O Efeito Bumerangue - V

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No dia seguinte, Basílio encontrava-se ansioso. Aguardava o laudo do legista como uma criança que espera um presente de Natal. Mas Papai Noel só apareceu no final da tarde.

— Meu caro Douglas, até que enfim.

— Não podem imaginar o que matou João Gouveia.

— O quê? Arsênico? Cianeto de Potássio?

Madeira também arriscou:

— Estricnina?

Douglas sorriu:

— Ficaria muito menos surpreso se tivesse sido um desses. Isso restringiria a lista de suspeitos, pois não se compra arsênico ou cianeto na farmácia.

— Mas que tipo de veneno foi, afinal?

— Nenhum!

— Nenhum? Será que Deus ouviu minhas preces, então? Ele não foi assassinado?

— Muito pelo contrário. Acredito que foi sim!

— Mas se não havia veneno...

— Não havia veneno. Mas havia outra coisa! Conhecem o CH3CO2C6H4CO2H?

— Não!

— Acido acetilsalicílico?

— Também não.

— E que tal simplesmente aspirina, conhecem?

Basílio mostrou-se incrédulo:

— Aspirina? E desde quando aspirina mata?

— Há casos de superdosagem, evidentemente, que os exames demonstraram não ser o caso.

— Então como pode ter sido aspirina?

— Algo inusitado, delegado. Não encontrei veneno algum no corpo, apenas aspirina, além de bebida alcoólica. Como já tinha ouvido falar de pessoas alérgicas a esse ácido, procurei um alergista, que me disse: "O acetilsalicílico é capaz de produzir enorme gama de reações alérgicas, entre eles o edema de glote". Um simples grão pode ser fatal, mas é algo raríssimo.

— Isso é incrível! Nunca ouvi falar. E quanto tempo após a administração para fazer efeito?

— Em geral para medicamentos é imediato, mas pode levar até 1 hora. Contudo, pelo estado de João foi instantâneo.

— Meu Deus!, o mesmo que engolir arsênico, mas mesmo assim, não estaríamos diante de um caso acidental? Ele pode ter tomado aspirina para uma simples dor de cabeça.

— Duvido. Pela idade que tinha, 46, não é possível que nunca tenha sofrido um evento de crise alérgica. Deve ter acontecido e sobreviveu, não tomaria de novo.

— E como foi administrado?

— Pelo copo! Havia aspirina diluída num dos copos examinados.

— E no outro?

— Nada! Nada também na garrafa e muito menos nos cubos de gelo.

Basílio pensou um pouco:

— Então a aspirina foi colocada diretamente no copo...

— É o que tudo indica.

—E só pode ter sido após João ter preparado os drinks, por alguém que estava com ele, fato que os dois coposparecem confirmar. Tem ideia da quantidade?

— Tenho. Um comprimido para adulto em geral tem 500 mg. Pelo o que encontrei acredito que não tenha sido mais do que 100 mg, o suficiente porém para a crise alérgica.

QUATRO VEZES O INESPERADOOnde histórias criam vida. Descubra agora