Capítulo 5

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Em toda vida ocorre um momento decisivo. Um instante tão intenso, tão extraordinário, tão claro e tão nítido que temos a sensação de havermos sido golpeados no peito, deixados sem fôlego, sabendo, sabendo, sem a menor sombra de dúvida, que nossa vida jamais será a mesma. Para Azriel, esse momento aconteceu quando ele pôs os olhos em Ámbar Grey.

Ele sabia que aquela fêmea tinha algo de especial, algo que fazia com que qualquer macho se jogasse aos seus pés, algo que fazia todos lançarem olhares de admiração. E ele sentiu como se acabasse de ter sido acorrentado por aquela peculiar fêmea e Azriel, teve que admitir, que gostou da forma que ela o acorrentou desde da primeira vez em que se encontraram.

Ele sabia que Ámbar era especial para ele antes mesmo de saber seu nome, sabia que ela seria diferente das outras antes mesmo de tocá-la pela primeira vez. E sabia que ela seria inesquecível, antes mesmo de perdê-la.

Mas agora, dez anos depois daqueles extraordinários momentos que eles compartilharam juntos e emaranhados, ali estava ela encarando-o como se ele não fosse real, como se ele não devesse estar naquele lugar e como se ele não devesse existir naquele momento. Ele via um leve resquício de fúria em seus olhos quando ela o encarava, mas também percebia que ela estava temerosa com a presença dele.

Mas depois de escutar aquelas duas simples palavras que saíram — ou escaparam, ele não sabia ao certo — de sua boca, Azriel passou a pensar que aquele temor e receio que emanava da fêmea tinham haver com um motivo muito mais complexo do que a sua presença naquele lugar.

E a teoria que rodava a sua cabeça deixava-o enjoado, ele sentia o sangue gelar à medida que todas as peças se encaixavam. Ele sentia como se o seu coração quisesse parar de bater. Tudo, literalmente tudo, confirmava que a sua suposição estava mais que correta. Mesmo com ele querendo que aquela fosse uma suposição errada.

Uma filha que ele nem ao menos conhece...

um ser que ele contribuiu para dar a vida, mas que ele nem ao menos sabe o que ela mais gosta...

uma criança que ele, o pai, não viu crescer. Dar o primeiro passo. Dizer a primeira palavra...

Aquilo tinha que ser um pesadelo, pois se aquilo fosse realidade Azriel sentia que seria capaz de cometer um erro que ele se arrependeria por toda a sua existência por ter cometido.

— Mamãe! Mamãe!

Azriel ouviu a voz da mesma criança que o recebeu chamar pela fêmea, que só há poucos instantes ele descobriu o nome, Ámbar Grey. A fêmea de olhos azuis cintilantes voltou-se para a pequena garota com um sorriso no rosto, um sorriso carinhoso e sereno.

— Calma, calma! — Disse Ámbar, contendo a risada. — O que aconteceu?

— O vovô já está descendo! E ele disse que eu poderia ir lá pra fora, desde que eu deixasse a Bree bem longe de casa e que a senhora me acompanhasse! — Disse ela eufórica. — Vamos, mamãe, por favor! A senhora disse que iríamos antes, vamos mamãe! — Disse ela juntando as mãos.

— Pelo caldeirão, Ravenna! Parece que eu aprisiono você dentro de casa! — Disse Ámbar com um tom indignado.

— Mas eu me sinto uma prisioneira! A senhora não me deixou sair de casa! Faz duas horas!

Ámbar soltou um som de indignação. E olhou pra filha, com surpresa expressa em seu rosto, ela estava impressionada com o drama que a criança fazia.

— Eu devia fazer você passar o dia na biblioteca! Na verdade, é isso que vou fazer... Você está com alguns exercícios de literatura atrasados. Só um dia em casa não faz mal, não é?

— Mamãe, a senhora não faria uma coisa dessas... Ou faria?

— O que você acha? — Perguntou Ámbar cruzando os braços e olhando para filha que a olhava com desespero.

— Mamãe, eu prometo que irei ser um anjo! A senhora nunca verá uma menina tão comportada quanto eu!

Ámbar soltou um suspiro, olhou ao redor e então seu olhar se fixou no Encantador de Sombras que olhava para a cena com um olhar meio entristecido e surpreso. Ámbar engoliu em seco.  

— Vá pegar a Bree e assim que seu avô descer nós saímos. — Ámbar disse, descruzando os braços.

— Está bem! — Disse ela, já no pé da escada. — Prometo não aprontar nada! Serei um anjo! — Disse ela correndo escada acima.

— Durante dois dias ou menos, ela será um exemplo para os anjos, mas depois... Só a Mãe vai saber... — Resmungou a fêmea, voltando a tomar o seu chá.

Azriel observou toda a interação com o semblante neutro. Enquanto os irmãos observavam tudo com divertimento. Ele não conseguia não pensar que ele poderia estar fazendo parte daquele momento tão íntimo, se Ámbar não o tivesse deixado. Em sua cabeça, Azriel começou a buscar, novamente, os variados motivos possíveis para Ámbar tê-lo abandonado.

Era porque ela estava grávida? Era porque ele tinha feito algo de errado? Era porque ela tinha, ou estava, apaixonada por outro? Era porque ela não queria formar uma família com ele?

Todos esses possíveis motivos, e muitos outros, correram pela mente do illyriano todos de uma vez só. O illyriano chegou a ver o mundo girar ao seu redor, eram muitas possibilidades, coincidências, teorias, pensamentos...

Azriel ouviu a voz da fêmea soar por seus ouvidos, porém o mesmo não chegou a compreender por estar muito imerso em seus próprios pensamentos, mas ele percebeu que foi algo que fez Rhys soltar uma sonora gargalhada.

Aquela pequena garotinha era — poderia ser — sua filha. Não era possível que fosse apenas uma coincidência. Tudo levava-o a crer que ela era sua filha. Os olhos, a idade... Mesmo ela sendo a cópia da mãe, ele viu que a pequena garota tinha uma semelhança com ele, uma semelhança que não era um segredo.

Como Ámbar pôde esconder algo tão importante e significativo dele?

{...}

— Rhysand! — Ámbar ouviu o pai exclamar assim que adentrou a sala de jantar. — Vejo que já conheceu minha filha, Ámbar! — Disse ele animadamente.

— Sim, já conheci! E também já conheci sua neta, uma garotinha adorável!

— Sim, realmente, mas só quando não está aprontando por aí! — Brincou Akin, fazendo Ámbar rir.

Ámbar sabia que o pai fingia que não gostava das travessuras que a neta fazia, mas ela também sabia que o pai adorava ouvir Ravenna soltando aquelas risadas travessas e marotas que só a garota sabia emitir, tanto que o mesmo não fazia nada quando via a menina aprontando alguma coisa, ele apenas fingia repreendê-la e depois desatava a rir da travessura.

— Desculpe pelo atraso para recebê-los, eu estava meio enrolado com um pequeno problema.

— Não há problema nenhum, nós fomos muito bem recepcionados por sua filha e neta! — Disse Rhysand. — E... eu quero lhe apresentar os dois cavalheiros que me acompanham! Esses são Cassian, meu General, e Azriel, meu Mestre Espião.

Ambos os machos apertaram a mão do anfitrião com sorrisos leves e educados.

— É uma honra conhecê-los e recebê-los em minha casa! — Disse Akin sorrindo.

— Bom senhores, irei deixá-los na companhia de meu pai! — Disse Ámbar vendo que a mãe e a filha desciam as escadas.

Assim que Ámbar viu a filha chegar acompanhada pela avó, e pela a cobra de estimação que estava em seu pescoço, ela levantou-se da mesa, dando o seu lugar para Akin que agradeceu com um simples "Obrigada, querida".

— Vamos, meu ouro? — Perguntou ela para a filha que falava alguma coisa com a cobra que estava em seu pescoço.

— Sim, mas será que antes eu posso ir até a cozinha pegar alguns biscoitos? Estou sentindo cheiro de biscoitos de chocolate sendo assados.

— É claro, eu espero!

Ámbar evitou se encolher quando viu o olhar que o seu antigo amante lançou para ela. Era um olhar que conseguia dizer, sem nenhum tipo de palavras, que ele queria explicações.

Corte de Laços e  AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora