O despertar de Lorena

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Quem frequenta a academia do Bairro Velho pelas manhãs provavelmente não percebe a presença de Lorena. Sempre discreta e pouco comunicativa, ela entra e sai sem falar com praticamente ninguém, praticando seus exercícios, imersa no mundo paralelo dos fones de ouvido. Aqueles que notarem sua presença vão perceber as formas bem definidas, sobretudo a bunda. Quem quiser olhar mais do que uma bunda grande na academia perceberá os cabelos loiros até o meio das costas e as marcas de seus quarenta e cinco anos no rosto. Os olhares mais atentos perceberão seus olhos castanhos que vivem a desviar olhares e as sardas que graciosamente ornam o seu rosto e seus seios, parcialmente exibidos pelo decote do top. No meio de pessoas extrovertidas e narcisistas ela e sua beleza não são notados. Do jeito que ela gosta.

É comum, na volta da academia, uma passada no mercado, pois há sempre algo faltando em casa. Lá, ela não consegue se camuflar no espaço e é comum o seu corpo é alvo olhares discretos, e outros nem tanto. Lorena sente um misto de vergonha, por ser o centro das atenções e orgulho do próprio corpo, embora desejasse que não fossem tantos a olha-la daquela forma. Às vezes, Lorena era abordada por algum homem interessado, mas ela os rejeitava sem dar muita atenção. Nem era intencional, mas ela tende a ficar monossilábica nessas situações.

Lorena inclusive é casada com Marcelo. Os dois casaram bem jovens e tiveram uma filha no início do casamento. A filha saiu de casa assim que entrou em uma faculdade. A vida de Lorena ficou um pouco mais solitária com essa partida, pois a anos trabalha na própria casa e estava acostumada à presença de sua filha boa parte do tempo.

Lorena chegava em casa e rapidamente arrumou as compras para depois tomar um banho. Vestiu um short e uma blusa bem fresca para passar o dia quente em casa trabalhando. Executava seu trabalho mecanicamente, ignorando qualquer mensagem de grupos de amigos. Nem mesmo o email de Débora com a proposta da identidade da empresa que elas montariam juntas a interessou. Lorena passava os dias, tão desanimada que nem se importava se montaria um escritório de arquitetura novo com suas amigas Débora e Daniela. No fundo, só aceitou o convite por insistência do seu marido, Marcelo, que via nisso a oportunidade de Lorena voltar a se animar.

A noite seu marido chegou do trabalho. Marcelo era um homem de cinquenta anos, um pouco calvo e com uma barriguinha saliente, mas ainda em um corpo grande. Todas as noites ao chegar em casa ele se deparava com Lorena com o mesmo semblante entristecido e sempre tentava algo diferente, sem sucesso. Naquela noite, tinha algo novo em mente.

— Dona Lorena, seu trabalho terminou por hoje.

Marcelo abraçava por trás a sua mulher, que insistia em permanecer sentada trabalhando. Ele não desistiu, se aproveitando da blusa e suas alças finas para distribuir beijos pelos ombros de sua esposa até chegar ao pescoço. Os ritmos dos beijos mudou, ficando mais lentou até que percorrer a língua do pescoço até a orelha. As mãos de Lorena largaram teclado e mouse enquanto seus olhos se fechavam. Os lábios se tocaram em um longo beijo e só depois deste ela percebeu as mãos de Marcelo dentro da sua blusa. Ela sorriu.

— Só assim para você sorrir?

— Me desculpa, eu ando muito desanimada.

— Nossa filha apenas se mudou, amor. Não é motivo para ficar assim.

— Sei, mas sinto falta dela. Essa casa fica tão vazia.

— A casa vazia só me faz ter boas ideias.

— Só pode estar pensando besteira. Tira essas mãos daí.

— Quer mesmo que eu tire?

Lorena demorou a responder.

— Não.

Os dois se beijaram mais uma vez. Marcelo lentamente conduziu Lorena a se levantar e a abraçou. Os braços fortes engoliram o corpo dela assim como ela engolia a língua dele. Lorena gemia se entregando àquele beijo.

Contos do Bairro Velho - 02Onde histórias criam vida. Descubra agora