosto para secar as lágrimas.

- Nerina nunca te disse que é feio espionar?

- Eu estava aqui antes, em minha defesa.

Ela pausou seus movimentos, olhando para ele como se ele tivesse crescido uma segunda cabeça, mas não comentou mais nada, então Kai ficou quieto também.

Não durou muito. Kai já estava impaciente, mas, por algum motivo, não queria deixá-la ali sozinha.

Então ficou ali.

Quieto.

Sem se movimentar, até.

Quase como se tentasse ser esquecido.

Até que ele finalmente não aguentou mais.

- Você vai? Embora, no caso.

Ela não respondeu.

Hm.

Talvez se ele--

- Não. - ela respondeu, tão baixo que o vento quase levou suas palavras embora - Não vou.

Coroa de GeloOnde histórias criam vida. Descubra agora