Capítulo 2 - Beatrice

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Pietro

Pietro tentava colocar os negócios da famiglia nos eixos. Após a morte de seu pai, ele havia mudado muitas coisas
Ser o novo Don era algo que nunca quis, mas a tradição e a responsabilidade sempre falou mais alto. Fillipo, seu irmão, seguia não concordando com as suas atitudes e as discussões entre os dois eram eminentes.
Ele também não conseguia tirar da sua mente o fato de Beatrice estar o odiando. Desde o momento que Lucca insistiu para que ele se aproximasse da prima sem dizer realmente quem era, Pietro sabia que algo parecido com aquilo iria acontecer. Beatrice estava ferida pelas mentiras e por tudo que o maldito Moretti disse a ela.
Logo que soube onde ela estava, tentou falar e explicar a situação, mas foi expulso aos gritos. Decidiu colocar alguns de seus homens para vigiá-la, mas sua prima era astuta, mesmo sem saber que estava sendo vigiada, conseguia sair da visão dos homens de Pietro.
"- Lucca! Disse assim que atendeu o primeiro toque do aparelho que estava sobre a mesa
- Pietro, vocês estão mantendo os olhos nela? Perguntou.
- Sim, mas Beatrice mesmo sem saber que estamos a vigiando consegue de alguma maneira despistar os homens. Falou respirando fundo, pensando em quem a prima havia puxado
- Eu tenho medo que Moretti vá atrás dela e faça algum mal.
- Isso não acontecerá. Você conseguiu falar com ela?
- Não, ela sequer atende minhas ligações. Achei melhor dar um tempo para ela respirar e pensar em tudo que aconteceu com calma. Sua voz estava visivelmente triste. - Eu sei que agimos mal ao esconder a verdade dela, mas tudo foi para o seu bem.
- Em algum momento ela vai entender isso.
- Eu espero. Nos falamos depois.
- Até mais." Disse desligando o aparelho que voltou a tocar em sua mãe, ele viu que a chamada vinha de um dos homens que vigiavam Beatrice e sentiu um frio percorrer seu corpo.
"- Diga!
- Senhor perdemos a garota mais uma vez. Disse a voz ofegante e assustada do outro lado da linha"

*********


3 meses depois...

- Helena! Terra chamando Helena... Ella estalou os dedos em frente ao rosto de Beatrice a assustando. Apesar de ter passado três meses, ela ainda não conseguia responder imediatamente ao novo nome. Seu café já havia esfriado na caneca e ela havia deixado as torradas e ovos intocados no prato. - Você não vai comer de novo Helena? Assim daqui a pouco você desmaia. A sua colega de apartamento disse enquanto a olhava com recriminação. Ella era uma jovem séria, reservada e um tanto quanto mandona, mas a havia acolhido sem muitas perguntas. A mulher percebia no olhar de Beatrice que algo estava sendo escondido, mas respeitava isso.
Nesse dia, como em diversos outros, ela não havia dormido quase nada. Além dos pesadelos a perseguirem sem cessar, o nervoso pelo seu novo trabalho também a havia deixado sem sono. Beatrice, depois de finalmente conseguir legalizar seu diploma e se levantar da cama, havia conseguido um emprego, não muito bem remunerado, mas extremamente gratificante: trabalharia com refugiadas de todas as partes do mundo e principalmente aquelas vítimas de tráfico humano. Saber que as mazelas e desgraças da sua vida a haviam levado para aquele momento, aquecia um pouco o seu coração adormecido.
- Vamos, está na hora de você se apresentar as nossas meninas. Sua colega disse se levantando. Ella também trabalhava na Organização e havia sido a que conseguiu um trabalho para Beatrice. Meninas, era como a colega chamava as mulheres que estavam abrigadas.
- Vamos! Beatrice respondeu, pegando sua bolsa na cadeira ao lado e colocando seu casaco, pois já estava começando a esfriar.
Andar por aquelas ruas movimentadas sempre a deixava angustiada. A sensação de estar sendo perseguida provavelmente nunca a deixaria e Beatrice em todo o tempo olhava ao seu redor em busca DELE.
Pasquali havia voltando do inferno e aparecido na sua frente enquanto ela estava vivendo novamente um dos piores momentos da sua vida.
"Beatrice não conseguia acreditar no que estava vendo. Aquele demônio estava na sua frente sorrindo e ela precisou piscar para acreditar que aquele não era mais de seus pesadelos. Aquele maldito estava realmente na sua frente e daquela boca havia saído o apelido que lhe dava arrepios por cada parte do seu corpo. Beatrice largou o telefone no balcão e correu com toda a força que seu corpo fragilizado pela tristeza a havia permitido. Enquanto corria, sabia que ele a estava perseguindo e sua gargalhada a seguia pelas pequenas ruas do seu bairro. Assim que Beatrice virou a esquina, viu que estava sendo encurralada. Ao tentar voltar, atrás dela Pasquali estava encostado na parede fumando um dos seus malditos cigarros caros. Beatrice percebeu que não teria escapatória no momento que outro homem se uniu ao que estava na outra ponta. Tomada de terror, mas com uma força que ela só podia deduzir que era pela sua Sobrevivência, Beatrice correu rumo a Ricardo Pasquali, seu maior pesadelo. Ele era apenas um, enquanto na outra ponta eram dois que a aguardavam. Beatrice sentiu o exato momento que sua pele queimou mediante ao aperto da mão nojenta daquele homem e com uma força descomunal, conseguiu, enquanto seu corpo era puxado de encontro ao dele, acertar a cabeça no nariz do desgraçado. Foi o golpe quase perfeito, se ele a tivesse soltado.
- Sua maldita! Ele tentando desferir um tapa em seu rosto. Beatrice sentiu a cabeça latejar e suas vistas escurecerem por um momento se lembrando daquela sensação de anos atrás, porém antes que ele a acertasse, Beatrice desviou e acertou com toda a sua força, o meio das pernas do sujeito vendo com satisfação ele se contorcer e a soltar. Sem esperar, Beatrice correu.
As palavras de Enrico vinham em sua mente: Não tente lutar com o agressor, você precisa apenas saber como se soltar! Assim que tiver espaço o suficiente, corra, corra muito.
E foi o que ela fez. Beatrice correu como nunca havia feito antes e agradeceu aos céus por conhecer cada pedaço daquele bairro. Antes que fosse alcançada pelos homens que corriam atrás dela, Beatrice desviou dos carros e entrou em um beco que era praticamente imperceptível. Um certo dia, enquanto voltava para a casa da tia, ela quase morreu de susto ao ver uma criança sair dali. Beatrice havia passado várias vezes por aquela local e nunca havia percebido a passagem que tinha. Foi assim que, com as relvas das paredes a cobrindo e tampando sua boca com a mão para que eles não ouvissem nem mesmo sua respiração, Beatrice conseguiu escapar. Ao ouvir eles passarem por ela, seu corpo tremeu e a vontade de gritar era imensa, mas suspirou aliviada ao perceber que não seria encontrada naquele momento. Depois de doze horas naquele lugar e ter a certeza de que eles não estavam mais ali, Beatrice correu rumo a sua nova vida. Uma vida sem cor, sem brilho... Mas ainda assim, uma vida."
- Helena! Corre! Ella a gritou enquanto desesperada dava sinal para o ônibus parar. Elas correram para o canto mais vazio e conversaram sobre como seria o primeiro dia de Beatrice naquele lugar. Assim que chegaram até o prédio, Beatrice sentiu seu estômago se revirar enquanto respirava fundo. Ela queria dar seu melhor e mudar a vida de algumas meninas com seu trabalho.
- Bom dia minhas meninas! Ella disse em inglês e espanhol. Beatrice estava ainda com dificuldades no inglês, já que ela nunca havia praticado, por mais que soubesse falar um pouco. Ela olhou para aquelas mulheres, algumas mantinham a cabeça levantada, outras as mantinham abaixadas e muitas pareciam perdidas dentro de si. Começaram o trabalho de apresentação e Beatrice viu que haviam tantas, mas tantas histórias diferentes que ela poderia ficar horas a fio ouvindo. Enquanto conversava com as meninas, percebia que seus próprios problemas não a atormentavam e se sentiu aliviada por isso.
No final do dia, exausta, mas extremamente satisfeita, Beatrice e Ella foram embora para a casa. Elas queriam descansar, mas Beatrice internamente gostaria de ter ficado naquele lugar. Sua casa era fria, silenciosa e escura.
- Quando ele volta Helena? Ella perguntou a despertando mais uma vez dos seus pensamentos.
- Ele disse que amanhã.
- Achei engraçado ele ter te deixado por dois dias inteiros sozinha.
- Ele sabe que eu estou melhor.
- Sabe, mas que ele é super protetor, isso é. Ella disse sorrindo enquanto abria a porta do apartamento. Naquela noite pediram uma pizza e Beatrice tomou uma garrafa inteira de vinho sozinha. Sim, era um hábito ruim que havia adquirido nos últimos meses, mas o álcool ajudava um pouco as vozes da sua cabeça se calarem.
Chegou um ponto inevitável em que a noite a sufocava e ela foi para o quarto rezando para que um pouco dos seus pesadelos fossem embora.
Beatrice então tomou um banho e pegou um livro. Aquele livro a acompanhava já tinha três meses, ela nunca conseguia se concentrar o suficiente para lê-lo. Enquanto via as palavras ali, sem realmente enxergá-las, sua mente ia uma e outra vez para aqueles dias. Tudo havia desmoronado em sua cabeça e de uma só vez ela havia perdido o homem que amava, a filha que havia adotado com seu coração, a sua irmã de alma, toda a sua história de vida e do seu passado.
Beatrice olhava a parede, aquela que não continha nenhum retrato, nenhuma memória. Era vazia como sua alma. Desde o momento que correu, há tres meses atrás, sabia que mais uma vez sua vida iria mudar. Ela só não imaginava o quão doloroso seria estar ali e esquecer de si mesma nesse processo.
Seu coração sangrava e sua alma estava quebrada em tantos pedaços que ela se perguntava se algum dia seria capaz de emenda-los.
Não existia nenhum objeto pessoal seu naquele lugar. Suas fotos, as fotos das pessoas que amava, fora tudo apagado desde momento que assumiu a identidade de Helena Alves Silva. Uma brasileira, filha do subúrbio do Rio de Janeiro que havia se mudado para os Estados Unidos afim de conquistar um vida melhor. Beatrice Vacchiano Grecco havia morrido, junto com toda a mentira do seu passado. Nesse momento ela repetia a história dos seus pais: um novo país, uma nova identidade, um passado forjado.
Suas fotos, sua história, suas experiências não cabiam nessa nova vida.
Uma lágrima escorreu pelo seu rosto, seguida de outra e mais outra. Os soluços sofregos começaram a surgir enquanto ela entendia que aquela vida seria a sua. A dor era intensa e por diversas vezes no silêncio da noite, Beatrice escutava uma vozinha de anjo a chamando, ou mesmo uma risada escandalosa da amiga, e o que a rasgava em sua alma era o sussurro que dizia: mia Luce.
Ela foi transportada para mais um daqueles momentos que ficariam para sempre cravados em sua mente e coração.

"Beatrice comia um pedaço do seu bolo de aniversário enquanto Matteo sentado na cama assistia um vídeo no celular com Aurora no colo, a forma como ele havia aproximado da filha a surpreendia cada vez mais, aquilo deixava o seu coração repleto de felicidade. Ela olhou para o anel em seu dedo, o diamante de tamanho generoso reluzia.
- É lindo não é? Perguntou a Giovanna que acabara de sair do banheiro e se sentava ao seu lado no sofá que havia ali
- Sem dúvida um dos mais lindos que já vi. Disse sorrindo.
- Seu irmão tem muito bom gosto.
- Claro que tem, ele escolheu você.
- Boba. Disse a empurrando com ombro e dando um risada
- Você é importante demais para mim, não sabe o quanto estou feliz por saber que vai ficar na minha vida para sempre. Eu sempre quis ter uma irmã sabe, e agora eu tenho você. Falou tomando a mão de Beatrice e olhando em seus que estavam marejados pelas lágrimas.
- Eu te amo Gio. Disse a abraçando. - Obrigado por tudo. Disse com a voz embargada pela emoção
- Eu também te amo, e não chora pelo amor de Deus. Hoje é um dia feliz. Disse pegando o prato com o bolo que Bea havia deixado sobre uma mesinha
- Amore mio podemos ir para casa? Matteo se aproximou com Aurora no colo.
- Você tá chorando Bea? Perguntou Aurora. - Você tá triste?
- E choro de felicidade meu amor. Disse a pegando do colo de Matteo. - Podemos sim amore mio."
As lembranças torturavam a mente de Beatrice a impedindo de dormir, por mais que quisesse deixar tudo para trás, os momentos felizes vinham em enxurradas na sua memoria, momentos os quais nunca mais poderia viver. Ela se levantou da cama em busca do seu fone de ouvido para ver ouvir uma musica e ver se o sono surgia. Ao abrir a gaveta da cômoda viu aquele anel que insistia em guardar, um nó se formou em sua garganta, ela pegou os fones e fechou a gaveta rapidamente.
Enquanto colocava uma música, percebeu que ela dizia o que sentia sua alma.

" Agora não posso conter meu choro,
Minhas lágrimas me afogaram
E eu me recusou a acreditar
O que resta a minha volta, é tão escuro
E eu estou sozinho aqui
Para juntar os pedaços do meu coração "

A saudade que ela sentia deles a atormentava, ela havia criado um perfil fake no Instagram e seguido Giovanna na esperança dela postar algo, mas nesses três meses Giovanna não havia postado nada, Beatrice achava estranho pois a amiga era uma amante de fotos e rede sociais. Ela entrou no perfil Alex e viu que a última foto que ele havia postado era dos três juntos, havia passado três meses e o amigo não havia apagado nenhuma foto que tinha com ela. Beatrice se perguntava se Giovanna havia contado o que aconteceu a ele. Ver aquelas fotos e ouvir aquela música fez com que Beatrice chorasse até que o sono a abraçasse em conforto.

"Beatrice estava sendo perseguida, mais uma vez. Mas haviam vários homens a seguindo. Pietro, com seus olhos azuis dizia que ela pertencia a sua família e que por isso, ela deveria ir com ele. Pasquali gargalhava enquanto via o medo em seu olhar e aquele som enviava arrepios pelo seu corpo e no meio dos dois, olhos negros como a noite se destacavam enquanto lançava adagas de fogo por seu corpo e dizia: seu sangue destruiu a minha vida! Eu te odeio!"

Desesperada Beatrice gritou, pulando da cama enquanto seu corpo inteiro estava tomado de suor. O ar parecia lhe faltar enquanto as lágrimas continuavam em torrentes pelo seu rosto.
- Shiii, estou aqui. Acalme-se. Ela ouviu uma voz familiar em seu ouvido e um corpo forte e acolhedor a abraçar. Minutos se passaram até que sua respiração se tranquilizasse e assim que Beatrice conseguiu focar os olhos, encontrou aquele olhar tão familiar a observando.
- Lu... Lucca.
- Estou aqui, fique calma. Ele disse enxugando suas lágrimas e lhe entregando uma caneca com algum tipo de bebida quente.
- Obrigada. Ela sussurrou enquanto levava o líquido a boca.
- Ella me deixou entrar, eu queria fazer uma surpresa... Seu amigo disse enquanto olhava para baixo.
- Tudo bem, não se preocupe em explicar. Fico feliz que tenha chegado bem da sua viagem.
- Sim... Foi tudo bem. Irei para meu apartamento agora, a deixarei acordar direito. Mais tarde conversamos sobre seu primeiro dia de trabalho.
- Tudo bem. Lucca! Ela chamou o amigo enquanto ele abria a porta. - Obrigada.
- Não tem o que agradecer Bea. Ele disse sorrindo enquanto batia a porta.

Continua...

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