A Verdadeira Face de Sofia

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Uma mão grande e calejada cobre a minha boca, abafando o grito estridente que sai dela e sinto meu corpo ser erguido do chão em seguida, me debatendo no ar com força o suficiente para desequilibrar quem quer que esteja tentando me levar embora. Não bastasse a preocupação com Nile girando na minha cabeça sem parar, agora também tenho que lidar com raptores? Meu sangue parece ferver nas minhas veias. Merda, eu só queria dormir um pouco.

–– Me... Solta! –– Resmungo, obrigando a pessoa a pousar sobre o telhado.

Caio contra as telhas que rangem alto abaixo do meu corpo e solto um grunhido de dor devido a aterrissagem nem um pouco delicada. Sem a iluminação fraca da rua, não posso ver muito além dos meus olhos. Me apoio sobre as mãos pronta para levantar mas outro grito de surpresa escapa dos meus lábios quando sinto uma mão se enroscar no meu cabelo, o puxando para que a minha cabeça se inclinasse para cima, encontrando finalmente o rosto do meu agressor.

Nunca o vi em toda a minha vida, tenho certeza. A luz fraca que vem do luar ilumina o rosto pálido e os olhos escuros do soldado cintilam na minha direção com raiva. Em seu peito está a insígnia da Divisão de Guarnição. Nada poderia ser mais confuso do que isso agora.

–– Quem é você? O que você quer? –– Resmungo, grunhindo novamente com a dor de ter o cabelo puxado.

–– Você não se lembra de mim? –– Ele sibila entre os dentes.

–– Eu deveria? –– Franzo o cenho, inclinando a cabeça a fim de o acertar na testa. Os dedos compridos se soltam dos meus fios e me levanto rápido, alcançando a faca bem escondida no cano de uma das minhas botas. –– Vamos, me diga logo o que você quer.

Ele se endireita novamente enquanto uma de suas mãos massageia as têmporas e me encara. Entretanto, dessa vez seus olhos brilham com as lágrimas que se acumulam antes de rolarem de forma silenciosa pelo seu rosto comprido. O soldado cerra os punhos ao lado do corpo.

–– Eu quero vingança.

Não tenho tempo de processar suas palavras quando ele me ataca em seguida, me levando para cada vez mais próximo da beirada do telhado a medida que desvio de seus golpes ágeis. Em um momento breve de descuido quando escuto meu nome ser chamado em algum lugar, sinto minha faca escapar entre meus dedos e minhas costas baterem contra as telhas novamente. O tilintar do metal quando atinge o chão alguns segundos depois é tudo o que escuto antes de sentir o peso do soldado sobre mim, com um joelho de cada lado do meu corpo, apontando sua própria lâmina para o meu pescoço.

Minha cabeça não sente o apoio do telhado e sei que abaixo de mim está uma queda de pelo menos dez metros. Engulo a seco, voltando a olhar para ele, com o rosto agora retorcido em raiva.

–– Você matou o meu pai, há cinco anos. –– Ele dispara, pressionando mais a lâmina fria contra a pele do meu pescoço. –– Ele era tudo o que eu tinha e você cortou a garganta dele na minha frente.

Sinto meu estômago despencar.

–– Eu não me lembro dele. –– Respondo ao homem. –– Eu não me importo se ele era seu pai ou qual era o maldito nome dele! Todos os policiais que eu matei, matei para sobreviver.

–– Ele não ia machucar você! –– Ele grita, me interrompendo. Os olhos se arregalam na direção dos meus, a mágoa estampada em contraste com a frieza que sinto emanar das minhas palavras.

–– É o que eles dizem. –– Arfo em desdém. –– Me matar não vai o trazer de volta mas se você se sente melhor com isso, vá em frente.

O homem parece surpreso por um instante e se endireita sobre mim, baixando a guarda por um instante quando abro meus braços em um gesto amplo, tateando pelo telhado longe da sua visão. Ele abre a boca para dizer algo e ergue a lâmina acima de sua cabeça no mesmo momento em que uma telha solta encontra meus dedos apressados, que se firmam ao redor dela e o acertam na cabeça com toda a força que consigo.

O Rouxinol - L. AckermanOnde histórias criam vida. Descubra agora