Cigarrete daydream

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N/A:  Cigarrete Daydreams - Cage the elephant.


~


– Bill, abra a porta – Neguei com a cabeça, a chave da sala havia sido guardada no meu bolso e não sairia de lá antes de conversarmos.

– Nós vamos conversar, pai, e eu espero que sejamos honestos um com o outro, talvez assim eu consiga te perdoar – Por mais que estivesse com raiva, eu tentava empurrar esses sentimentos de lado e ser racional.

– Não estou entendendo aonde quer chegar com isso – Inspirei fundo, Sr. Cipher não perdia mesmo a postura. Não sabia dizer se ele era confiante ou apenas um tremendo cara de pau.

– O que disse para Dipper? O que disse para ele depois da nossa conversa? – Trocamos um olhar duro, eu já não podia fingir que não havia um dedo dele naquela história – Eu não acredito que você teve coragem de se meter nisso...

– É para seu próprio bem – Explodi.

– É PARA MEU PRÓPRIO BEM? CASO NÃO TENHA PERCEBIDO, DIPPER É A ÚNICA PESSOA COM QUEM CONSIGO CONVERSAR – Tive que respirar por cinco segundos antes de conseguir voltar a um estado mais calmo, não que eu me sentisse assim, estava tremendo de raiva, quase não conseguia me impedir de chorar – Como isso poderia ser para meu próprio bem? Desde que minha mãe morreu...

– Não coloque a sua mãe nessa história! – Foi a vez dele de falar em um tom mais alto.

– Não dá para não fazer isso! – Apertei a ponte do nariz – Eu não estou bem, pai. Nada está bem. Então em vez de tentar consertar as coisas, você simplesmente se muda de cidade e me arrasta consigo para sua nova família nem tão perfeita assim! – Disse olhando-o nos olhos, eu sentia que estava enfiando uma faca em uma ferida que fingíamos que não existia e tudo parecia doloroso de novo – E a única coisa que não faz eu simplesmente desaparecer do dia para a noite, é o meu namorado. O único relacionamento normal que eu tenho, era com Dipper, e você simplesmente se achou no direito de tentar destruir isso, como você pensa que está fazendo algum bem com isso?

– Você não consegue ver isso ainda, mas aquele garoto não é bom para você – Meu pai disse convicto.

– E quem é? Quem é bom para mim? Me diga! Pacífica? Você? A nossa família que não existe? – Ele bateu com os punhos na mesa.

– Chega, Bill! Isso não é discutível!

– Pelo contrário, porque se não conversarmos isso agora, então não vamos conversar nunca mais. E se isso acontecer... – Fiz uma pausa para minha voz não falhar – Se isso acontecer, se não falarmos sobre isso, na primeira oportunidade que tiver, vou embora para o mais longe que puder de você e a próxima vez que chegarmos perto um do outro, um de nós vai estar em um caixão.

Nos encaramos e eu percebi que aquela era a única resposta que eu teria. Um olhar frio do meu pai. Abri a porta o mais rápido que pude e saí do escritório dele, batendo a porta atrás de mim, ouvindo o Sr. Cipher me chamar de volta. Eu não queria medir as consequências, peguei as chaves do carro dele e fui para a garagem. Não precisava de nada que não estivesse comigo, tinha meu celular, a roupa do corpo, o carro roubado do meu pai e a vontade de nunca mais voltar a vê-lo enquanto estivesse vivo. Gravity Falls também poderia ir para o inferno, mas antes eu tinha uma última coisa para fazer naquela cidade horrível.


Δ


Estacionei de qualquer jeito na calçada em frente a casa dos Pines, eu ainda não havia conseguido me acalmar completamente e sabia que isso não seria justo com Dipper quando conversasse com ele, então me forcei a clarear a mente, respirei fundo e fechei os olhos por poucos minutos. A cada segundo que se passava eu tinha mais e mais certeza que não valia a pena ter essa conversa com meu ex namorado, era pura covardia, ou então instinto de auto preservação, mas Mason também havia escolhido aquilo, por mais que meu pai pudesse ser um babaca, ele não havia colocado uma arma na cabeça de ninguém e obrigado a isso.

Engoli em seco e ouvi alguém bater de leve no carro, como quem bate em uma porta, abaixei o vidro para poder escutar o pai de Dipper.

– Faz um tempo que não o vejo por aqui – Ele sorriu – Dipper está nos fundos, vou avisar que está aqui.

– Obrigado, senhor Pines, mas... – Meu ex sogro não esperou eu terminar para ir chamar Mason.

Fiquei parado no carro, se quisesse, poderia ter ido embora, mas eu não era assim, queria colocar um ponto final nas coisas. Queria dar adeus a isso do jeito certo. Só tive coragem de sair do carro quando vi que Mason já estava na grama, olhando para mim. Deixei a chave na ignição; Eu torcia para aquilo ser rápido, como dar um puxão em um band-aid na esperança que doesse menos.

Paramos frente a frente, eu tinha que ter certeza que conseguiria ir até o fim quando começasse a falar, por isso esperei alguns instantes em silêncio.

– Por que, Pinetree? – O moreno se mexeu, eu conseguia ver que ele estava prestes a chorar.

– Não é justo... – Ele mordeu o lábio, eu começava a sentir meu rosto esquentar de novo, uma pontada de raiva ressurgindo.

– O que não é justo?

– Não era justo com você – Comprimi os lábios por um segundo, a tensão no ar era tanta que parecia se condensar em uma onda.

– O que não era justo comigo? – Dipper me olhou nos olhos sem falar nada – Sabe o que não era justo? Mentir para mim, não era justo que não me falasse nada. Não foi justo quando decidiu que isso seria o melhor, porque simplesmente meu pai decidiu que seria. Ou não foi apenas isso? Você... Chegou a me amar por um instante que fosse?

– É claro! Eu amo você... É por isso que não posso fazer isso com você. Bill, eu não sou bom para você, eu não estou bem, não estou seguindo em frente, não consigo fazer bem a mim mesmo, não quero fazer você ficar. Não quero que fique com alguém como eu, por favor entenda...

– Não! Eu não entendo! Dipper, eu... Eu amo você, eu não me importo com nada nesse mundo além disso. Não quero sumir porque você não está bem, eu quero ficar para ajudar você a ficar bem. Quero melhorar com você, ver você igual ou melhor que eu – Dei mais um passo em direção a ele, mas Pinetree se afastou de novo – Eu consigo aceitar se não me quiser mais, mas por você, não pelo que alguém disse

– Eu fiz isso por você... – Dipper fechou os olhos, mas as lágrimas já escorriam por seu rosto.

– Não, eu não quero que faça as coisas por mim, Pinetree, eu não preciso disso, só precisava de você ao meu lado – Fiz uma pausa quando senti que começava a chorar também, respirei fundo e mesmo trêmulo, limpei o rosto com a manga da blusa – Eu ainda preciso de você ao meu lado.

– E-eu quero ficar com você, eu só não quero... – Alcancei o moreno e o abracei, nós dois provavelmente éramos os mais chorões daquela cidade. Os braços dele me envolveram e eu aspirei o perfume de pinheiros com terra molhada, culpa da chuva que caía e parava a pelo menos uma semana.

– Eu amo você – Sussurrei temendo por um instante que tudo acabasse de novo, dessa vez de verdade.

– Eu também amo você, Bill – Ficamos em silêncio, abraçados, até que nós dois estivéssemos seguros para nos afastarmos um pouco – Agora você sabe.

– Eu escolhi ficar, eu acho que encontrei um novo lar quando encontrei você – As írises castanhas estavam em grande parte encobertas pelas pupilas dilatas de Dipper, beijei sua testa.

– O que vai acontecer agora? – Balancei a cabeça fraco.

– Eu não sei – Fiz um esforço para me afastar um pouco mais – Eu não sei o que vai acontecer, mas, Pinetree... Eu preciso de um tempo para pensar. Vou tentar dirigir, pensar um pouco...

– Prometa que vai voltar – Mason disse e eu concordei.

– Eu prometo – Voltei para o carro.

Eu já havia calculado a minha rota, iria até os limites da cidade, precisava de ar, da estrada, do vento no meu rosto. Aquilo era perfeito para me distrair, ou pelo menos seria, se a estrada não estivesse molhada depois de tanta chuva e a iluminação da rodovia estivesse em reforma. Só me lembro de pensar em Dipper antes de dois faróis cegarem minha visão, um caminhão derrapando no asfalto, então senti o impacto que me deixou desacordado e o carro completamente destruído. Não conseguia mais saber ou sentir nada. 

Amnesia - BilldipOnde histórias criam vida. Descubra agora