Capítulo 1

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"Às vezes, morto é melhor."

– Stephen King, Pet Sematary –



O que o despertou foi um terremoto. Não um tremor qualquer, mas um cataclismo que pôde ser sentido do outro lado do planeta. Também não seria correto denominar como 'despertar' o que lhe aconteceu; melhor referir-se àquilo como um 'renascer'. Sim, foi isso. Ele nasceu de novo para aquele mundo.

O epicentro do abalo não poderia ter sido muito longe, ou não teria tido poder o suficiente para penetrar naquela vastidão fantasmagórica, nem tão perto, o que, sem dúvida, por mais formidável que fosse a titânica estrutura onde se encontrava, poderia tê-la obliterado como dois asteroides que se chocam.

Num segundo ele não existia (ou não sabia existir), no instante seguinte, todo o frio e o medo do desconhecido que nos faz chorar ao sermos trazidos à vida o tomavam numa pavorosa e frustrada tentativa de adaptação ao tudo e o nada à sua volta.

E então, como um recém-nascido, ele chorou.

Da mesma maneira, precisou acostumar-se com sua nova e frágil condição na existência, adaptar seus pulmões (Sim, havia pulmões, e um coração que conseguia sentir batendo em sua têmpora esquerda e, se havia uma cabeça, havia um cérebro, um que parecia prestes a explodir!) à pressão fora do ventre que o continha e fazê-los trabalhar de modo que não o deixassem sufocar.

Acabou sendo tão natural quanto com qualquer vida conhecida. Em segundos ele tinha algo que se poderia chamar de subconsciência e ela o permitia respirar sem que tivesse de ordenar que seu corpo o fizesse. Contudo, como toda nova vida, aquela não vinha dotada de raciocínios complexos, apenas dos mais básicos instintos.

Eis o que o ser sabia: Havia nascido de lugar nenhum, aprendido a respirar e a controlar o que ainda não fazia ideia ser sua mente o bastante para poder mover o que logo descobriria ser seu tronco.

Se ele era cego, não tinha conhecimento do fato, porque não imaginava o que era o escuro. Podia ser que apenas existisse no infinito vazio. Mas poderia o nada ser tão denso? A imagem que sua mente tentou criar (ela conseguia fazer isso?) não tinha significado, o seu cérebro era um quadro em branco.

Tabula Rasa, pensou. Seu primeiro pensamento racional em vida – era um dos grandes se considerarmos que momentos atrás ele não existia! – e sequer podia cogitar o que aquilo queria dizer.

Um relâmpago de dor transpassou sua mente e, de repente, dezenas de formas surgiam e se misturavam umas às outras, depois centenas e então milhares, milhões delas! Era assustador não compreender todos aqueles flashes de figuras sem sentido, fundindo-se para se tornarem objetos que ele poderia jurar (se conhecesse o conceito de religião) jamais ter visto antes, criaturas e símbolos. Estes últimos se agrupavam e passavam a constituir coisas chamadas 'palavras'.

Densidade... Líquido... A ideia quanto ao que o envolvia voltou mais forte desta vez, conforme o ser descobria ter pernas para movê-las, mas estar suspenso, recluso, seus movimentos incertos parecendo lentos, tão lentos... É... Mel.

Agora havia um nome para o que achava o estar prendendo. Mel. Viu algo que lhe causou um novo sentimento: repulsa. No negror de sua mente, uma criatura voou em ao seu encontro. Ele soltou um arquejo (Não estava pronto para gritar ainda, mas breve, muito em breve, estaria.), um som indefinido, a reação natural ao que logo entenderia como sendo um susto e moveu as coisas que até então pendiam moles ao longo de seu corpo. Eram seus braços. Levou-os até diante do rosto, mesmo não podendo vê-los e tentou se defender da coisa voadora.

Renascido para a LoucuraOnde histórias criam vida. Descubra agora