Desejos

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No lado mais distante do açude, os trabalhadores descobriram uma pequena caverna pouco acima da linha d’água. 
Mal comportava uma pessoa de pé, mas tinha altura suficiente para alguém entrar. Alguns empregados da W&W decidiram atravessar as águas frias a nado e ver se havia alguma coisa lá dentro — era mais uma espécie de desafio, pois a pequena gruta era muito escura e inspirava um medo paralisante. Três homens entraram em fila indiana, cada um deles munido de uma lanterna.

A caverna tinha mais ou menos 4,5 metros de comprimento por 1 metro de largura. O trabalhador que encabeçou a fila era um jovem morador local chamado Edward Lansdale, um Ex militar especialista em demolições que voltara da guerra alguns anos antes.

No final do túnel, o facho de luz de sua lanterna iluminou uma mensagem na parede. A mensagem — na verdade, um poema curto — fora literalmente esculpida na pedra. As palavras foram entalhadas numa caligrafia quase extravagante, com cada palavra formando um 
arabesco ou gancho.

Venha nestas águas um desejo sangrar.
Que teus sonhos secretos hei de realizar
Mas se a água secar por alguma maldade
Não farei muito caso de toda a vida tirar.

Os homens que o acompanhavam perguntaram o que estava acontecendo. Ed disse que não era nada, que o túnel terminara e que aquilo não passava de uma formação natural. Os homens deram meia-volta, e Lansdale os seguiu logo depois.

Verdade seja dita, Ed não era o cara mais esperto do mundo. Ele só foi lutar na guerra porque o pai ameaçou dar-lhe uma surra de cinto. Mesmo depois de voltar vivo da guerra Seu pai (um empresário local) não toleraria um filho vagabundo e muito menos ignorante. 

Ed tampouco era um rapaz popular. Vestia-se mal, tinha os ombros caídos e o rosto coberto de crateras produzidas por acnes antigas e cicatrizes resultado de uma falta de atenção em uma cerca de arame farpado.

O poema na parede da caverna deixou-o aterrorizado. 
Apesar de não ser um gênio, era inteligente o bastante para saber que não era nada provável, nem possível que alguém tivesse descido até lá para entalhar aquela mensagem. Alguma coisa naqueles versos tocou-o profundamente e, durante muito tempo, Ed evitou a pedreira como se ela fosse uma colônia de leprosos.

Em seus sonhos, porém, ele via o poema na parede e ouvia os versos serem sussurrados.
Nos dois anos que se seguiram, a vida foi cruel com Ed. 
Ele morava com o pai e nunca tinha um tostão no bolso.

Ninguém gostava realmente dele nem lhe dirigia a palavra. Pois outro oficial chamado Theodore Hopkings afirmou que na guerra a unica vez que foi designada uma função a Ed  "Pateta" como era chamado, se atrapalhou com os explosivos e os detonou antes dos colegas terminarem de arma-los causando a morte de vários soldados.

Depois de saberem disso os moradores de Three Rivers passaram a tratar Ed muito mal. As garotas nem olhavam em sua direção e agiam como se ele não existisse. Com aquela pele oleosa e as solas dos sapatos sempre descolando, Ed sabia que tinha de vencer o medo e voltar à pedreira.

Por isso, decidiu seguir as instruções do poema. Era um garoto desesperado com uma lista de desejos secretos e estava pronto para sangrar copiosamente a fim de realizá-los. A mineradora já estava fechada havia muito tempo quando Ed foi até o açude.

Cortou a palma da mão com um canivete, deixou o sangue pingar na água e fez um pedido. Era um pedido simples, sem muito detalhe ou ostentação. Edward Lansdale queria  ter um pouco de dinheiro. Nada aconteceu. Nenhum dinheiro caiu do céu nem apareceu boiando na água.

Desapontado (e com a mão cortada), Ed voltou para casa.
Dois dias depois, o pai de Eddie despertou o jovem ao meio-dia e contou-lhe que Tia Florence havia falecido. O pai de Ed disse que a tia deixara para ele uma coisa muito especial em seu testamento. Era uma lata cheia de dinheiro. Não era uma grande fortuna, apenas algumas centenas de dólares, mas certamente se qualificou como “um pouco de dinheiro”. O desejo de Ed se tornara realidade.

Sombras do abismoOnde histórias criam vida. Descubra agora