43|alice no país das maravilhas

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Olhar-se no espelho e ver-se por completo

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Olhar-se no espelho e ver-se por completo.

Os minutos que mais duram uma eternidade na vida de uma bailarina são aqueles em que esperamos ansiosamente no camarim. O cabelo é arrumado, a maquiagem é finalizada, a roupa é vestida e as sapatilhas são calçadas. Você não tem mais nada com o que se preocupar.

Piada. É claro que você tem.

Na sua mente, você se esforça a se lembrar de cada passo. Como as sua expressão facial deve ser, como os braços não podem se alongar demais ou os deixar se perder no ar, em cada salto cronometrado para que o ritmo da música não o ultrapasse ou que você saiba retomar caso se atrase no giro, e aí se lembra de que seus ouvidos não devem procurar ouvir a plateia, mas sim se concentrar nas notas que saem do piano...preocupar-se é eufemismo perto de todas as coisas que se passam na sua cabeça.

Mas, de alguma forma no meio de toda essa confusão, você respira fundo.

Rodeada dos seus colegas de profissão, também nervosos e aflitos como você. Alguns segurando lágrimas, outros rezando e alguns com fones de ouvido procurando paz no meio de todo um caos...você, finalmente, respira fundo. Você se senta na cadeira da penteadeira, se olha no espelho com iluminação e chega a pensar que toda aquela luz poderia facilmente te deixar cega.

"Respira pelo nariz e solta pela boca", o exercício teatral de Mac vem a minha mente. No campo em Estes Park, nós corríamos, pulávamos e dançávamos até a exaustão e quando ela chegava nos deitávamos no grama e apenas..."respira pelo nariz e solta pela boca". Em frente ao espelho, é isso o que faço.

Aqueles minutos. Aqueles longos e preciosos minutos, são só meus.

Admiro a roupa de ballet azul que visto, assim como a de Alice, tenho uma espécie de avental branco na frente. Eu não sou loira, mas tenho a fita azul em meus cabelos que estão trançados. A maquiagem simples, mas elegante dão um formato angelical ao meu rosto. Não penso em mais nada e nem em ninguém porque esse momento, ele é meu.

Em dias normais, você apenas passa pelos espelhos. Você não para e observa cada detalhe do seu rosto ou, em espelhos maiores, o seu corpo. Você se olha no espelho, mas não ver-se por completo. Não observa o que está diante dele e tudo isso porque você não tem tempo. Nós corremos a vida inteira. Dizem que o tempo aprisiona as pessoas. Discordo. A falta de tempo aprisiona as pessoas. O tempo, em sua plenitude, não te aprisiona, te liberta. É em momentos em que se tem tempo, que você reflete. Momentos em que você para, se observa no espelho, se ver por inteiro e enfim entende que o tempo, na verdade, está te libertando.

Seja de coisas, pessoas, situações ou preocupações...O tempo não cura, mas ter tempo, te liberta.

Focando meus olhos em mim no espelho, no reflexo dele atrás de mim, aparece a única coisa da qual poderia me distrair nesses minutos de preocupação. Ivo adentra o camarim em passos lentos e receosos, seus olhos brilham ao me encontrarem e se focam em meu traje, mas ao encontrarem os meus olhos no espelho, as orbes parecem beirar ao incêndio. Minha boca fica seca com o olhar dele e umedeço, e com o simples ato Ivo sorri se apressando para caminhar até mim.

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