Papai fecha a mão e dá soquinhos repetidos no ar.
— E aí, nossa, filha, quando o Théo te ergueu, eu fiquei apontando e gritando: Essa é a minha Ester! Eu que fiz ela, estão vendo a minha menina? E eles viram, mesmo.
— Achei que ele fosse ter um ataque cardíaco — confessa a minha mãe, virando o rosto para o banco de trás, onde Théonísio e eu estamos calados e sorrindo um para o outro, cúmplices, cada vez que meus pais se distraem. — É melhor que você nunca mais faça isso, Ester. Seu pai e eu estamos velhos demais para esse tipo de empolgação.
— E de decepção! — meu pai pronuncia a última palavra com nojo, cuspindo-a de modo odioso. — Nunca vi um negócio tão roubado. Mas, infelizmente, é assim que as coisas andam nesse país.
— Verdade, né, tio? — Théonísio arrisca, rindo: — É corrupção atrás de corrupção.
Minha mãe dirige um olhar incriminatório que parece dizer "nem comece com isso" na direção de Théonísio. Apesar de todo o trabalho, ansiedade, preocupações e... beijos, não ganhamos. Bem, não em primeiro lugar. Acontece que meu pai reclamou tanto, com o celular em punho que exibia um vídeo da nossa apresentação, que Janaína se viu obrigada a nos dar algum dinheiro. Ela nos deu cem reais, que não pagam nem o tecido do meu vestido, mas nem liguei. Ela é uma mulher simpática, apesar de ter querido se livrar do meu pai barraqueiro na primeira oportunidade.
Quem ganhou, enfim, os seiscentos reais foi um casal de idosos que dublou um trecho de High School Musical. Os netos, ambos um pouco mais velhos que eu e Théonísio, subiram no palco na hora da entrega do prêmio e confessaram que deram sua criatividade ao casal de avós.***
— Juro que eu teria quebrado o palco inteiro com um pedaço de pau caso eu estivesse aí — guincha Lua em ligação comigo.
Estou tomando um gole de café forte no conforto quente (até demais) do meu quarto, sentindo paz e uma sensação de preenchimento novas.
— Amiga, foi uma vitória justa. Os velhinhos foram muito engraçados e fofos — rio, espantada com a raiva atípica (e fingida) de Lua.
— E daí? Queria que vocês tivessem ganhado — ela faz um biquinho triste. — Vi o video da apresentação e vocês estavam perfeitos.
Dou de ombros.
— Quem sabe surja outra chance... — engulo o café com força, querendo mais do que nunca desabafar com a minha melhor amiga. — Posso falar com você?
— Você ainda pergunta uma coisa dessas? — ela ergue uma sobrancelha, e eu sorrio, já distraída.
— É que antes da apresentação, eu e o Théo... Eu e o Théonísio... — me corrijo, desejando guardar o apelido que surtiu tanto efeito nele mais cedo para horas doces como as do beijo. — Você vai ficar chateada comigo?
Lua me conhece tão bem que nem preciso dizer mais nada. Ela surta completamente. São berros atrás de berros que fazem com que, em segundos, suas bochechas fiquem vermelhas feito tomates maduros.
— Não acredito nisso, Ester — grita ela, soltando um palavrão logo em seguida. Uma figura bonita, de cabelos louro descoloridos aparece do lado de Lua, e presumo ser Maria Odete. A garota fica espantada com a empolgação de Lua e dá diversas sacudidelas nela, querendo saber o motivo disso. Minha amiga explica, entre suas respirações ofegantes: — A Ester... E o Théo... Eles ficaram! Finalmente, nossa. Parece o fim de uma era.
Eu sorrio com certa tristeza nos olhos ao relembrar a mesma frase que Théonísio me disse mais cedo.
— E por que não o começo de uma? — provoco.
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Lugar Ao Sol | ✔️
Teen FictionCalor, diversão, picolés... É assim que Ester pretende passar as suas férias de verão. Ela deseja estar junto da melhor amiga na praça da cidade, gastando todos os dias quentes de paz em cima dos patins. Entretanto, como nem tudo são flores, a garot...