— Uau, Sally é insuportavelmente chata. — Me parabenizo por dizer óbvio.
Sabrina uma vez me disse que se eu fosse um animal, seria um cachorro. Ou um leão, mas gosto do cachorro. Leal, extremamente leal.
Eu amo estar com meus amigos. Não amo estar com Harry, mas é agradável assistir trabalhar e reclamar sobre futebol. Pouco passa das 16h e o Doc Ponds já não tem tantas mesas ocupadas, metade do barulho se resume a Sally gritando na cozinha.
— Você come algo que não seja batata frita ou hambúrguer? — Cruzou os braços, o pano branco nos ombros contrastava com as roupas escuras.
— Esse é o meu primeiro prato, você é muito chato.
— E você tem que se alimentar melhor, Sam. — O barulho estridente nos prende a atenção.
Aquele rosto é familiar. Sim, é Josh, o garoto do resort. Seus cílios grossos examinam o local e pairam sobre mim, ele caminha em minha direção e por algum motivo não me incomoda, apenas aceno simpática.
— Oh, você! — O canto dos lábios se elevam, ele é como um filhote de cachorro. — Decidiu mesmo ficar por Stowe?
— Vocês se conhecem? — Harry franziu o cenho.
— Sim, ele me ajudou. — Murmurei para que calasse a boca. — Obrigada, Josh! Aquele casaco foi a melhor compra do século.
Há uma tensão no ar, ou uma confusão, não sei. Josh intercala um sorriso confuso entre eu e Harry, há curiosidade estampada nas sobrancelhas arqueadas.
Harry tem um interrogatório na cabeça. Eu não vou responder nada. Sou um túmulo.
Um túmulo com fome.
— E o que está achando?
Harry parece se incomodar: ele revira os olhos e dá a volta, entra na cozinha e em questão de segundos estou sozinha com aquele garoto que mais parece um projeto de Golden Retriever.
— Honestamente?
— Horrível. — Cruzo os braços, Josh dá risada. — É sério.
— Não sabia que conhecia Styles.
— Você não parece gostar dele.
— Não é isso. — Seu tom de voz muda, ele entra na defensiva.
Ele não está disposto a falar sobre, agora ele não é como um Golden, é mais como um Pastor Alemão nervoso. Instintivamente recuou os ombros, concentrou nos movimentos pouco visíveis de Harry pela cozinha.
— É como uma narrativa de vilão e mocinho? Se for, eu não quero estar no meio. — Ajeito a postura, ele mantém o mesmo semblante.
— Você tem uma queda por esse tipo de história? Tomar lados é perigoso.
— É por isso que eu não quero estar no meio do problema de vocês. Eu achei que dizer que não dou a mínima seria muito rude. — Pisquei, o garoto sorri de canto.
Odeio sorrisos de canto.
— Gosto da sua sinceridade.
Harry aparece com um hambúrguer sem queijo e uma quantidade absurda de tomate. Ele coloca o prato na frente de Josh e sua expressão já não é tão raivosa, parece até indiferente. O garoto do meu lado não agradece, mas joga ketchup no lanche inteiro e aquilo me deixa apavorada.
Não tem ninguém normal nesse lugar. Stowe é pavorosa.
— Você quer? — O ruivo oferece, nego rápido.
— Harry, consegue tirar seu carro? Preciso ir. — Invento uma desculpa qualquer.
— Hm? Não entendi.
— Se você soubesse estacionar direito isso não aconteceria, você me fechou! — Tento demonstrar com o olhar para ele se tocar e entrar na história.
Honestamente, Harry é idiota como uma porta.
— Oh, claro. Vamos, vamos tirar o carro.
Tinha de admitir, Harry era bonito. O tipo de pessoa que não precisa se esforçar: sua beleza é como crime. Sua beleza sem dúvidas era inegável, já suas habilidades como ator... um tremendo idiota. É óbvio que Josh notou a desculpa esfarrapada para escapar, lunático obcecado por ketchup. Cílios piscaram excessivamente e o Inglês puxou o celular do bolso quando fizemos o caminho para fora do Doc Ponds.
Camadas grossas de neve dificultavam andar e meus pobres pneus carecas com certeza iam derrapar. Nem percebi quando sacou um maço de cigarros do bolso e estendeu, a embalagem amassada chamou minha atenção.
— Você não vai perguntar o motivo de eu ter te chamado aqui? — Cruzei os braços.
Eu estava doida pra arrumar uma briga.
— Você não vai conseguir calar a boca de qualquer jeito, Sam. — Piscou.
— Oh, seu tremendo babaca! — Esbravejo.
Nos entreolhamos, a gargalhada que escapou de mim foi tão verdadeira que minha bexiga apertou. Harry era um idiota, mas eu o adorava. Eu estava rindo com um homem estranho e charmoso num estacionamento, numa cidade que mais parecia o inferno.
Seus olhos comprimiram, as pupilas tão pequenas que lhe deram um ar infantil e ele passou a mão pelos cabelos.
— Ele é chato mesmo. Não preciso perguntar pra saber o motivo.
— Ele não gosta de você. — Harry assentiu.
— Eu não gosto dele também. Ele é o irmão de Mackenzie.
Oh, oh, isso diz muita coisa. Eu não estava curiosa, mas... agora estou incrivelmente curiosa, o espírito fofoqueiro que habita em mim precisa de mais informações.
— Não me diga que você deu um fora na loirinha e agora ele te odeia? Uau, isso é ridículo.
— Pois é, talvez a chatice seja de família. — Deu ombros.
— Então eu estou certa?
— Você achou que eu era o vilão? — Riu. — Ele me disse isso, que eu era um vilão. Um vilão! Esse moleque nem tem idade pra falar como a porra de um velho!
— Você é o vilão? — Sorri, caminhando em sua direção.
— Não.
— Então é o mocinho?
— Que papo idiota. Parece que estamos num filme. — Riu, o acompanhei.
— Quero assistir Rapunzel.
— Amanhã, na sua casa. — Apagou o cigarro, seus olhos brilhavam. — E não chame o Josh.
— Você é um péssimo vilão. — Pisquei. — Até amanhã, Styles. — Acenei, indo em direção ao meu carro.
— Até, Sam.
Nem eu o entendia, tampouco nossa amizade. E talvez isso fosse o que deixasse tudo especial.
Talvez esse fosse o motivo de eu estar animada para amanhã.
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Babe [H.S/PT-BR]
FanfictionOnde Samantha Whitfield foge de um casamento arranjado e reconstrói sua vida em Stowe.