A noite aos poucos desponta no céu, sei que estão me procurando e me recuso a ir, mesmo sabendo que não tenho muita escolha.
- Quer uma carona? - Beatrice oferece.
Penso em negar, mas quando olho no relógio eletrônico no seu braço e vejo que já são quase 18 horas, aceito a carona. Sou deixada no portão do prédio, me dispesso de Beatrice e entro.
- Boa tarde senhorita Alice - O porteiro me cumprimenta com um sorriso simpático.
- Boa tarde seu Nero - Suspiro ao responde e aperto o botão do elevador torcendo para demorar - Interfona para a minha mãe, diz que eu tô subindo - Falo e vejo a porta do elevador se abrir.
Um senhor que eu vi algumas vezes pelo prédio, sai do elevador e então eu entro, aperto o botão que dá ao andar da minha mãe e fico vendo os números aumentarem aos poucos. Penso em como poderia explica-la o que aconteceu, talvez dizer toda a verdade seja melhor que qualquer mentira... Quando a porta se abre, me deparo com minha mãe em frente ao elevador, séria e com os olhos vermelhos e enchados, dava para ver que avia chorado muito.
- Aonde você se meteu? - Ela pergunta séria.
Engulo em seco e fico parada dentro do elevador olhando para ela.
- Eu... - Parei para pensar.
Ela respira fundo e me olha séria.
- Vou te escutar - Ela fala e rapidamente estica a mão impedindo que a porta do elevador se feche.
Engulo em seco e saio do elevador, andamos em silêncio até em casa, a porta é aberta por ela e eu entro primeiro, ela entra depois e nós andamos até a sala. Ela se senta no sofá e me olha séria, me sento no outro sofá e fico olhando para o chão.
- Eu sei que errei - Falo - Eu só queria ver a Ana uma última vez... - Falo e fico em silêncio.
O silêncio durou uma eternidade, depois de segundos, minutos, horas... Não consigo saber, finalmente minha mãe começa a falar.
- Você mentiu para o Alicio, fugiu do posto de gasolina, sumiu por mais de 4 horas... - Ele se encosta no encosto do sofá e suspira, finalmente olhando para mim - Nos deixou preocupados, EU ACHEI QUE VOCÊ TINHA SIDO SEQUESTRADA! - Ela fala alto e com um tom desesperado na voz e então o silêncio volta.
- Desculpa - Peço arrependida.
- Por que você fugiu?
- Eu não sei... - Finalmente falo - Eu tenho medo de voltar para o meu pai, eu queria me despedir da Ana... - Ela me interrompe.
- Ana? Alice, o que você tem com essa Ana? - Minha mãe pergunta séria - Você gosta dela?
- Claro! - Respondo sem exitar - Não tem como não gostar, ela é minha melhor amiga - Desvio da resposta esperada.
Minha mãe respira fundo e cobre o rosto com as mãos, jogando a cabeça para trás.
- Como você pode ser tão parecida comigo? - Ela pergunta tirando as mãos do rosto.
Sinto um fundinho de graça em sua fala, mesmo assim continuo quieta com a cabeça baixa, segurando um choro insistente.
- Olha pra mim - Ela pede de forma séria.
Ergo meu rosto e olho para ela, seu rosto continua impassível.
- Você vai voltar para a casa - Ela fala - Mas vou marcar para você uma consulta psiquiátrica para amanhã, também quero que traga a Ana aqui para conversarmos.
Ela fala e se levanta caminhando para a cozinha, me levanto e vou atrás dela.
- Mãe você não vai conversar com a Ana - Falo a seguindo até a cozinha.
- Por que não? Eu quero conhecê-la melhor.
- Por que a gente não tem nada! - Afirmo - Não passamos de amigas.
- Amigas? - Ela me olha como se disse "conta outra".
- Sim mãe, e se continuar pela Ana, nunca passaremos disso! - Afirmo e saio da cozinha caminhando rapidamente até meu quarto.
Assim que entro, vejo ele todo vazio, caminho até a cama e me jogo nela e fico olhando para o teto de gesso, todo branco.
...
Fazem dias, semana, talvez meses que eu não saio de casa a não ser para ir ao psicólogo, as aulas acabaram e teve o acampamento, embora eu já tivesse pago a viagem não fui. Também fui na casa da Ana, duas vezes nesse tempo e em nem uma delas tinha alguém lá, no início mandava mensagem para ela todos os dias esperando sua responda, que nunca veio, mas depois de um tempo vi a foto de perfil ser mudada para um senhor e concluí que ela trocou de chip, também mandei mensagem para Clarinha, diferente da irmã ela olhava as mensagens mas nunca as respondeu.
Agora estou indo mais uma vez para a consulta com o psicológico, mas diferente das outras vezes, dessa eu não vou para a casa da Ana ver se ela chegou ou para minha casa, não. Dessa vez vou sair com a Clara e o Gabriel, tentei recusar o convite mas com o nível de insistência me convenceram.
Chego na clínica, espero por alguns minutos na sala de espera, sentada sobre um sofá de couro sintético branco e observando os padrões do papel de parede. Quando finalmente o outro paciente saiu, pude entrar na sala e ver o doutor sentado em sua cadeira confortável, ao outro lado da mesa.
- Boa tarde - O doutor me cumprimentou - Como se sente?
- Boa tarde, me sinto bem - Respondo logo me sentando a sua frente.
- A semana como foi?
- Tranquila, o mesmo de sempre.
Ele anota em um pequeno bloquinho de notas e então se levanta, caminha até seu armário o abre e pega uma caixa pequena de madeira.
- Vamos fazer uma dinâmica, aqui tenho diversas imagens - Ele abre a caixa e despeja sobre a mesa diversos quadradinhos com desenhos - Vou vira-las de ponta cabeça e você vai escolher uma por vez e me contar sobre algo que te lembra, ok?
Assinto com a cabeça e então ele vira as peças uma por vez para o lado de baixo, me deixando impossibilitada de ver as imagens.
Logo após a dinâmica continuamos as conversas um pouco mais e cheguei-lhe contar sobre a saída que darei hoje, junto de meus amigos, ele disse que era um belo avanço e então logo se encerrou a consulta. Saio da clínica e vou a pé até o ponto de encontro que marquei com meus amigos.
- Lice - Clara corre e me dá um abraço assim que me vê - Meu deus, não te vejo já faz dias - Ela estala os dedos em sinal de tempo.
Sorrio e abraço Gabriel em seguida, assim que me separo dos seus braços vejo um carro encostar perto de nós, olho para Clara e ela fala que é o Uber. Entramos no carro e vamos destino ao shopping do centro.
Chegamos e vamos direto para a praça de alimentação, é quase dezesseis horas e eu ainda não comi nada além do meu café da manhã.
- Vamos comer o que? - Gabriel pergunta.
- BK - Respondo caminhando em direção ao restaurante de fast food.
Nossos pedidos são feitos e então nós nos sentamos, Clara do meu lado e Gabriel na minha frente.
- Tava no psicólogo? Como foi? - Clara pergunta curiosa.
- Tá parecendo a Júlia - Comento e ela revira os olhos - Disse que sairia com uns amigos hoje e ele me parabenizou por isso - Conto indiferente.
- Vão viajar antes do natal? - Gabriel pergunta.
- Acho que vou amanhã pra casa do meu pai - Respondo a sua pergunta - Conversaram com a Ana?
- Ela não responde nem uma mensagem minha, acho que trocou de número por que agora a foto de perfil é de um velho - Clara fala.
- Comigo a mesma coisa, com a Júlia e o com o Caio também - Gabriel continua.
Respiro fundo e então escuto o número do nosso pedido, me levanto e vou buscar.
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Nossa Última Noite (Romance Safico)
RomanceUma paixão na adolescência e uma doença com poucas chances de cura. Alice nasceu no mundo da música, com apenas 10 anos estourou e fez sucesso no país inteiro. Mas quando fez 16 anos, sem nem uma explicação, sua turnê e todos os shows que faria fora...