Impacto

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05 de Julho, uma hora antes do incidente

As nuvens, gosto de observar. Olhar para elas me traz calma, mesmo que elas ainda tenham está cor, um cinzento morto. Lembro-me bem de quando olhava este mesmo céu, entretanto abaixo das nuvens do interior. Onde a imensidão era realmente azul e as nuvens pareciam, por fim, bolotas de algodão flutuantes. Não gosto nem mesmo do ar daqui, ar pesado. Sinto falta não só das nuvens, mas falta de correr pelo campo e sentir a grama salpicada de sereno escorrer pelos meus dedos. Hoje está completando um ano que estou em São Paulo. Trabalhar e estudar ainda é uma rotina cansativa para mim, conviver em um mar de pessoas ainda é motivo de exaustão em minha vida.

Pendurava a cabeça para trás olhando o céu, e me lembrando de muita coisa boa que vivi com meu pai. Meus pais tiveram seu casamento destruído há quase dez anos. Morei com meu pai por oito anos, só eu e ele. Tenho um forte laço com ele, mas tive que deixá-lo no Interior, a faculdade me obrigou. Agora faço companhia para minha mãe que mesmo não casando tem dois guarda-costas assustadoramente ciumentos, meus irmãos Leonardo e Clarice. Léo tem dezesseis anos, magricela, cabelos negros armados, pálido por falta de sol em sua pele e reservado, muito reservado. Gosta de rock pesado e vive com seus fones de ouvido em suas orelhas desligando-se do mundo em sua volta. Diferente de Clarice, que prefere usar roupas leves e músicas do mesmo estilo. Seus cabelos da mesma cor dos de Léo fora mais longos antes dela ter acidentalmente cortado mais do que devia, hoje ele está sobre seu ombro. Gosto do sorriso dela, aqueles aparelhos em seus dentes sempre coloridos chega ser engraçado. Reparando no tempo que perdi longe dos dois e de minha mãe me traz um ar de sofrimento. Não vi muita coisa passar pela vida dos três, e fui egoísta o suficiente de quase não visitá-los. Mas o que importa é que agora estou aqui e não irei mais deixá-los.

Eles estavam ao meu lado sentados, entediados como eu. Estávamos há mais de uma hora na estação de trem de Pinheiros, esperando nosso pai que vinha passar alguns dias conosco, aproveitar está época agitada de Copa do Mundo. Não gosto de Futebol, pareço ser um dos únicos que não glorifica a seleção Brasileira. Apenas não coloco minha fé que eles ganharão algo, definitivamente não ganharão, então sobrevivo em meio a um mar de gente vestidos de verde e amarelo. Enquanto eu, estou com meus jeans surrados, meu tênis casual e minha camiseta estampada com um desenho aleatório que gostei e comprei, tapada pela minha jaqueta de couro azul. Sou assim, desinteressado com o cotidiano.

– Nicolas, quanto tempo mais esperaremos? - Escutei a voz melancólica de Léo em meio aos meus pensamentos avoaçados.

– Tire os fones de ouvido para conversarmos. - O repreendi e puxei seus fones, completei. - O Pai avisou que estava um trânsito infernal na BR, então vamos esperar mais um pouco, tudo bem para vocês?

– Para mim tudo bem, trouxe meu livro para ler. - Indagou Clarice, voltei a pendurar minha cabeça e olhar para o céu, enquanto meu irmão se trancou novamente em seu mundo torcendo o lábio.

Espero que meu pai não demore, estou com saudades. Somos tão parecidos, parceiros. Minha tatuagem é em sua homenagem, uma coroa grande destacada nas costas de minha mão. Vivi muita coisa com meu velho, passamos por muita coisa juntos e hoje ele está morando só. Toda vez que penso nisto me dói. Mas assim que me formar, voltarei para perto dele. Amo minha querida mãe, mas ela já tem meus irmãos, e nestes meus vinte e um anos vividos, metade foi junto ao meu pai.

Olhei para o lado e a estação estava movimentada, como sempre. Mas pouco para um dia de sábado, talvez por ainda ser onze da manhã. Não, alguma coisa está diferente. O ar frio me incomoda, o céu escuro em uma manhã de sábado também. Que tédio...

– Vou ao banheiro, quer ir junto Léo? - Ele ao menos escutou, estava respondendo mensagens em seu celular.

– Pode ir Nicolas, esperaremos aqui! - Clarice respondeu no lugar de Léo.

Livro I - Nuvens de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora