v. vergonha significa culpa

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Caro Rhys,

— Estamos avaliando — disse o sr. Shappell para mim em pé do outro lado da mesa — se é mais vantajoso transferi-lo imediatamente a um centro de detenção mais seguro.

— Ou...? — perguntei.

— Ou esperar por sua maioridade e enviá-lo direto para um presídio a maiores de idade.

E foi assim que começou minha manhã, Rhys. Mal tinha aberto os olhos e dei de cara com o Oficial North, meu policial pessoal, prestes a assoprar seu apito estridente (não que esse seja um procedimento padrão da Telscombe, é apenas ele que tem esse hábito irritante de apitar a qualquer instante por qualquer coisa; acredito que tem a ver com o fato de ter sido guarda de trânsito antes de estar aqui). Acho que fui quase literalmente me arrastando pelo gramado úmido até o prédio administrativo.

Só conseguira adormecer perto das seis da manhã, por isso ainda estava na cama quando ele veio me buscar para o sr. Shappell. Na verdade, eu não estaria desperto mesmo que tivesse ido dormir no horário certo. As intenções de Ben são questionáveis, mas sempre me acorda antes de sair para a aula. Hoje isso AINDA não tinha ocorrido, porque North é uma coruja maldita.

Você deve se perguntar por que só agora estou recebendo as consequências do que houve ontem na capela. Bem, já era tarde demais para o sr. Shappell ainda estar trabalhando, então tudo o que eu sabia era que a qualquer hora do dia este momento chegaria. Só não esperava que fosse tão cedo.

— Nos últimos dias — continuou ele — tenho tido problemas demais com você, Alex.

Meu coração ficou frio, quis afundar no estômago e pular boca afora com tais palavras. Minha vontade era de argumentar em própria defesa, mas o medo de que minha situação acabasse pior manteve as palavras entaladas na garganta. Não dizem nos filmes que tudo o que você disser será usado contra si no tribunal?

— O que é estranho. — Voltou a andar de um lado para o outro, pensativo. — Desde chegou aqui, não foi do tipo que procura confusão.

E isso é verdade. Eu obtivera alguma simpatia dele pelo fato de ser um dos detentos que menos lhe dera problemas... até o momento. A última coisa que eu queria era confusão até aquela americana surgir no meu caminho. Desde nosso primeiro encontro, como diz aquela música, jogamos serpentes e escadas: minha sorte indo para cima e para baixo (muito mais para baixo do que para cima).

— Talvez seja finalmente seu... histórico dando as caras. — Seu olhar de soslaio e o tom com que fez tal sugestão me fizeram engolir em seco. Eu não quero ser como ele, Rhys! — Não é, North?

O Oficial North apenas assentiu e resmungou alguma coisa em concordância, embora aposto que sequer estivesse prestando atenção. Passa grande parte do seu tempo de trabalho vendo séries em seu celular e se entupindo de café, porque não se interessa por mais nada além disso — gosta de seu serviço ser mais fácil que a época controlando o trânsito. No momento, era exatamente o que fazia sentado na cadeira a meu lado com o celular no colo fora do campo de visão do sr. Shappell.

— Aqui na Telscombe não toleramos qualquer tipo de violência — disse o sr. Shappell, agora se dirigindo a mim. — O que tem a dizer?

— F-foi um acidente — consegui sussurrar. Eu não pretendia deixar que minha voz saísse tão fraca, mas era como se minha língua fosse tão pesada e me apertasse na garganta, como um caroço. As palavras se tornavam difíceis de enunciar e por um segundo tive a impressão de sentir os olhos umedecendo. Eu só queria que toda a situação desaparecesse.

— O Capelão Martin viu tudo, Alex. Não pode negar.

Martin dos infernos.

Sabe o que ele fez depois que perguntou do iPod? Percebeu-me em cima da americana morrendo e tirou suas próprias conclusões. Talvez seja exagero, mas como posso saber que fim se deu a ela, se não a vi em lugar nenhum desde o ocorrido?

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