Audácia

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- Mamãe, onde estamos indo ?

- Hoje o seu irmão vai se tornar um homem Korinne. Ele e todos esses outros jovens. Um dia você também terá que escolher qual é o seu lugar. - Charlie dizia a sua filha enquanto víamos os caminhões da amizade se afastarem de nossas terras.

Minha mente me levava até o teste de aptidão que eu havia feito no dia anterior. Apenas um dia, um único dia para decidir toda a minha vida. Uma escolha tão importante, tomada de forma tão insensível e simples. A maioria deixava que o teste o dissesse o que fazer, e eu decidi fazer o mesmo. Naquele dia, eu deixaria a Amizade para me tornar parte da Audácia, a facção mais destemida da cidade, eu deixaria todas as práticas, costumes, filosofias, roupas e personalidade para me tornar parte de algo maior e isso me assustava, mais ao mesmo tempo fazia com que eu me sentisse extremamente viva. 

Eu sempre soube que não fazia arte daquele lugar, sempre senti em mim um impulso estranho e por isso fui levada a sala de Johanna muitas vezes, quando criança, para longas conversas sobre comportamento. “Semana que vem eu irei finalmente me livrar desse Soro da Paz de uma vez” eu pensei na ultima vez que estive com ela quando me alterei com um dos meus colegas por questões pessoais. A Amizade não aceitava nenhum tipo de conflito, e eu não era tão “legal” quando eles. Tinha certeza de que o teste me confirmaria isso, eu estava pronta.

- Audácia. - A voz de Jack soava na minha cabeça.

Foi isso que ele me disse assim que me recuperei da simulação do teste, meu coração pulou de alegria e medo ao mesmo tempo, mas desde aquele momento eu decidi ser Audaciosa e inibir meu medo para fazer exatamente o que eu deveria.

Meus pais, Morgana e Arthur Grace, sempre souberam que meu lugar não era ali, pelo menos é o que eu penso, ela sempre me dizia pra não me desesperar, pois todos pertenciam a algum lugar. A primeira vez que ouvi isso, foi quando eu tinha seis anos, após um sermão interminável de uma das líderes da Amizade, eu tive medo de não pertencer a lugar algum e ser como um dos sem facção.

- Melody - Minha mãe me tocou. - Não se preocupe.

- Eu não estou. - Todo o meu corpo tremia à medida que nos aproximávamos do prédio onde a Cerimônia aconteceria.

- Lembre-se...

- Todos pertencem a algum lugar - Eu completei.

- E até você. - Meu pai acrescentou num tom brincalhão tirando de mim o meu primeiro sorriso do dia.

Olhei para o caminhão ao lado e Alice estava lá com seus pais, ela parecia feliz, não que eu não estivesse, mas ela parecia estar bem mais. Nossos olhos se cruzaram e ela fez um sinal de positivo pra mim, me fazendo sorrir de lado. Apesar de ficar irritada, a maioria das vezes, com o jeito a qual a Amizade lidava com as coisas, eu ia sentir falta das manhãs no campo, o café da manhã banhado pelo sol, as frutas frescas, o cheiro de maça e terra no pomar, meus pais, Alice. Ia ser difícil, mesmo sabendo que ir pra Audácia era a melhor opção que eu tinha naquele momento.

O caminhão parou, eu respirei fundo e assisti meu pai ajudar minha mãe a descer do caminhão, gentilmente, como sempre. Eu não preciso de ajuda. Pulei do caminhão como eu achei que alguém da Audácia faria e recebi um sorriso largo da minha mãe junto com um abraço. Era como se ela quisesse dizer que estava tudo bem eu ser diferente, e desertar da minha facção de origem.

- Audácia - a voz de Jack soou novamente e um frio correu pelo meu peito quando entrei no prédio.

Apesar de estarmos todos juntos, os blocos eram visivelmente móveis, a nossa frente algumas famílias da Franqueza esperavam um elevador e ao seu lado a Erudição, a Audácia subia a escada correndo enquanto alguns da Abnegação iam atrás lentamente, abrindo espaço pra que eles passassem. Também esperamos o elevador, e alguns de nós, achou estranho o fato de um jovem Abnegado se juntar a nós contragosto de sua família, com certeza ele seria um transferido.

Contos de Uma AudaciosaOnde histórias criam vida. Descubra agora