Desespero

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Desespero

Meu coração palpitou desesperadamente quando toquei naquela porta de metal gelada. Fazia dias que não entravamos dentro do depósito, talvez pelo frio ou por medo do lugar ser tão sombrio. Empurrei a maçaneta da porta com força, ela rangiu e devagar abriu. Me deparei com uma escada pouco luminosa de concreto maciça e empoeirada. Fui o primeiro a colocar o pé nela, seguido de João e logo atrás Oliver. Segurei minha 9 mm na altura de meu rosto, com medo e apreensivo, não sei o motivo, mas sentia que poderíamos estar sendo vigidos. Essa era a sensação que tinha a todo momento, era como um novo sentido, um sexto sentido que atormenta qualquer mente consciente. Era relativo o que passava sobre meu corpo, o frio mistura-se ao calor da pressão exalada pelo pavor, minhas pálpebras abriam e fechavam em um ritmo frenético e minhas pernas tremiam ao movimento dos meus passos. Sufocante, tenso e avassalador. Em instantes me direciono ao final da escada apontando minha arma para o breu gelado.

Olhei para o rosto de João. Sua expressão era séria como sempre, o velho sabia o que estava fazendo. Seu olhar frio, calculista, estampa sempre um ar de soberania. Sem esse velhaco de sessenta anos não conseguiríamos ter chegado até aqui. As vezes penso no que ele sente, atrás de seus olhos cansados, atrás dessas diversas rugas espalhadas pelo seu rosto. Suas mãos grandes de pele fina empunha aquela arma com mestria, mas será que sua mente é tão organizada quanto seus movimentos? Lembro que ele um dia havia comentado que sua vida era ler um jornal de papel, sentado na varanda junto com sua esposa. Os dois tomando xícaras quentes de café e jogando papo fora. Vê-lo aqui segurando uma arma, de colete e com uma mascará pronta para ser usada em seu rosto é insano. Tirar o aconchego de um velho senhor quer passará por tanta coisa na vida é sufocante, mas creio que seu objetivo é proteger todos, em memória de sua amada.

Por outro lado, Oliver segurava sua arma desajeitado, evidente que tremia como se fosse ter um colapso, pois o objeto mortal em sua mão não tinha instabilidade. Aquele cara era suspeito, não por ser um antigo namorado de Luiza, mas seus trejeitos me colocava em alerta. Ele não parece o tipo de pessoa confiável. Desse tempo para cá que estamos presos no mercado, ele não fora muito útil. Não participou dos treinamentos que Torres e João nos deram. Ficou sempre ali, com seu topete liso cor de ouro erguido sobre sua testa lisa e branca. Seus olhos fundos e cristalizados por uma mare de enigmas, sempre sobressaiu em meus devaneios. Esse homem poderia nos passar a perna como fez Maycon? – Nicolas você está ficando paranoico – pensei.

— Tomem cuidado, faz dias que não entramos aqui, o disjuntor parou de funcionar então é perigoso andar sem cautela. – João sussurrou.

— Certo. – Respondi.

— Vamos logo com isso. – Oliver vociferou se esquivando atrás de mim.

Aquele lugar era grande, existiam quatro corredores divididos por estruturas que serviam de gigantescas prateleiras. Sobre elas dezenas de caixas de produtos e paletes com muitas coisas provenientes do mercado. Estavam intactas, pensei como seria bom alguém vir aqui, pegar e distribuir essa vasta quantidade de alimentos para sobreviventes, mas logo tudo virará cinzas e nada restará. Decidimos nos dividir entre os corredores para checar tudo antes de chegarmos na porta dos fundos, onde entramos no começo. Fui pelo meio, Oliver pela direita e João no corredor do canto.

O Silêncio reinou no lugar, depois que nos separamos. Escutava apenas o barulho da minha respiração acelerada pelo frio e pelo medo. A cada passo uma sensação diferente, apontei minha arma para todos os lados sem saber o que me esperava naquela escuridão maléfica. Em meio a calada, veio em minhas lembranças o que meu primo dissera. Eles tentariam atacar as naves, e para isso teriam que destruir os Zoens na terra, mas e a abdução? Ele não comentou nada comigo, será que não sabem nada sobre, ou não acharam nenhuma pista do que pode ser? Lembro-me que o ser fica estendido com os braços para cima e se rebatendo como se estivesse tendo uma convulsão e em seguida e sugado para cima e desaparece no céu. Logo depois a trombeta é escutada e as esferas começam a cair. Se não me engano apenas a primeira vez que as esferas caíram que não seguiu essa regra, mas depois, sempre que as luzes desciam as esferas caiam. Existe uma ligação da nuvem de sangue com as abduções? Se conseguirem descobrir isso, pode ser que haja um meio de entrar nas naves sem usar um confronto direto. Subir sobre a luz e consequentemente entrar onde os Zoens são sugados, seria arriscado, mas...

Livro I - Nuvens de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora