Capítulo 1

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Tinha cerca de vinte dias que eu estava de férias. Antes, tinha passado dois meses decidindo o que eu iria fazer, mas agora, olhando pra trás, sabia que tinha feito uma boa escolha.

Escolhi ignorar todos os meus planos de assistir séries, reler livros gastos, estudar até a madrugada ou sair com meus amigos, colegas de trabalho e meus irmãos, pra reconectar com as minhas raízes, como diz minha mãe.

Dona Sarah, a matriarca da família, nasceu no Brasil, numa cidade que não tenho ideia de qual é — os nomes são complicados de dizer — no interior de Minas Gerais.

Ela nunca teve perspectiva de sair de lá, mas isso até meu pai aparecer, perdido e a família dela o acolher.

Tempo vai, ele a pede em casamento e ela aceita, indo morar nos Estados Unidos, tendo três filhos, comigo incluso.

Nós já voltamos pra lá várias vezes, visitávamos meus avós enquanto ainda eram vivos, meus tios, primas e primos. Também pra turismo, é claro. Mamãe nunca negou as raízes de onde vinha, muito pelo contrário, sempre falava da sua terra com bom gosto.

Foi no meio de uma das conversas com ela que decidi passar o meu mês inteiro de férias lá.

— Você nunca sai de Nova Jersey, filho. É sempre aqui, você precisa viver um pouco, sabe? E lá você vai conhecer sabores novos, pessoas novas que vão te inspirar a trazer de volta pra cá e por no restaurante.

Sim, eu sou dono e chef de um restaurante. Não o único, porém. Divido-o com Peggy, minha irmã caçula e minha sous chef e meu irmão mais velho, Bucky, que nunca se deu muito bem com cozinha, mas sim com o ambiente fora dela.

Meus pais, os antigos donos — agora aposentados, fazendo uma viagem pela Grécia —, ficaram felizes quando não só um, mas os três filhos decidiram tocar o que eles tinham deixado.

E com muita justificativa, estresse acumulado e dinheiro pra gastar, eu fui.

Eu não vou saber dizer com exatidão os lugares que eu fui. Estive em praias, no meio da floresta com os os índios que são receptivos, numa Alemanha brasileira, em praias, no interior que o povo fala mais rápido do que o meu português avançado consegue dar conta. Resumindo, fui em lugares que eu nunca tinha ouvido falar.

Preciso dizer que minha mãe estava certa. Eu me sentia muito mais relaxado e renovado com tudo o que tinha visto e aprendido. No futuro, gostaria de voltar.

Na minha última semana de férias — a semana do natal e do ano novo — chegariam as duas pessoas que mais vejo nesse mundo: meus irmãos.

Era regra do restaurante que nós três não poderíamos tirar férias juntos, mas, demos um jeitinho de conseguirmos fazer dar certo pelo menos na virada do ano.

O natal eu passei sozinho mesmo, comendo macarrão com queijo enquanto passava um show de um senhor que, se não me falha a memória, chamava Roberto Carlos.

Faltando quatro dias pra virada do ano, peguei o avião que ia do Mato Grosso até o Ceará. Não, eu não decorei, só li o que estava escrito no aeroporto.

Meus últimos dias no Brasil seriam aproveitados em Fortaleza, como tinha decidido com meus irmãos. Passaríamos esses dias pulando de praia em praia, de festa em festa até que, como manda a tradição, seguissemos de branco pra praia mais famosa e mais cheia e na virada, pularíamos as sete ondas, seja lá pra quê fosse.

Ficaríamos também no mesmo hotel, mas em quartos separados. Passamos a vida inteira juntos, dormiamos quase na mesma cama — sinto muito, Peg — e nos víamos quase todos os dias, era normal que, pelo menos em algumas vezes quiséssemos ficar um pouco separados, pelo menos na hora de dormir.

Me Reencontrei Nas Suas CurvasOnde histórias criam vida. Descubra agora