Livros e Imersão

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Narradora

As coisas ficaram estranhas e confusas desde aquele dia. Lia não enviou mais mensagens para Isaac e só ia em sua casa para dar as aulas e logo ia embora, nos dois primeiros dias Isaac tentou agir normal ou pelo menos esclarecer as coisas mas foi ignorado, ficou com vergonha de ser ignorado outras vezes e se entregou a situação. Infelizmente o caos reinava na cabecinha de ambos jovens e nada era esclarecido.

Lia

Aquele dia não saia da minha cabeça por nada, eu tentava evitar o Isaac e tudo que o envolvesse, mas era inevitável, eu trabalhava com ele, para ele, o via quase todos os dias, e pior, o mais difícil, era fingir para nossos pais que tudo estava bem.

Estava mais uma vez acordada de madrugada com a cabeça a mil, o leve toque dele era convertido em um toque profundo na minha pele, me causava arrepios e agonias só de lembrar, mas não era ruim, eu sentia vontade de sentir de novo. Mas quando eu lembrava da Ana, o jeito que ele mudou os olhos quando a viu sem nem perceber que eu notei, nossa, aquilo me fazia pensar que ele só havia feito cena para ela ver, Afinal, eles possivelmente nem chegaram a terminar. Pensava também que se eu desse corda para ele eu iria chegar no fundo do poço, eu não sou programada para me apaixonar, e eu sei que isso iria acontecer e não daria certo, jamais daria certo.

Me levanto e vou até a varanda, receber o ar gélido da madrugada era agradável, mesmo que não tivesse a função de espantar tantos pensamentos sufocantes.

Dia seguinte

- Você tá tão distante esses últimos dias, Liazinha- Mari me cutucou- tá tudo bem?
- Tá sim,Mari- sorrio de leve
- Tá ansiosa para conversar com o Isaac sendo ouvinte?
- Sim- falo sem dar muita atenção, mas também sem parecer fria
- Você até que esconde bem seus sentimentos-  sua frase me faz olhar para ela
- O que disse?
- Você gosta do Isaac e tem medo ou realmente não suporta a ideia de ser mais que amiga dele?
- Por quê isso do nada?
- Não quero me intrometer na sua vida, mas acho que você deveria conversar com o Isaac sobre isso tudo
- obrigado pelo conselho- olho para baixo novamente e ela se cala para minha sorte ou azar, não queria falar sobre aquilo, mas também não falar era angustiante

Estávamos na cozinha de sua casa almoçando juntas em um dia aleatório da semana enquanto Isaac era operado para finalmente voltar a ouvir. Eu estava ansiosa para vê-lo e poder conversar com ele com mais palavras, frases maiores, mas ao mesmo tempo não quero trocar sequer um mínimo sinal de bom dia com ele. Eu realmente me tornei uma contradição insuportável.

Horas depois

Após passar um tempo com Mari eu fui na biblioteca da cidade, lá era muito calmo e silencioso, o melhor lugar para mim, praticamente abandonado pela população, ninguém ia lá.

- Boa tarde, você que é a Lia?- um garoto me chamou
- Sou eu sim, quem é você?- me assusto um pouco com sua presença um tanto repentina
- Prazer meu nome é Miguel- ele estendeu a mão para me cumprimentar e abriu um largo sorriso
- Prazer- o cumprimentei para não parecer mal educada, mas odiava apertos de mãos
- Você que é a intérprete do Isaac, não é?- ele olha para cadeira á minha frente- posso sentar com você?
Queria dizer não, mas
- sim, pode sentar- dou uma pausa- sim, eu sou intérprete dele, por quê?
- Queria saber se ele tá bem
Arqueio a sobrancelha e inclino a cabeça
- por que não fala com ele?
- Fiquei com vergonha, logo de início eu não falei por que toda galera do grupinho ignorou o acidente, aí eu não sabia o que dizer ou fazer, tive medo dele ser grosseiro comigo
- Ah, você é um dos amigos terríveis dele?
- É assim que você me conhece?- reparo no quão bonito era os olhos dele, era um tom escuro de verde, mesmo que sem caráter os amigos do isaac eram belíssimos jovens, parecia até atores de um filme americano
- Na verdade, eu não sei quem você é, mas sei que os amigos do Isaac são más
- É, não tiro o seu direito de pensar isso. Mas você acha que devo falar com ele?
- Acho, pelo menos para pedir desculpas
- Então você pode me levar até ele?
- Pode ser, mas eu não vou precisar mediar a conversa por quê ele pode ouvir agora
- Sério?- ele pareceu animado, ou fingiu, sei lá, não confio
- Sim, você sabe o que é implante coclear né?
- Não- ele pareceu envergonhado por não saber
- É a sua cara não saber o que é- ele riu com minha resposta, não sei por quê, não achei engraçado
- O implante coclear resumindo faz com que o isaac possa ouvir de novo, é um tipo de aparelho eletrônico auditivo
- Ah sim, então ele fez esse tal implante aí?
- pela hora já deve ter feito sim, ele fez hoje
- Que bom- seu sorriso pareceu genuíno- Mas você pode ir comigo?
- Eu te passo algum tipo de segurança? Por quê você não vai sozinho?
- Nossa
- Perdão, eu não quis parecer grosseira
- Tá tudo bem se não quiser ir
- não, tudo bem, eu vou- o clima ficou estranho, incrível esse meu talento de parecer grosseira
- Enfim, valeu pela conversa, Lia- ele sorri novamente- posso pegar seu número?

Passo meu número para ele e finalmente ele vai embora. Não queria parecer insuportável, mas eu não gostava de ser interrompida quando estava lendo, volto a minha leitura e até esqueço do tempo.


Marii

Marii: Anjinho, onde que você tá??
Mari: seu pai tá tentando falar com você

Tô na biblioteca
Por quê não conseguiu falar?

Marii: Seu celular não da área
Marii: Vai para casa e amanhã c vem aqui?

Vou sim

Observo a hora e percebo que já está tarde e muito provavelmente já já iriam fechar. Saio de lá e vou para casa com um pouco de medo pois já estava escuro.

Quando chego vejo meu pai cochilando no sofá, resolvo não acordar ele e subo para o meu quarto em silêncio.
Novamente quando chego em casa no final do dia me sinto estranha, como se algo estivesse faltando, eu sabia do que se tratava, mas iria continuar fugindo, pensei na possibilidade de não ir amanhã na casa do Isaac, e é isso que vou fazer, só vou se me obrigarem.



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