No Meio da Neblina

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-- Sofia! Me ajude a carregar essas caixas.

A voz estridente de Hange ecoa em meus ouvidos e me viro para a encontrar animada, caminhando até mim com alguns caixotes pequenos de madeira na mão. Os recipientes possuem várias divisórias onde frascos vazios tilintam ao se chocarem contra o carvalho escuro. Olho para a garota na minha frente enquanto ela guarda alguns lápis no bolso interno de sua jaqueta assim como um bloco de notas.

-- Ainda está com essa ideia de tentar coletar o sangue deles? -- A questiono enquanto caminhamos para o lado de fora do quartel. -- Vai evaporar em um instante!

-- Não com essas tampas. -- Ela bate a ponta do indicador contra um dos frascos e em seguida o aponta para uma carroça. -- Pode colocar ali.

Faço o que ela pede e observo os soldados no entorno preparando seus cavalos e carregando as carroças com suprimentos para a Expedição. O quartel pequeno e desajeitado de Shiganshina não tem espaço suficiente para tantos de nós e não demora até que o pátio vire uma confusão de capas verdes, burburinho de conversas e cavalos relinchando agitados com a movimentação.

-- Você está pronta? -- Pergunto a Hange, que tem uma expressão solene em seu rosto. Desde que entrou para o esquadrão de pesquisa há dois anos e todos os seus companheiros morreram em uma expedição, ela não deixou mais as muralhas. -- Sabe, nós nem vamos avançar tanto assim.

-- Está tudo bem. -- Ela força um sorriso fraco, ajeitando os óculos sobre a curva do nariz, se preparando para caminhar na direção oposta à minha. -- Se cuide, Sofia.

Apenas assento para ela, pensando comigo mesma onde foi que Mike se enfiou com nossos cavalos enquanto busco a figura alta do meu companheiro de esquadrão entre tantas outras pessoas. O encontro não muito longe e agradeço internamente ao perceber que todos estão reunidos com o Comandante do lado de fora do quartel. Uma onda imediata de alívio me acomete ao sair do meio da aglomeração de soldados.

-- Achamos que tinha se atrasado. -- Mike resmunga, passando para mim as rédeas do cavalo atrás dele.

-- Eu nunca me atraso. -- Retruco, acariciando o focinho do corcel negro, que relincha satisfeito. -- Já vamos partir?

-- Em alguns instantes. -- Keith responde, se aproximando de mim em seguida. -- Hoje fui informado que as investigações sobre os assassinatos na capital há um ano foram encerradas.

-- Encerradas? -- Mike arregala os olhos. -- Eles nem desconfiaram? Desistiram?

-- Sim. -- O Comandante sorri e afaga o topo da minha cabeça por um instante antes de se virar na direção da própria montaria. -- Nunca ninguém vai capturar o meu Rouxinol.

Sorrio diante do codinome dado a mim por ele mesmo como forma de preservar a minha identidade para o restante dos soldados do Reconhecimento. Todos conhecem o canto sutil de um rouxinol, mas poucas são as pessoas que os veem casualmente por aí. Mike balança a cabeça diante da minha postura convencida e monta em seu cavalo assim como eu, estalando as rédeas sobre o pescoço do animal e partindo na direção dos portões com o restante do pelotão atrás de nós, todos seguindo o Comandante Keith sob os olhares curiosos das pessoas de Shiganshina, colocando suas cabeças para fora das janelas, espiando a movimentação.

-- Onde está Erwin? -- Pergunto a Mike, me aproximando dele ao perceber a ausência do outro loiro.

-- Ele ficou lá atrás com uns novatos. -- Ele dá de ombros. -- Encontramos eles quando estávamos investigando o roubo de cilindros de gás no subsolo. Eram eles que estavam usando o equipamento para roubar as pessoas por lá.

Aperto as rédeas com força nas palmas das mãos, me lembrando da última noite na capital e do garoto que havia me visto cortar a garganta daquele policial. De fato, ele cumpriu com sua parte do acordo e não deu com a língua nos dentes. Mas o quanto poderia ser uma coincidência Erwin tê-lo trago para cá? Respiro fundo, tendo em mente que algo como isso não aconteceria; São outras pessoas, penso comigo mesma enquanto esperamos o portão ser aberto.

O Rouxinol - L. AckermanOnde histórias criam vida. Descubra agora