PROTOCOLO DE SEGURANÇA

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Darsah

Algumas horas após a colheita...

Estou ciente de ter ignorado todos os protocolos de segurança quando trouxe essa fêmea à bordo, mas eu não podia simplesmente ignorar o fato de que ela estava fora de controle e de que não achava digno continuar acasalamento com ela sobre a dura pedra como se ela fosse um animal no cio.

Nosso único médico à bordo, estava lá embaixo acasalando e não podia ser interrompido e a única coisa que eu podia fazer era servi-la por quanto tempo ela desejasse, até que Reyes pudesse subir e ministrar um antídoto.
Eu me sentia como se tivesse pensado em meu próprio benefício; ela não pôde escolher seu parceiro dentre  todos nós, assim como as outras.
Eu era o que estava disponível ali no momento e ela veio para mim.
Se bem que minha reação com o outro macho me deixa em sérias dúvidas se eu não teria entrado numa disputa feroz para tê-la.

Não entendo o que deu errado com a porção de fertilidade, porque mesmo que ela tenha ingerido mais do que a quantidade limite, não era para ter tido aquele efeito avassalador, deixando-a tão irracional e selvagem.
Quando finalmente consegui saciá-la, fazia muito tempo que os outros haviam voltado para a nave.
Ela estava dormindo e eu com a pele das costas e braços em carne viva. Parecia que eu havia lutado com um animal feroz, ao invés de ter acasalado.

Quanto aos meus ferimentos, eles podiam ser curados com um regenerador, mas o que aconteceu com essa fêmea era algo a ser investigado para que não voltasse a acontecer com outra.
Então, quando Ária apareceu na minha porta, minha vontade era de socá-lo até a morte, mesmo sabendo que ele não tinha culpa de nada.
Mas só de imaginar que a pequena fêmea humana estaria em apuros, se eu não tivesse aparecido, me fazia querer matar alguém.
De quantos machos humanos ela precisaria para ser saciada? Só de pensar nela escolhendo dois ou três machos pra acasalar, me faz querer arrancar alguns membros aqui e meu comandante certamente percebeu isso, porque está mantendo uma distância segura de mim.

— Por pouco essa fêmea não morreu, deram a ela mais do que deviam...os culpados devem ser punidos...— brado furiosamente. — Eu não aceito que fêmeas indefesas não possam ter escolha sobre suas vontades.

Nesse momento, observo o olhar dele para meu leito e percebo que a fêmea abriu os olhos rapidamente; ela é mais forte do que imaginei, não entendo como ainda consegue manter um fio de consciência que seja.

— Alteza, mandarei investigar e me certificarei de que esse incidente não volte a acontecer.

— Chame Reyes aqui para fazer uma avaliação nela, só a mandarei de volta quando tiver certeza de que está bem.

Mal termino de falar e meu comandante já está saindo, à passos largos, como se fosse uma abelha fugindo de sua colmeia em chamas.
Retorno para dentro e me sento junto à cama, na minha poltrona de leitura.
Só agora consigo observar claramente os traços marcantes da criatura despida em meu leito, sua pele é clara e contrasta com a minha.
Seus cabelos estão emaranhados, mesmo assim são lindos e me fazem lembrar o dourado pôr do sol de Anúria.
Se tudo correr bem, daqui trinta ciclos ela estará partindo conosco para meu planeta natal, assim como as outras que fizeram parte dessa colheita.

Pelo que fui informado, apenas duas delas não foram compatíveis com nenhum dos tripulantes e eles ficaram longe delas, ainda assim, todos conseguiram pelo menos uma companheira. Exceto, Ária e Reyes que tiveram duas.
Meu olhar se detém no ventre da fêmea; agora que estou nisso, não posso evitar pensar que minha semente pode germinar e que essa humana pode querer tirar minha pele por causa disso. E o modo selvagem como ela me rasgou com as unhas me faz ter a certeza de que ela é muito brava.
Meu pescoço também foi marcado com chupões; embora eu tenha sido cuidadoso com ela, isso não foi recíproco.

— Alteza?

Fico surpreso ao ver Reyes no meio do quarto.
Como não notei ele adentrar?

— Que tal bater antes de entrar?— Falo com certa irritação e puxo um lençol para cobrir a fêmea.

— Meu senhor, eu fiz isso,  por várias vezes e como vossa alteza não atendeu, temi por sua segurança e usei meu cartão de acesso. Peço que me perdoe!

— Hum... Faça seu trabalho, Doutor! — Resmungo.

Ele sabe que estou impaciente com sua presença e puxa seu equipamento com rapidez; um feixe de luz irradia sobre a fêmea e em poucos segundos ele tem o diagnóstico:

— Ela está febril, é provável que ainda seja efeito da porção. Ministrarei o antídoto e ela ficará bem. Posso coletar uma amostra sanguínea para análise?!

— Contenha-se! Não vais tirar nada dela...

— Então, imagino que não me deixará aplicar o antídoto?! — ele questiona mostrando uma seringa.

— Seja rápido!

Reyes passa por mim como se estivesse passando por uma besta feroz e aplica o antídoto no pescoço dela o mais rápido que pode, depois se afasta.

— Ela só precisa descansar, alteza! Ajudo em algo mais?!

— Mande replicar as vestes dela e a leve de volta em segurança para o hotel e depois reúna todos os tripulantes que fizeram parte da colheita na sala de reuniões, estarei lá em um quarto de hora terrestre.

Confesso que estou tentado a permanecer com essa fêmea aqui, mas tenho que dá o exemplo. Já cometi um erro ao trazê-la e mesmo que os outros não tenham dito nada, por eu ser seu príncipe, devem ter feito suas divagações.
Por isso, solicitei essa reunião para esclarecer tudo.
Depois que ela foi levada embora, dirigi-me à sala.
Todos estavam envolta da mesa e pareciam ansiosos.

— Eu sou culpado! Não deveria ter trazido a fêmea aqui, mas fiz o que julguei apropriado diante da situação. Eu não sou melhor do que nenhum de vós e não mereço mais regalias por ser da casa real.
Estou aqui me desculpando e lhes dou a minha palavra que manterei a distância apropriada da fêmea humana. — Digo sem rodeios, afinal foi para isso que vim. A reação deles foi conforme esperado, nenhuma palavra. — De agora em diante, seguimos o protocolo de segurança. Ária ficará responsável por cuidar da segurança delas durante os trinta ciclos. Sabemos que fêmeas humanas costumam se relacionar com vários machos, mas durante esse tempo, elas devem ser impedidas, nenhum macho humano deve tocá-las. Isso deve ser feito nas sombras, elas não podem desconfiar de nada. Alguma dúvida?!

— Não, alteza!

Eles respondem em unissono.

— Então, se não têm nada para relatar, estão dispensados.

Todos saem, exceto Reyes.

— Alteza, fiz a análise da porção que foi oferecida às fêmeas e não identifiquei nada de errado com ela. É a mesma de sempre e mesmo que a fêmea tenha tomado o dobro do recomendado, não deveria ter tido aquele efeito, era para ter ficado inconsciente por alguns dias. Acredito que o organismo dela tenha rejeitado algum componente da fórmula e causado um efeito amplificado. Se eu puder ter um pouco do sangue dela, saberei o que houve com mais exatidão.

— Doutor, por que essa cisma com o sangue dela?! Eu não já falei que não o terás?! Acredito que já tenhamos tirado demais delas. Apenas notifique nossos receptores e dê-lhes o antídoto, caso algo assim volte a acontecer, eles mesmos poderão resolver.

— Assim será, alteza!

Olho para o macho saindo e tento ignorar o fato de que sua repentina curiosidade por aquela fêmea, em especial, chamou minha atenção.
Teremos um grande problema à bordo se Reyes tiver despertado interesse por ela que não seja de cunho profissional.
A questão aqui é que todos esses machos sabem que a fêmea não teve a oportunidade de escolher dentre eles e podem se sentir tentados a se colocarem à sua disposição, o que certamente gerará um confronto direto comigo.
Espero que eles estejam cientes do perigo que represento ou estarão assinando a própria sentença de aniquilação.

Luzes No CéuOnde histórias criam vida. Descubra agora