A sociedade

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A sociedade
Há pouca coisa que podemos aɹrmar a respeito da vida social dessas populações. A maioriados arqueólogos brasileiros, inspirada nos tradicionais modelos norte-americanos, considera
que elas viveriam em “bandos”, ou seja, em grupos pequenos (com no máximo duas ou três
dezenas de indivíduos), caracterizados por alta mobilidade, ausência de hierarquia, e nos
quais a única diferença signiɹcativa de status seria em função de sexo e idade. De fato, a
mobilidade pode não ter sido tão grande, particularmente nos territórios mais ricos – por
exemplo, nos ambientes marítimos ou ao longo dos principais rios. Infelizmente, não
conhecemos seus sítios nessas condições. A movimentação de matérias-primas parece ter
sido bastante ampla, com pedras trazidas de dezenas de quilômetros, e, em Lagoa Santa,
com a presença de conchas marítimas que teriam viajado centenas de quilômetros. Mas
esses produtos podem ter sido adquiridos tanto por trocas sucessivas como por viagens
realizadas por poucas pessoas, e provavelmente não refletem movimentos de populações.
Há diferenças culturais, expressas, por exemplo, pelo modo de sepultar os mortos (em
abrigos, no centro de Minas Gerais; provavelmente fora deles, no norte desse estado, ou em
Goiás), ou na forma de trabalhar a pedra: polimento em paralelo ao lascamento em certas
regiões, apenas lascamento em outras; fabricação ou não de instrumentos de tipo lesma,
utilização de percutores de madeira ou apenas de pedra para extrair lascas dos núcleos etc.
É claro que não devemos imaginar que essas diferenças pontuais reɻetem
obrigatoriamente “etnias”. É possível fabricar os mesmos instrumentos e falar línguas
diferentes ou ter conceitos religiosos opostos. Do mesmo modo, pode-se falar a mesma língua
e diferençar-se no modo de sepultar os mortos. Mas somente podemos tratar as diferenças e
semelhanças a partir dos vestígios disponíveis. Estes evidenciam uma razoável diferenciação
dos grupos – quer tenham evoluído separadamente, desenvolvendo aptidões e gostos
diferentes, quer mantivessem contatos, mas aɹrmassem sua especiɹcidade em relação aos
“outros” por meio de idiossincrasias – algumas delas arqueologicamente visíveis.
Nos capítulos seguintes, iremos apresentar a pré-história das grandes regiões brasileiras
(Sul, Oeste, Centro, Nordeste e Amazônia). Somente a Cultura Tupiguarani, que esteve
presente em várias delas, será objeto de capítulo à parte.
*AP, “antes do presente”; por convenção, o presente é o ano de 1950, em referência à
descoberta da datação por carbono-14, em 1952.

A Pré-história do BrasilOnde histórias criam vida. Descubra agora