Capítulo 1

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As unhas ovulares revestidas da cor azul claro batiam incessantemente contra a mesa de vidro da sala quadricular e desnecessariamente pequena, o que fazia com que o som ecoasse por todo o ridículo perímetro. A mulher que, em um dos meus melhores dias poderia apreciar melhor a beleza, aumentava a sua voz a cada nova ideia que tinha para criar a sua logo.

O meu papel aqui era sorrir, peneirar as ideias da cliente e torna-las apreciáveis por meio do meu tablet. Mas, mesmo sob a dor da enxaqueca, o enjoo e os olhos pesados, tentava fazer o meu melhor enquanto a mulher jogava no ar mais de dez cores diferentes para uma logo pequena e mal planejada. Faço o que posso com o que ela me dava, já havia desenhado dez tipos de logo, tentando ao máximo nutrir das diferentes perspectivas originais sem fazer parecer um circo total.

Eu odiava o meu emprego às vezes.

- Você não acha que se eu colocasse um pouco de dourado na ponta do ficaria melhor?

Os olhos azuis da cliente repousam em mim. Sorrio. Ela devolve com extremo charme ativado. 

Ela deveria ser um porre na vida real, mas era exatamente esse o tipo de mulher que eu não rejeitava. Infelizmente, tenho uma queda pelas chatas. Contudo, nesse momento estou trabalhando e aprendi, da pior forma, que é melhor manter o salário do que uma boa foda.

- Claro. Por que não?

Ela abre um sorriso gigante, contente com a minha afirmação.

A questão era: todas as logos saiam horríveis. Aprendemos com o tempo que a vontade do cliente é superior, mesmo que fique evidente para olhos atentos que o resultado não seria bem recebido pelo público.

Tínhamos alguns passos antes de finalmente mostrar a arte final para o cliente. Após uma reunião inicial, na qual ele pode nos contar como deseja a sua logo ou o que for que esteja criando, tentamos, a partir disso, aglutinar os apontamentos originais complementando com o bom senso e a técnica. O passo número dois era sempre ter mais de duas opções como rascunho pré final, de modo que o cliente pudesse visualizar de modos diferentes. Depois, se o cliente gostasse do rascunho, finalizamos.

- Eu amei esses que você fez.

Ignoro o modo como o seu corpo se aproximou sucintamente do meu. Mantenho os meus olhos na tela do meu tablet e não nos seios largos que estavam amostra pela blusa apertada.

- Qual deles?

Afasto-me tão singelo quanto ela se aproximou, criando espaço entre nós.

- Todos! São perfeitos.

Sorrio por fora e a julgo ferrenhamente por dentro.

Como ela quer todos as logos se tem apenas uma empresa? Qual será a identidade visual, moça?

°°°

- Nossa, parece que um trator passou por cima de você.

Luana me recebe com um sorriso zombeteiro.

Levanto os meus olhos da tela do meu computador para ela. Luana era uma bela mulher. Extremamente linda. Já perdi a conta de quantas vezes eu dei em cima dela e fui respondido com um tapinha no ombro ou alguma piada sobre eu ser um bebê aprendendo a andar. Havia alguma coisa nos cabelos curtos pretos, olhos igualmente escuros e bochechas rosadas que me deixava interessado. Isso sem contar os atributos corporais do pescoço para baixo, mas vou me abster.

Porém, nesse momento, aquele lindo rosto me deixou entediado.

- Vai trabalhar, Luana. Bom dia. - Murmuro, voltando a rabiscar a droga da logo da mulher falante que não tem ideia do trabalho que ela me deu com todas aquelas cores feias.

Beije-me como se eu fosse seuOnde histórias criam vida. Descubra agora