Passado

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Aviso: o capítulo contém relatos de ansiedade, agressão física e psicológica.

Sérgio

Senti minha cabeça latejar ao acordar. Nem me lembrava ao certo como eu havia dormido noite passada, apenas alguns flashes de memória entre o barulho de um vidro quebrando e o meu choro. Então tudo veio a tona. Senti meu estômago revirar e as palavras de Raquel invadirem minha mente.

"Paula é sua filha"

O mesmo sentimento de traição voltou em cheio, mas então eu lembrei da forma como ela me olhou: estava assustada. Seus olhos transbordando enquanto gritava para que eu a escutasse. Mas eu não conseguia, não naquele momento, eram informações demais.

— Que droga! — passei a mão no rosto e o senti molhado de suor.

Já estava claro lá fora e a luz do sol entrava pela fresta da janela iluminando o quarto. Provavelmente todos já começaram o dia e seguiam sua vida normalmente. Eu me sentia vazio, estranhamente vazio.

Afastando os possíveis pensamentos da minha cabeça, tomei um banho e vesti uma roupa confortável. Enquanto eu preparava meu café notei o quão silenciosa aquela casa estava, coisa que eu não sentia há muito tempo, confesso.

Acabei descobrindo que o vidro quebrado pertencia antes ao espelho da sala. Como se não bastasse ter que recolher, os cacos acabaram me cortando:

— Ótimo, sete anos de azar e agora sem um dedo. — ironizei minha própria desgraça.

Juntei todos os cacos e os coloquei em um jornal com devido cuidado. Assim que terminei escutei a campainha tocar indicando alguém e me surpreendi totalmente ao abrir a porta:

— Larissa?

— Oi, Sérgio. — acenou rapidamente. — Desculpa te incomodar essa hora, eu te acordei?

— Não, imagina. — sorri um pouco sem graça. — Posso ajudar com algo?

— Eu deixei algumas caixas no nosso... No seu quarto de hóspedes. — corrigiu. — Se você não se importar, eu posso buscar?

— Claro, entre. — abri totalmente a porta e dei passagem para ela.

— Vim devolver isso também, não tenho motivos ficar com elas. — ela retirou do bolso as chaves da casa, que antes eram suas. — Bom, se me der licença. — me encarou pedindo autorização para subir até o quarto, eu apenas assenti e a vi subindo as escadas.

Me sentei no sofá de qualquer forma e olhei o teto: novamente visualizei os olhos da loira em minha mente, como um ímã, meus pensamentos sempre retornavam a ela. Senti-me mal por gritar daquela forma. Eu simplesmente não consegui reagir de outra maneira, a notícia de ser pai de novo me pegou de surpresa e pela segunda vez eu também não conhecia meu filho.

Eu havia perdido um e ganhado outra em poucos dias. Seria essa mais uma obra do destino? Céus! Isso tudo é tão confuso.

— Sérgio! — um estalar de dedos surgiu na minha frente e me tirou dos pensamentos. — Estou falando com você.

— Desculpa, Lari. — ajeitei meus óculos. — Eu estava distraído. O que falava?

— Eu disse que você pode doar o que estiver nas outras caixas. — só então notei que ela estava apenas com uma em mãos.

— Sim, sim! pode deixar.

Ela me olhou por longos e intermináveis segundos em um silêncio constrangedor até soltar: — Você está bem?

— É... Sim. — menti. — Por quê?

Ela suspirou colocando a caixa no chão e se sentou ao meu lado: — Eu te conheço, vai fala.

Eu ainda te amoOnde histórias criam vida. Descubra agora