Capítulo 15

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Mesmo que tenha passado toda a parte da manhã focado para o projeto e para as falas sugestivas de Patrick sobre o que e como podemos realiza-lo, nas horas vagas, como agora, enquanto tomo meu terceiro copo de café na copa, a lembrança de ontem volta para me assombrar.

O fato de ter beijado Yuri ainda soava fora de lugar, como se estivesse destacado dentre todas as minhas experiências. Nunca imaginei, de forma alguma, que teria esse tipo de intimidade com ele. Ao mesmo tempo em que parecia estrangeiro esse contato, eu me sentia audacioso. Se o modo como ele me beijou foi qualquer indício de seu desejo, eu estou igualmente lisonjeado e assustado. 

Toco minha mandíbula relembrando como as suas mãos tomaram o meu rosto e nuca. Nenhuma mulher havia me beijado de maneira tão audaz, no máximo chegou a afoita. Mas nada como se quisessem domar a minha alma junto ao beijo. Tudo nele soava masculino, era difícil pensar que era uma mulher em seu lugar. Eu estava insistentemente consciente de quem eu estava beijando. 

De toda forma, não foi tão ruim. Não senti muita coisa, como o esperado, contudo formei mais uma experiência. 

A parte do flerte e brincar com o desejo estampado na face alheia sempre foi divertido para mim. Era a etapa pré-sexo. Não que chegarei nessa fase com Yuri, mas nada me impedia de seguir enquanto eu pudesse tirar bom proveito da situação. O questionamento que fica era se eu conseguiria enrola-lo até o final do ano. Ainda falta alguns meses e não conseguia mapear toda a personalidade dele. 

- Bom dia. - Yuri adentra na sala como se convidado pelos meus pensamentos. Sua famosa caneca amarela em mãos. 

Como sempre, não mantem o seus olhos em mim por muito tempo. 

- Bom dia. - Digo de volta. - Dormiu bem?

- Sim e você? - Colocando a capsula na máquina,  olha-me de relance. 

- Como um anjo. - Levanto minha caneca para ele, que acena junto a um sorriso tímido. 

Ele parecia o mesmo de sempre. Homens gays eram mais discretos do que as mulheres? Se por acaso fosse alguém do gênero feminino, ainda mais das que eu estou acostumado a lidar, nesse momento ela já estaria querendo marcar um encontro, os seus olhos estariam presos em mim e haveria toda a energia usual da tensão sexual visível na face dela. A contraponto, Yuri não expressa coisa alguma ou qualquer interesse. Era como se a noite passada nunca tivesse acontecido. 

Talvez eu esteja esperando demais dele.  

- Quer almoçar comigo hoje?

- Pode ser. - Afirma em um tom monótono. Virando-se para mim, já com sua caneca em mãos, diz solenemente. - Desço uma e meia. Até.

Sem esperar respostas ou contra-argumentos, apenas se virá e vai embora. 

Entendido. 

Eu sou uma cara muito convencido porque achei seriamente que ele já estava na minha. Yuri escondia bem o seu jogo, o que seria impressionante, ou Estella tinha razão e eu iria ser demitido dentro de pouco meses por causa do meu ego. 

Coisas piores já aconteceram quando eu decide ignorar o meu bom senso, se eu não aprendi nessas ocasiões, como seria suposto fazê-lo agora? 

Ainda mais diante da minha indisposição em escutar qualquer proposta ética e racional. 

°°°

- Como o projeto está saindo? - Yuri pergunta depois de pedirmos os nossos pratos. 

A ida para o restaurante foi coberta de assuntos de ponto de ônibus, como as ruas esburacadas e o problema de saneamento básico no Rio de Janeiro; nos vai e vens dos tópicos descobri que em seus anos de faculdade ele fez parte de uma ONG que tinha como objetivo rastrear os não feitos políticos nas comunidades. 

Beije-me como se eu fosse seuOnde histórias criam vida. Descubra agora