Capítulo 8

11 4 2
                                    

14 de maio, dois meses depois.

Saio do banho e sento em minha cama com os ombros pesados. Minha respiração está acelerada e meus olhos estão fora de controle. Não choro para que outros me escutem, mas para deixar vazar um pouco da tempestade dentro de mim.

Hoje faz dois meses que ele se foi.

E pela primeira vez em meses voltei a sonhar.

Depois daquele trato com a minha tia e minha avó, passei a fingir cada vez mais que eu estava bem. Pensei que, fingindo para elas, eu mesma acreditaria, mas não foi o que aconteceu.

A saudade dilacerou um coração já acabado. A cura que eu comecei a receber fluiu para fora do meu corpo, e em mim permaneceram apenas feridas ensanguentadas.

Pai, se o senhor estivesse aqui, qual seria sua solução?

Esse sonho de resgate alimentou ainda mais minha saudade da Voz. Penso no corpo que me salvou do afogamento e não deixo de questionar se teria alguma ligação com ela.

Estou dividida entre o sim e o não.

Ainda acho loucura sentir falta de uma voz que veio da minha cabeça.

Eu não tinha uma data definida para voltar à escola, só sabia que não planejava voltar tão cedo. Após estabelecer o trato com minha avó e minha tia, elas ligaram para a escola e explicaram meu caso. A escola autorizou meu distanciamento desde que eu fizesse tudo e entregasse online.

Eu estava tentando ficar bem, mas a cada noite que se passava eu me sentia mais sozinha e engolida pela escuridão. Eu só soube chorar e guardar meu pedido de ajuda. Não podia ferir meu orgulho.

Até que, há dois dias atrás enquanto eu ajudava minha avó a costurar, ela disse:

— Você parece muito melhor, minha filha. Eu estava... pensando em te perguntar se você já estaria pronta para voltar para a escola...

As palavras, soltas de forma cuidadosa como se eu fosse uma bomba-relógio, me pegaram de surpresa. Quase dois meses haviam se passado desde que tudo aconteceu. Eu estava tentando ao máximo não pensar, mas era extremamente difícil.

— Vó, eu...

— Não precisa, se não quiser...

— Eu quero! — Disse.

Já cansei de me esconder e de ser fraca. Preciso tentar.

Foi o que pensei quando aceitei voltar.

Queria ser convencida pelas minhas próprias palavras.

E agora, me arrumando para a escola, só consigo pensar que foi um erro. Não consigo respirar sem deixar uma lágrima cair no chão.

Mas não vou voltar atrás.

Termino de me arrumar e desço as escadas. Encontro minha avó e minha tia à mesa, me aguardando.

Ambas me olharam como se eu fosse um fio reluzente de esperança. E tive que fingir ser.


Durante o caminho, eu e minha tia permanecemos em silêncio no carro. Ambas submersas em suas próprias cabeças.

Além disso, ela e minha avó estavam sendo extremamente cuidadosas com as palavras.

Em um dado momento do caminho, coloco minha cabeça para fora do carro e deixo o vento gelado da manhã bater em meu rosto. Sempre amei fazer isso. Sempre amei a liberdade ousada do vento e sua força delicada.

Incrível.

Foi meu pai quem me ensinou a apreciar o vento.

Eu tinha cinco anos de idade quando fomos à praia, apenas nós dois. Enquanto eu brincava com a areia grudada nos meus dedos do pé e procurava conchas, uma brisa deliciosamente fria bagunçou meus cabelos. Por estar com a mão cheia de areia, não consegui arrumá-los e comecei a chorar. Meu pai rapidamente os arrumou, prendendo em um rabo de cavalo desengonçado. Depois secou as minhas lágrimas e disse:

— Não precisa brigar com o vento, princesa. Ele é poderoso, porém doce. E os lugares ficam mais vivos quando ele os sopra. Como um fôlego bem forte de vida. — Ele soprou a areia das minhas mãos e as segurou, me levando em direção ao mar para molharmos os pés.

Palavras doces e suaves como a textura das conchas rosadas que peguei aquele dia.

Minha tia estaciona o carro em frente à escola e tira os olhos do volante, colocando-os sobre mim.

— Maria, tudo bem voltar para casa se você quiser. Sei que você é forte, mas se não estiver se sentindo preparada podemos voltar.

— Tia, está tudo bem. Quero ir. — Minto. Eu não quero, mas preciso.

Ela assente e me abraça forte.

— Sempre haverá uma casa para você voltar.

Arrepio ao ouvir isso. Não quis parar para entender o porquê.

Saio do carro e caminho para dentro da escola.

Eu vou conseguir.

Sozinha.

Coração Que ChoveOnde histórias criam vida. Descubra agora