#16

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Me deito ao lado de Ana, ainda escutando o barulho da chuva forte que cai do lado de fora. Depois de minutos ou horas - não sei exatamente - virando na cama, me canso, levanto e vou até a janela. Por uma brecha aberta por mim na janela, sinto o vento gélido e úmido me atingir a cara. A paz que eu sinto é inexplicável, poderia morar naquela sensação para sempre sem pensar muito.

Saio ligeiramente da frente da fresta e vou até a mesinha de cabeceira da Ana, pego meu celular e ligo a lanterna, procuro pelo quarto um caderno ou folha qualquer e algo que escreva. Acho o estojo de Ana, pego uma caneca azul e vejo na estante de livros um caderno, abro ele pelo meio e ranco a primeira folha em branco que vejo.

Volto para a janela e começo a escrever sentindo o vento que as vezes sopra forte e as vezes mais fraco. Escuto um carro passando, depois o único barulho que resta é o da chuva e o das árvores balançando.

- O que ta fazendo? - Escuto a voz baixa e rouca de Ana.

- Nada - Respondo e inspiro uma última vez o ar gélido que é bem aceito pelos meus pulmões.

Fecho a janela e caminho até minha bolsa, guardo o papel e volto para a cama.

...

Chego em casa já é quase meio dia, encontro minha mãe sentada no sofá e me surpreendo com o fato dela estar em casa esse horário.

- Alice aonde você tava? - Ela pergunta séria, sem deixar aparente nem um sentimento.

- Com a Ana, por que? - Pergunto pondo minha mochila encima do sofá.

- Alice, você tem celular? - Ela pergunta se levantando.

- Tenho? - Respondo tentando entender aonde aquela conversa chegará.

- Então por que você não atende? - Ela pergunta cruzando os braços e me olhando séria.

- Desculpa, eu mal lembrei de por o celular para carregar, próxima vez juro que te atendo - Me explico.

Pego então minha mochila de volta, dou as costa e quando começo a caminhar em direção ao corredor, minha mãe volta a falar.

- Próxima vez? Não vai ter próxima vez Alice! - Ela fala calma.

- Por que? Não! - Respondo quase gritando - Mãe, por favor... - Peço choramingando e deixo minha mochila cair no chão e enquanto junto as mãos em súplica.

- Nós tínhamos um combinado Alice - Ela fala séria - Você poderia vir morar comigo, desde que se dedicasse aos estudos e fizesse terapia.

- Eu vou pra terapia te prometo e minhas notas estão ótimas. Eu tô bem aqui, ainda não tive nem uma crise de ansiedade, nem nada e eu estou fazendo amigos e... - Tento argumentar.

- Alice! - Minha mãe exclama meu nome irritada - Você vem me dando desculpas para não ir as consultas desde que chegou, ansiedade não é brincadeira... Meu deus, Alice! Você tinha crises de ansiedade quase diárias e agora acha que tudo passou - Minha mãe fala quase gritando - Nós tínhamos dois combinados e nem um deles era um demônio - Ela fala.

Um silêncio então se instaura na sala de casa, minha mãe começa a andar de um lado para o outro pensativa, fico ali parada na entrada do corredor e quando começo a me abaixar para pegar minha mochila e seguir o trajeto curto até meu quarto, minha mãe para e então se vira de frente para mim.

- Vou ligar para o seu pai - Ela fala simplesmente e se afasta indo em direção a cozinha.

- Mãe... Mãe... Mãe! - A chamo até final me olhar.

- Vá para o seu quarto e arrume tudo - Ela fala séria.

- Por favor mãe, não quero ir - Sinto meus olhos encherem de lágrimas.

- Arruma as suas coisas, não precisa ficar preocupada - Ela fala seguindo o trajeto que logo me faz perde-lá de vista.

Me encosto na parede do corredor e deslizo até o chão, sinto o choro iminente se aproximar e me entrego a ele sem pudor, fico por minutos ou horas ali até finalmente me levantar e ir para o quarto. Arrumo algumas coisas e então me jogo na cama, como não tenho mais forças para chorar fico observando o teto e compondo uma música na minha cabeça. Quando acho que não vou mais chorar, começo a pensar em como vai ser voltar a morar com meu pai e entro em uma crise de ansiedade, sinto meu corpo inteiro tremendo, não consigo controlar meus pensamentos e eles vem em diversos flashes, minha respiração fica pesada e os minutos parecem eternidades.

Mas eles são eternidades, não é isso que Hazel diz? "Alguns infinitos são maiores que outros", bom meus infinitos são sobre tempo. Eu realmente não sei, sinto o mundo todo desabar e derrepente passa, a sensação de respiração pesada passa, os flashes param e tudo parece normal, então eu me levanto, caminho até a janela do meu quarto e fico ali observando a rua e derrepente volto a pensar demais e a sensação da respiração pesada de três minutos atrás volta, eu não consigo me mover, meu corpo inteiro volta a tremer e eu simplesmente tento focar em algo que não sejam os meus pensamentos.

E então tudo se repete por diversas e diversas vezes, a ansiedade vem e ficava por alguns minutos, então ela se esconde e me fez acreditar que foi embora e para então voltar e me pega desprevenida outra vez.

...

Uma dor de cabeça dilacerante, sinto que vou morrer, meu nariz dói, minha cabeça dói, meu peito dói e minha alma é o que mais dói. Me levanto da cama e caminho até o banheiro, me olho no espelho e estou horrível, parece que estou com alguma gripe que vai me matar em pouco mais de três dias.

Entro no chuveiro e demoro o máximo que consigo, desligo o chuveiro me visto com um roupão de banho e vou para a cama. Pego meu notebook, coloco uma melodia aleatória e começo a encaixar algumas frases, até montar uma música nova e autoral.

Estou escrevendo quando escuto alguém bater na porta, respiro fundo e me levanto, pauso a música e acendo a luz do quarto antes de abrir a porta.

- Seu pai está vindo - A voz de minha mãe se faz presente.

Fico em silêncio, vou até minha cama e começo a arrumar as coisas que deixei por último, guardo tudo e então começo a levar as malas para a sala, enquanto minha mãe fica me observando em silêncio ainda dentro do meu quarto ou ex quarto.

Quando já está tudo na sala, vou para o quartinho do Nicolas e o vejo sentado no berço brincando com um elefantinho, assim que ele me vê abre um sorriso banguela e gargalha.

- Nick... - Deposito um beijo na sua testa.

Ele me estende o elefantinho me oferecendo, eu pego e começo a brincar com ele.

- Sabe uma coisa? - Pergunto mesmo sabendo que ele não está entendendo nada - Eu queria poder te ver crescer de pertinho - Falo e largo o elefantinho do lado.

Pego Nicolas no colo e começo balança-lo, enquanto converso com ele e explico o que está acontecendo, mesmo sabendo que ele jamais vai me entender.

Nossa Última Noite (Romance Safico)Onde histórias criam vida. Descubra agora