Planos

5 2 0
                                    

— Acabou de chegar — Ellie disse no dia seguinte, dirigindo-se para os fundos do trailer com um grosso envelope pardo. — Um dos rapazes trouxe da cidade. Hammond o enviou.
Grant notou o logotipo azul e branco da InGen, quando abriu o envelope. Dentro não havia nenhuma carta para introduzir o material, só um monte de papel empacotado. Ao desembrulhar, descobriu que eram plantas, em cópias reduzidas, encadernadas em um volume grosso. Na capa estava escrito: "Islã Nublar — Instalações Para Hóspedes (Conjunto Completo: Alojamento Safári)" — Mas que diabo é isso?
Quando abriu o livro uma folha solta caiu.
Meus caros Alan e Ellie, Como podem imaginar, ainda não temos um material promocional oficial. Mas isso pode lhes dar uma idéia do projeto de Islã Nublar. Eu o considero muito excitante!
Mal posso esperar para discutir isso com vocês! Aguardo ansiosamente sua chegada!
Abraços,  John — Não entendo — Grant disse, folheando o volume. — São plantas arquitetônicas. — Ele abriu na primeira página:

Grant passou para as plantas propriamente ditas

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Grant passou para as plantas propriamente ditas. Ostentavam o carimbo: "Segredos Industriais — Cópia Proibida", e também:
"Informações para uso industrial — Distribuição proibida". As páginas eram numeradas, tendo sempre o cabeçalho o aviso: Estas plantas constituem criações confidenciais da InGen. Caso não tenha assinado o documento 112/4A, corre o risco de processo criminal.
— Para mim parece pura paranóia — comentou.
— Talvez haja um motivo — Ellie ponderou.
Na página seguinte havia um mapa topográfico da ilha. Mostrava que Isla Nublar tinha o contorno de uma gota invertida, mais gorda no norte, afinando em direção ao sul. Com doze quilômetros de comprimento, fora dividida no mapa em diversos setores grandes.
A parte norte trazia a indicação "Área para visitantes", e continha estruturas com legendas como "Chegada dos Visitantes", "Centro de Visitantes/Administração", "Energia/Dessalinização/Apoio", "Residência de Hammond" e "Alojamento Safári". Grant identificou os contornos de uma piscina, retângulos indicando quadras de tênis e áreas arredondadas, com jardins e bosques.
— Parece mesmo um complexo turístico — Ellie opinou.
Eles examinaram as plantas do alojamento safári. Nas perspectivas, parecia interessante: a construção térrea continha uma série de pirâmides no teto. Mas havia poucas informações sobre os outros prédios da área destinada aos visitantes.
O resto da ilha era ainda mais misterioso. Pelo que Grant pôde entender, eram áreas abertas. Havia uma rede de estradas, túneis e prédios, além de um lago comprido e estreito, que parecia obra humana, com diques e barreiras de concreto. Mas, em sua maior parte, a ilha fora dividida em grandes áreas arredondadas, com poucas construções. Cada uma das áreas era indicada por um código:
/P/PROC/V/2A, /D/TRIC/L/59(4A + 1), /LN/OTHN/C/4(3A + l) e /VV/HADR/X/ll(6A + 3 + 3DB).
— Será que tem alguma tabela para esses códigos? — Ellie perguntou.
Grant folheou o volume, mas não encontrou nada.
— Talvez tenha sido retirada — ela especulou.
— Como eu já disse, pura paranóia. — Grant estudou as grandes divisões em curva, separadas umas das outras por um emaranhado de estradas. Havia apenas seis setores em toda a ilha. E cada uma das áreas era isolada da estrada por um fosso de concreto.
Na beirada de cada um havia uma pequena cerca, com um minúsculo raio desenhado. Isso os intrigou, até que concluíram que as cercas eram eletrificadas.
— Isso é muito estranho — ela disse. — Cercas eletrificadas em um complexo turístico?
— Quilômetros de cercas — Grant observou. — Cercas eletrificadas e fossos, juntos. E normalmente tem uma estrada que os acompanha.
— Parece um zoológico — Ellie concluiu.
Retornaram ao mapa topográfico e estudaram atentamente os contornos. As estradas tinham sido dispostas de modo incoerente. A principal seguia de norte para sul, por entre os morros centrais da ilha, inclusive um trecho que parecia ter sido literalmente cortado na rocha, na beira do penhasco, acima de um rio. Pelo jeito, haviam feito um esforço deliberado para manter as áreas maiores isoladas, separadas entre si e das estradas por fossos e cercas eletrificadas. E as estradas eram altas, acima do solo, para que se pudesse olhar por cima das cercas.
— Sabe de uma coisa — Ellie disse —, essas obras são enormes.
Olhe só. Esse fosso de concreto tem dez metros de largura.
Parece uma fortificação militar.
— O mesmo vale para as construções. — Grant reparou que cada uma das divisões maiores possuía na parte interna algumas edificações, normalmente localizadas em cantos protegidos. Mas os prédios eram todos de concreto, com paredes grossas. Os cortes laterais mostravam bunkers com janelas pequenas. Como os que os nazistas usavam nos antigos filmes de guerra.
Naquele momento, ouviram uma explosão abafada, e Grant deixou os papéis de lado.
— Vamos voltar ao trabalho.
— Fogo!
Houve uma ligeira vibração e linhas amarelas apareceram na tela do computador. Agora a resolução estava perfeita, e Alan Grant pôde olhar o esqueleto, bem definido, o longo pescoço arqueado para trás. Sem dúvida nenhuma era um filhote de velociraptor, e parecia em perfeito...
A tela ficou vazia.
— Odeio computadores — Grant reclamou, olhando para o sol.
— O que foi agora?
— Defeito no cabo do transformador — um dos assistentes explicou. — Um minuto, por favor. — O rapaz debruçou-se sobre o emaranhado de fios atrás do computador portátil. Eles o haviam colocado em cima de uma caixa de cerveja, no morro Quatro, perto do dispositivo que chamavam de Thumper.
Grant sentou-se na encosta do morro e olhou para o relógio. Em seguida comentou com Ellie:
— Vamos precisar lidar com isso do modo antigo. Um dos rapazes o escutou.
— Ora, Alan.
— Sabe — Grant disse —, preciso pegar o avião. E quero deixar o fóssil protegido antes de minha partida.
Quando se começava a expor um fóssil, era preciso ir até o fim, ou se arriscar a perdê-lo. Os visitantes imaginavam que a paisagem nas terras áridas era imutável, mas na verdade esta sofria erosão constante.
Durante todo o dia escutavam o barulho das pedras rolando nas encostas. E sempre havia o risco de uma tempestade. Mesmo uma pancada rápida destruiria um fóssil delicado. Sendo assim, o esqueleto parcialmente exposto por Grant corria perigo e precisava ser protegido até sua volta.
Proteger um fóssil habitualmente significava jogar um encerado em cima do sítio e cavar uma vala no perímetro, para evitar as enxurradas. O problema era saber o tamanho da vala necessária para proteger o fóssil de velociraptor. Até agora, com os outros fósseis, vinham utilizando tomografia sônica auxiliada por computador, ou TSC.
Tratava-se de um procedimento novo, no qual o Thumper detonava um projétil de chumbo no solo, provocando ondas de choque que eram lidas pelo computador. Este produzia uma espécie de raio X da encosta do morro. Tinham lançado mão desse recurso durante todo o verão, com resultados variáveis.
O Thumper estava a sete metros deles, uma caixa prateada grande, com rodas e um guarda-sol por cima. Parecia um carrinho de sorvete, parado contraditoriamente no deserto. Dois jovens assistentes recarregavam o Thumper com mais um projétil de chumbo.
Até agora o Thumper só servira para localizar os fósseis, ajudando a equipe de Grant a escavar com mais eficiência. Mas os técnicos garantiam que dentro de poucos anos seria possível gerar uma imagem tão detalhada que dispensaria a escavação. Teriam uma visão tão perfeita dos ossos, em três dimensões, que isso inauguraria uma nova era para a arqueologia, sem escavações.
Mas nada disso acontecera ainda. E o equipamento, que funcionara com perfeição no laboratório, mostrava-se delicado e sensível demais para o trabalho de campo.
— Demora muito? — Grant perguntou.
— Já conseguimos arrumar, Alan. Não ficou mal.
Grant voltou a observar a tela do computador. Viu o esqueleto completo, desenhado em amarelo vivo. Realmente, era um espécime bem jovem. As características mais marcantes do velociraptor: garra com um único dedo, que no animal adulto era curva, com quinze centímetros de comprimento, poderia rasgar a carne de sua presa. No caso do filhote, ainda não passava do tamanho de um espinho de roseira. Mal se podia vê-la na tela. E o velociraptor era um dinossauro leve, de qualquer modo, com ossos finos como os de uma galinha, e presumidamente tão inteligente quanto essa ave.
O esqueleto parecia em bom estado, apenas a cabeça e o pescoço virados para trás. A flexão do pescoço era tão comum em fósseis que os cientistas criaram uma teoria para tentar explicá-la, sugerindo que os dinossauros foram extintos por envenenamento com alcalóides que as plantas desenvolveram. O pescoço virado seria resultado da agonia final do dinossauro. Grant conseguira descartar a teoria, mostrando que muitas espécies de aves e répteis sofriam de uma contração póstuma dos ligamentos posteriores do pescoço, o que provocava o movimento peculiar da cabeça. Não tinha nada a ver com a causa da morte, e sim com a carcaça seca ao sol.
Grant notou que o esqueleto em questão sofrerá também uma virada lateral, de modo que a perna e o pé direitos se erguiam acima da coluna.
— Parece um pouco distorcido — um dos rapazes comentou. — Mas não acho que seja por causa do computador.
— Não — Grant confirmou. — É só por causa do tempo. Muito, muito tempo.
Grant sabia que as pessoas eram incapazes de imaginar o tempo geológico. A vida humana se processava em uma outra escala. Uma maçã escurecia em poucos minutos. A prata em alguns dias. Uma pilha de material orgânico virava adubo em uma estação. Uma criança virava adulto em uma década. Nenhuma das experiências humanas cotidianas preparava as pessoas para imaginar o significado de oitenta milhões de anos — o período transcorrido desde a morte daquele pequeno animal.
Quando dava aula, Grant tentava comparações. Se imaginassem que o período médio de vida de um ser humano, sessenta anos, fosse comprimido em um dia, então oitenta milhões de anos valeriam três mil, seiscentos e cinqüenta e dois anos — uma idade superior à das pirâmides. O velociraptor estava morto há muito tempo.
— Não parece muito ameaçador — falou outro dos rapazes.
— E não era mesmo — Grant explicou. — Pelo menos até crescer.
Provavelmente o filhote se alimentava de animais mortos, dos restos deixados pelos adultos, depois do banquete dos animais maiores, quando estes ficavam descansando ao sol. Os carnívoros podiam comer até vinte e cinco por cento de seu peso corporal em uma única refeição, o que os deixava sonolentos em seguida. Os filhotes passariam por cima dos corpos largados dos adultos indulgentes, para mordiscar a carcaça do animal morto. Provavelmente eram até graciosos.
Mas um velociraptor adulto mostrava-se bem diferente.
Respeitadas as proporções, apresentara-se como o dinossauro mais feroz que existira. Embora relativamente pequeno — cerca de noventa quilos, do tamanho de um leopardo — os velociraptores eram ágeis, inteligentes e ladinos, capazes de atacar ferozmente com seus dentes afiados e patas fortes, dotadas de garra terrível.
Caçavam em grupo, e Grant imaginava a cena excitante de uma dúzia daquelas feras correndo a toda velocidade, pulando nas costas de um dinossauro muito maior, rasgando o pescoço e retalhando o dorso e a barriga da vítima.
— Nosso tempo está se esgotando — Ellie disse, trazendo-o de volta à realidade.
Grant deu as instruções para que cavassem a vala. Graças ao computador, sabiam que o esqueleto se confinava a uma área relativamente pequena; uma vala em torno de um quadrado de dois metros bastaria. Enquanto isso, Ellie estendia o encerado que protegeria a encosta do morro naquele trecho. Grant a ajudou a cravar as últimas estacas.
— Como o filhote morreu? — um dos assistentes perguntou.
— Duvido que possamos descobrir — Grant respondeu. — A taxa de mortalidade dos animais silvestres é alta, chega a setenta por cento em alguns carnívoros. Pode ter sido qualquer coisa: doença, separação do grupo, até mesmo ataque de um adulto. Sabemos que os animais caçavam em grupo, mas não descobrimos nada ainda sobre seu comportamento coletivo.
Os estudantes balançaram a cabeça, concordando. Haviam estudado o comportamento animal, e sabiam, por exemplo, que um novo macho, ao assumir o controle de um bando de leões, matava imediatamente as crias. O motivo era aparentemente genético: o macho procurava disseminar seus genes, o máximo possível, e ao matar as crias provocava o cio nas fêmeas, podendo engravidá-las. Também impedia que as fêmeas desperdiçassem seu tempo cuidando dos filhotes de outro macho.
Talvez o bando de velociraptores caçadores também fosse comandado por um macho dominante. Sabiam tão pouco sobre os dinossauros, Grant pensou. Depois de cento e cinqüenta anos de pesquisas e escavações, ainda desconheciam os hábitos desses animais.
— Precisamos ir — Ellie insistiu. — Se quisermos chegar a Choteau às cinco horas.

O parque dos DinossaurosOnde histórias criam vida. Descubra agora