- Na verdade, eu também não sei. Confesso que, desde o dia que te vi no mercado depois de sair do Cristal, eu não parei de pensar em você. Só que foi de um jeito ruim. Para mim, tudo não passava de uma piada de mau gosto. Como poderiam deixá-lo livre depois de tudo?
- Entendo perfeitamente...
- Por favor, deixa eu terminar antes que perca a coragem. – Ela retomou a fala – Enfim. Como havia dito dias atrás, senti muito ódio de todos me dizendo que eu deveria aceitar, que você lutou pela guarda diversas vezes e salvou a muitos. Eu simplesmente não conseguia.
"Mas os dias foram se passando e eu, bom... tive que te engolir. Comecei a refletir sobre tudo. Pensei também na situação do Leiftan. Ele era o espião, ele matou a Yhkar, era seu aliado e olha para ele agora! Uma estátua foi erguida em sua homenagem após o Sacrifício Branco, após ter lutado ao nosso lado contra você. Penso que, infelizmente, você precisou chegar a um extremo para mudar. O seu irmão foi o preço que você precisou pagar e isso não deixou de afetar a todos, incluindo a mim. Se eu continuasse a te hostilizar, estaria invalidando o sacrifício dele... Te chamei para dançar porque comecei a te ver de um jeito diferente. O momento que tivemos em Genkaku, no terraço daquele prédio com os Drafayels, me ajudou a perceber sua mudança também. E se quer saber o que eu senti na noite do baile, eu realmente gostei de estar com você. Significou algo para mim e, se você quiser, estou disposta a descobrir o quê."
Erika falou tudo de uma vez e me senti meio zonzo com tanta informação. Então eu não senti aquilo sozinho? Ela ficou me olhando esperando que eu falasse algo, mas agora eu fiquei tão assustado quanto ela ficou. Pigarreei.
- Você tem certeza disso?
- Sim. Só espero que fique claro que não firmamos compromisso algum. Vamos... ver o que acontece.
- Claro, claro. Sem compromisso, sem pressão. Entendi. - Respirei fundo. - Não me entenda mal, mas como faremos isso? – Perguntei revelando minha inexperiência no assunto. Ela parecia estar pensando por um instante.
- Que tal começarmos com um encontro?
- Um encontro? - Tentei esconder meu pânico. - Sim, ótima ideia. – Pensei por um momento – Eu preciso resolver algumas coisas antes então, pode ser daqui a dois dias? – Na verdade eu não tinha nada para resolver, mas precisava de tempo para preparar algo e principalmente, me preparar. Eu não fazia ideia do que fazer em um encontro.
- Combinado então. Daqui a dois dias. Mas onde? – Fingi ter o controle da situação e respondi:
- Amanhã te digo onde. – Falei me levantando. – Não vou mais tomar seu tempo por hoje. Boa noite, Erika. Se não conseguir te encontrar amanhã, deixarei uma mensagem debaixo da sua porta.
Ela sorriu.
- Certo, Lance. Boa noite – Erika me acompanhou até a porta e nos despedimos com um aceno.
Fui para o meu quarto fervilhando. Apesar da enrascada que o Mateus me meteu hoje com essa história de TPM, precisava de umas informações sobre esses tais encontros e ele era o mais próximo de um amigo que eu tinha no Q.G. Estava fora de questão perguntar pra Huang Hua.
Resolvi tentar dormir, mas minha mente voltava para aquela conversa reveladora com a Aengel. Várias dúvidas começaram a surgir em minha mente. Julgamentos para ser mais preciso. Eu não me sentia digno de nada daquilo, mas ainda assim queria viver esse momento. Eu não tinha certeza de como ela poderia querer tentar qualquer coisa comigo e me peguei imaginando como seria se os papéis fossem trocados. Eu perdoaria? Tomando consciência de que eram pensamentos completamente inúteis, fui dormir de uma vez por todas.
Acordei antes do nascer do sol, tomei um banho para despertar meus músculos e fui direto para a forja verificar o estado das armas que tínhamos disponíveis para analisar possíveis reparos. Fiz o relatório e guardei tudo em seu devido lugar, separando as avariadas para que Jamon pudesse ver o que podia ser reaproveitado. Segui para o salão principal na expectativa de encontrar o Mateus e para meu alívio, ele já estava comendo em um canto isolado. Escolhi o que ia comer e fui em sua direção com passos inseguros. Mateus ergueu a cabeça e me viu. Mesmo já estando em sua direção, ele fez sinal para me sentar na mesa em que estava.
- E aí, Lance? Tudo bem?
- Perfeitamente bem. – respondi. Ele levantou uma sobrancelha.
- Hum...
- Algo está te incomodando? - Perguntei enquanto me voltava para minha refeição.
- Sim... quer dizer, não. Talvez... – respondeu meio atrapalhado. Olhei para ele confuso.
- Diga de uma vez!
- Bom... Talvez não seja da minha conta mas... Você e a Erika estão juntos? – Quase me engasguei com a pergunta dele.
- O que? Por que você acha isso?
- Eu não tenho certeza e por isso estou te perguntando. Todos nós vimos vocês dançando como se não tivesse mais ninguém no salão e ontem, fui te procurar pra marcar um treino quando vi você entrar no quarto dela. – Essa não! Não era assim que queria iniciar a conversa. Organizei meus pensamentos e disse:
- Entendo. Bom, não estamos juntos se você quer saber. – O Mateus suspirou com minha resposta.
- Desculpa se minha pergunta te deixou desconfortável. Mas de qualquer forma, parece que vocês se dão bem. – Parece? Percebendo meu questionamento ele emendou – Não me leve a mal, Lance. Não vejo problema algum nisso. E no fim das contas, você não deve satisfação a mim e nem a ninguém.
- Então esse assunto é desnecessário neste momento. – disse a ele.
- Claro, você tem toda a razão. – O Mateus ficou vermelho ciente de que havia algo por trás mas resolveu mudar o assunto - Quanto ao treino que mencionei, teria um tempo?
- Você não tem nenhuma atividade pendente com a Huang Chu? – Questionei.
- Bem, eu... - Ele desviou os olhos.
- Foi o que pensei. – interrompi – Mateus, eu não quero arranjar problemas com os outros chefes de guarda. Conclua suas tarefas e depois me procure. Se eu estiver disponível, treinarmos sem problemas. – Dito isso, me levantei sem ter tido a chance de falar do assunto que eu realmente queria. Eu preciso de outra alternativa o mais rápido possível.
Tentei fazer uma lista mental de quais pessoas eu poderia perguntar sem fazer alarde.
Huang Hua - é amiga da Erika;
Karenn - além de amiga, não sabe segurar a língua;
Mateus – não deu muito certo falar com ele hoje cedo;
Aldaric – mesmo sendo lunático, é bem perspicaz;
Koori – tenho impressão que ela não me aprecia tanto;
Huang Chu – Bem... melhor deixar quieto.
Talvez algum livro na biblioteca me ajude. Com esse pensamento, fui direto na estante mais escassa: livros da Terra. Corri os olhos por cada um procurando algo promissor. Infelizmente, nenhum deles tinha o que precisava. Estava quase na saída quando vi Ofélia passar pela porta. Ela parecia apenas vagar sem um destino certo.
- Precisa de ajuda, Ofélia? – Perguntei e não obtive resposta. A garota continuou andando pela biblioteca e parou diante dos livros que eu estava vendo minutos atrás.
- Não existe fórmula para o encontro perfeito. – Ela disse sem olhar para mim.
- Como? – perguntei espantado.
- Apenas seja você mesmo. – dito isso, a menina-oráculo saiu sem dizer mais nada. Tentei alcançá-la, mas quando passei pelo arco da porta, ela já havia desaparecido.
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A Redenção do Dragão de Gelo
FanfictionDescrição: Uma história narrada pelo próprio Lance onde podemos conhecer um pouco de seus pensamentos mais profundos e inocência adquirida, que é tão pura quanto a inocência de nascença (possui referências da série ONCE UPON A TIME). ***************...