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LETÍCYA

Eu me sentia tão pronta. Tão ridiculamente entregue. Mas a droga da campainha tinha que tocar agora! Bom, eu admito que estava muito nervosa, mas como João disse, era apenas questão de confiança e acima de tudo ser uma coisa prazerosa para ambos. Mas sei lá... É...estranho.

Me sentei ereta na cama e ajeitei a bainha de minha blusa, apurando os ouvidos para qualquer movimentação na sala. Sentada naquele quarto, naquela cama, me veio a lembrança de meu pai, na época que eu era pequena e ele me levava para meu quarto no colo e contava historinhas para eu dormir. Eu gostava tanto! Só de pensar que ele não estaria mais aqui... Me dava um aperto no peito, um nó gigantesco na garganta.

Eu sentirei muita falta dele. Muita. Assim como a falta que estou sentindo de minha mãe e meu diário; onde eu relatava quase tudo que acontecia em minha vida. Eu o havia ganhado no aniversário de 17 anos, mas não havia dado importância na época; mas agora, com 19 anos, eu passei a vê-lo com mais apreço, e comecei a anotar nele há uns seis meses, quando ainda namorava com Guilherme, o irmão de Manuela, minha melhor amiga e colega da faculdade. Por falar nela, eu sentia falta daquela chata, assim como sentia falta das aulas e dos professores. Eu havia faltado aula por dois dias, e sabia que ia ter que copiar e estudar tudo o que foi perdido se eu quisesse atingir a pontuação necessária pra passar no semestre.

Meu corpo ainda formigava levemente quando João adentrou o quarto com um sorriso enorme.

- Quem era?

- Meu pai - João disse casualmente. - Ele perguntou quando que eu vou parar de enrolar e me casar logo com você.

Sorri. Por mim poderíamos casar agora. Eu tinha certeza de que ele era o homem certo para mim.

- e então... - João se aproximou coçando a nuca, ele parecia um pouco nervoso. - Você. - seus lábios tocaram os meus num selinho. - Quer. - novamente outro rápido beijo. - Casar. - outra vez. - Comigo? - Seu rosto estava alegre e os olhos de meu futuro marido brilhavam.

- Sim! - eu assenti sentindo os olhos marejarem de emoção. - Eu aceito me casar com você, meu lindo.

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INGRID ABRANTES

- Vamos.

Foi só o que eu escutei Evandro dizer antes de me arrastar de modo indelicado pelo braço e me enfiar desajeitadamente no banco carona do carro dele. Um Civic cinza.

- Pra onde estamos indo? - perguntei com a testa enrugada. Esse homem me dava nos nervos as vezes. Eu mal o conhecia, certo?

Só porque era o pai do noivo de minha filha, isso não o dava o poder de me arrastar e me levar pra Deus sabe onde. Então continuei encarando-o até Evandro me responder:

- Aguarde e verás.

O resto do caminho ele passou em silêncio, seu rosto sério e olhar assassino permanecia intacto, porém ora ou outra ele dava um breve sorriso de lado, mas isso não durava mais que dois segundos antes dele voltar a sua expressão impassível.

O carro estacionou e eu nem havia prestado atenção. Estava ocupada demais em observar o homem alto e misterioso ao meu lado. Afinal, pelo que eu estou vendo agora, o que estávamos fazendo em frente à uma igreja que parecia abandonada?

- O que fazemos aqui? - perguntei ao encarar a rua pela janela. O sol estava escondido sob as nuvens e não havia uma viva alma nos asfaltos, sequer carros além desse. - Por que estamos em uma rua deserta? O que pretende fazer?

O receio inundava meu âmago e eu comecei a respirar de modo descontrolado. Evandro olhava para frente com um sorriso perverso e os olhos brilhando de prazer.

Um prazer mortal!

- Só mais alguns segundos e você verá a vida de sua querida filha mudar. - ele disse. Eu...eu não entendi. E o encarei ligeiramente confusa.

- Quê...Como assim?

O celular dele fez um barulho alto e agudo, indicando uma nova notificação no aparelho. Evandro o pegou no porta-luvas e encarou a tela com atenção antes de gargalhar. Uma gargalhada alta e amedrontadora, digna dos filmes de terror que meu falecido marido assistia.

- Sua filha acaba de fazer a maior burrice da vida dela - ele disse, me encarando pela primeira vez. Sua voz estava carregada de ironia, mas seus olhos eram intensos, brilhantes. - Muito obrigada por fazer uma pequena caridade a família Guerra.

Eu arregalei os olhos com pavor quando minha ficha foi caindo, ainda que aos poucos.

Eles eram uma espécie de malditos...golpistas???

Eu... Meu Deus, o que Letícya estava fazendo com aquele marginal?!

Eu tenho que salvar minha filha das mãos daquele bandido!!

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